Pé-de-meia reduz 25% do problema da evasão escolar, por Laura Muller Machado

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Proposta brasileira está em linha com os resultados mundiais, mas pode ser fortalecida com melhoria na educação

Laura Muller Machado, Mestre em Economia Aplicada pela USP, é professora do Insper e foi secretária de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo

Folha de São Paulo, 22/03/2025

O Pé-de-Meia, a partir de um incentivo financeiro-educacional mensal e de uma poupança condicionada para os jovens, tem como objetivo promover a permanência e a conclusão escolar de alunos matriculados no ensino médio público. O programa prevê o pagamento de uma bolsa de estudos com menos de meio salário-mínimo per capita a inscritos no cadastro único.

Os pagamentos são de 10 parcelas mensais de incentivo de R$ 200, que podem ser sacados em qualquer momento desde que comprovada a frequência de 80%, além de três depósitos de R$ 1.000 ao final de cada ano concluído, que só poderão ser retirados da poupança após a conclusão do ano letivo. Os valores chegam a até R$ 9.200 por aluno ao longo do ensino médio, desde que o estudante frequente e seja aprovado em todas as etapas.

Sabemos, a partir do estudo “Consequências da violação do direito à educação”, de Ricardo Paes de Barros, que os jovens que não concluem a educação básica irão incorrer em uma perda de R$ 395 mil ao longo da vida toda devido a perdas, não apenas envolvendo remuneração, mas também longevidade, externalidades econômicas e episódios de violência.

Isso quer dizer que, a cada cinco jovens que não evadem, deixamos de perder R$ 2 milhões. O custo da não conclusão da educação básica é muito alto, tanto para quem deixa a escola como para toda a sociedade brasileira.

Espera-se que uma bolsa de estudo seja um instrumento mais eficaz quando a razão para a evasão é a falta de renda para frequentar a escola, e menos eficaz em casos nos quais o jovem tem condições, mas não percebe a escola como um investimento produtivo para seu tempo.

Uma bolsa de estudo deve ter mais impacto quando o motivo da evasão é a pobreza e a necessidade de trabalhar do que a baixa qualidade da educação oferecida. O Pé-de-Meia será um bom instrumento para combater a evasão por motivo de ausência de recursos financeiros. Mas para ser mais impactante, o programa precisa de um complemento: a educação de qualidade.

A partir de dados da Pnad e do Inep de 2019, o Centro de Evidências da Educação Integral do Insper desenvolveu um simulador, uma avaliação ex-ante, para estimar seu impacto. O resultado mostra que, considerando todas as séries, a taxa de evasão no ensino médio para os beneficiários do programa sem o Pé-de-Meia é da ordem de 28%, enquanto com o Pé-de-Meia, de 21%, uma redução de 7 pontos percentuais. Portanto, o programa é capaz de equacionar um quarto da evasão.

Muitos países têm programas como o brasileiro. Foram publicados em torno de 104 estudos sobre esses incentivos educacionais ao redor do mundo. A literatura aponta para um impacto de redução de evasão de 2 a 9 pontos percentuais em programas similares. Portanto, a proposta brasileira está em linha com os resultados mundiais.

Apesar de promissor, fica evidente que a bolsa não é a solução completa do combate à evasão, um dos maiores desafios do ensino médio. Em especial, a ciência indica que o programa será enriquecido quanto mais robusto for a educação.  No Canadá, por exemplo, o incentivo equivalente é disponibilizado em conjunto com um plano de aperfeiçoamento de educação na escola beneficiada.

Sem dúvida, estamos todos gratos e animados com a bolsa de estudos para os mais vulneráveis poderem estudar. No entanto, sabemos que o Pé-de-Meia poderia alcançar resultados maiores e ser mais potente em um cenário de melhoria da qualidade da educação.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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