Um Nobel para o desenvolvimento institucional, por Samuel Pessoa.

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Prêmio sugere que Caio Prado envelheceu melhor que a teoria da dependência

Samuel Pessoa, Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

Folha de São Paulo, 20/10/2024

Na segunda-feira (14), a trinca Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson, foi agraciada com o Prêmio Nobel de Economia, “pelos seus estudos de como as instituições são formadas e afetam a prosperidade”.

Acemoglu, Johnson e Robinson (muitas vezes referidos pela sigla AJR) têm importantes predecessores. Em 1997, quatro anos antes de a trinca agora premiada publicar seu artigo mais influente sobre instituições e desenvolvimento, uma dupla de historiadores americanos — Stanley Engerman e Kenneth Sokoloff — escreveu um texto que em certos aspectos antecipava o argumento básico de AJR.

A ideia de Engerman e de Sokoloff é a de que, nas colônias tropicais das Américas, a possibilidade de produzir bens com ganhos de escala na agricultura (o que tornava os latifúndios rentáveis) gerou especialização na produção de commodities de exportação com uso de trabalho escravo. Nas regiões temperadas, não havia ganho de escala na produção agrícola (propriedades pequenas eram proporcionalmente tão rentáveis quanto as grandes), o que estimulou a pequena unidade familiar e a absorção de excedentes populacionais europeus.

A dotação inicial de fatores (terra e mão de obra) gerou escolhas tecnológicas e de organização produtiva que consolidaram, nos trópicos, sociedades muito desiguais, tanto na distribuição de renda e riqueza quanto na distribuição do poder político. Isso traria consequências negativas bem depois de terminado o período colonial.

É que o desenvolvimento do capitalismo, em seguida à Revolução Industrial, foi crescentemente demandante de dois recursos. Pouco a pouco, passou-se a valorizar o trabalho qualificado. A escolarização foi adquirindo centralidade para o desenvolvimento econômico.

Adicionalmente, processos produtivos mais complexos demandam muito da capacidade das instituições de garantir o cumprimento de contratos. A eficiência do marco legal e institucional tem importância maior em sociedades complexas.

Ocorreu então uma “reversão de fortunas”: as colônias tropicais, inicialmente mais ricas, pois produziam produtos de luxo para a metrópole, ficaram para trás. Hoje são subdesenvolvidas.

O leitor pode achar essa narrativa bem parecida com a história que o professor do ensino médio de história nos contava, ao tratar da diferença entre colônia de exploração e colônia de povoamento.

A percepção é corretíssima. No Brasil, essa explicação tomou dois caminhos. Na obra de Caio Prado Júnior, temos uma versão que se aproxima muito do neoinstitucionalismo recente, inclusive o de AJR. No pensamento Cepalino, enfatiza-se a especialização na produção de commodities de exportação e a relação comercial com o resto do mundo como uma das causas do subdesenvolvimento.

O Nobel da semana passada sugere que Caio Prado envelheceu melhor do que a teoria da dependência.

Imperdível o artigo de Leonardo Monastério e Philipp Ehrl  “Colônias de povoamento versus colônias de exploração: de Heeren a Acemoglu”, de 2019. Os autores contam a história da evolução desta díade no pensamento desde o alemão Heeren (1817), passando pelo francês Leroy-Beaulieu, (1902), citado por Caio Prado, até AJR.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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