‘O sistema privilegia quem está no poder’, diz cientista político.

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Carlos Pereira prevê que a renovação política não deve ter a mesma força nas eleições municipais

Natália Portinari – O Globo – 12/10/2020

BRASÍLIA — Para Carlos Pereira, cientista político da Fundação Getulio Vargas (FGV), a distribuição dos recursos dos fundos eleitoral e partidário para privilegiar políticos experientes é esperada. A lógica é privilegiar campanhas com maior “densidade” e “viabilidade”. Ele prevê que a renovação política, fenômeno que apareceu com força nas eleições de 2018, não deve ter a mesma força nas eleições municipais.

Por que partidos privilegiam candidatos experientes?

Os partidos tendem a privilegiar a estrutura tradicional, quem de certa forma está no partido há muito tempo e conhece os canais decisórios dentro do partido. É um comportamento racional, muito esperado. Tendem também a concentrar recursos em puxadores de votos. Como não há mais coligação proporcional (para vereador), tem que concentrar em quem tem viabilidade. Dado que a legislação permite a discricionariedade dos partidos em decidirem sobre a alocação, cumprindo as cotas, é esperado que quem tem mais chance tenha mais recursos.

Essa distribuição atrapalha a renovação política?

Quando a gente vem de uma associação de escândalos de corrupção, em que a elite política de vários partidos foi envolvida, as demandas por renovação alcançam mais importância. Mas na realidade esse fenômeno (renovação) é raro em qualquer democracia. Nas democracias estáveis, como os Estados Unidos, onde a democracia é mais longeva, a taxa de renovação é baixíssima, 90% dos parlamentares concorrem à reeleição. O sistema é desenhado para privilegiar quem está no poder. O que tivemos nas eleições de 2018 foi mais a exceção do que a regra, devido a escândalos e descrédito da política tradicional.

Por que as eleições de 2018 são um cenário diferente de agora?

A eleição de 2018 teve um caráter de antipolítica. O presidente Jair Bolsonaro se beneficiou muito dessa estrutura, mas hoje se comporta como qualquer outro político tradicional, apesar de ter prometido que não se portaria dessa forma, então o eleitor vai se desgarrando desse argumento da renovação e vai procurando os parlamentares que de fato podem trazer algum benefício concreto para suas bases.

Há algum outro motivo para haver menos renovação em 2020?

O eleitor, especialmente para as eleições proporcionais, para o Legislativo, decide muito em cima da hora em quem vai votar. E essa decisão é muito ancorada em cima da ação dessa rede local de interesses. Quanto mais engajada a rede local de interesses estiver em torno de um candidato, mais ela vai gastar energia e recursos para que ele se reeleja, e o eleitor não necessariamente vai estar muito ligado. Os cargos para o Executivo despertam mais interesse dos eleitores.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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