Momentos de renovação e esperança

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O ano de 2011 entrará para a história como um momento de grandes mudanças na sociedade mundial, regimes até então intransponíveis e impermeáveis estão sendo destruídos de forma rápida e irreversível, governos autoritários estão sendo banidos do norte da África, movimentos sociais com reivindicações inclusivas estão mobilizando jovens e adultos em prol de uma sociedade melhor e com mais oportunidades, o Chile e a Índia são exemplos típicos de reivindicações geradas por uma sociedade perplexa com os rumos atuais, onde não encontramos recursos para auxiliar os setores mais pobres da sociedade, mas encontramos facilmente grandes somas de dinheiro para resgatar os bancos e o sistema financeiro, como visualizamos na crise imobiliária norte-americana e seus impactos sobre a economia mundial, que “obrigaram” os governos a assumir passivos altíssimos, socializando prejuízos para impedir a falência do sistema econômico.

As transformações em curso no mundo agitam todos os setores da sociedade, como ficarmos indiferentes quando ligamos a televisão e visualizamos, em nossa sala, grupos armados e bem treinados lutando para resgatar seus países de governantes perversos e violentos? Que se nutrem dos sentimentos mais repulsivos para dominar, criando uma verdadeira trilha de destruição e desigualdade, impulsionadas pela ambição patológica e pela busca insana por dinheiro e poder. Estes países marcados por décadas de desmandos e violências se encontram num momento de reconstrução de sua dignidade, os conflitos são necessários quando os seres humanos não conseguem entender as leis do progresso, leis inexoráveis que impulsionam a humanidade, todos aqueles que se escondem e tentam evitá-la, são barbaramente retirados e colocados ao lado, sob pena de retardarem a transição.

Os movimentos em curso no norte da África estão gerando grande apreensão, governantes que se mantiveram no poder durante décadas, pela força das armas e pelas mãos militares, estão sendo destruídos pela população que parece cansada de desmandos e desesperança, numa sociedade onde o desemprego cresce de forma acelerada e as expectativas quanto ao futuro são sombrias, onde o sonho de ascensão social é apenas um sonho longínquo a uma grande parte dos indivíduos, nestes países onde uma cleptocracia corrupta manda e desmanda para manter o controle da sociedade e a educação, que poderia ser o instrumento para fazer a diferença, nada mais é do que um instrumento de manutenção do status quo e do poder político, econômico e social.

Os movimentos sociais não se restringem a países pobres ou a economias em desenvolvimento, atingem ainda povos desenvolvidos com renda per capita de mais de US$ 30 mil, países que alcançaram um alto nível de desenvolvimento social, como a Inglaterra, que semanas atrás presenciou graves desequilíbrios sociais, jovens londrinos lideraram movimentos violentos contra as autoridades, reivindicando novas oportunidades de inserção social, estes grupos combatiam desesperadamente a redução dos investimentos estatais em setores sociais necessitados do auxílio governamental, saques e roubos generalizados cresceram de forma intensa e geraram graves prejuízos para a sociedade, caos urbanos com barricadas e combates não são normais em países desenvolvidos, mas se espalham pelo mundo com uma rapidez jamais vista, fruto do crescimento da desigualdade social nestes países e redução das expectativas de melhoras, num mundo globalizado marcado pela concorrência estes jovens vivem conflitos intensos, de um lado, o mundo que se inaugura é caracterizado pelas melhorias tecnológicas, produtos sofisticados e dotados de muitas habilidades que atraem e geram desejos constantes de consumo e de posse; de outro, a luta pela inserção no mercado de trabalho, este exigindo dos indivíduos inúmeras habilidades, marcados pela competição constante e exigências mirabolantes, querem um produtor voraz e um consumidor insaciável, sem tempo para o pensamento e para a reflexão.

O caos Inglês contrasta com os movimentos surgidos no Chile, este pequeno país que sempre se caracterizou por ser a economia mais estável da região, se encontra em um momento de grande apreensão, jovens indignados fazem protestos marcantes nas ruas, exigindo melhoras constantes na educação, mesmo sabendo que o Chile é o país com maior desenvolvimento nesta área da região, noventa por cento dos jovens chilenos tem ensino médio completo, e mais de cinquenta por cento estão no ensino superior; no Brasil encontramos uma realidade bastante diferente, menos de 40% dos jovens conseguem terminar o ensino médio, e apenas 10% chegam à universidade, mesmo assim, encontramos uma classe estudantil agitada, preocupada e consciente de suas necessidade no país vizinho, enquanto aqui, mesmo com indicadores tão negativos e preocupantes, encontramos jovens tranquilos e acomodados, muitos deles acreditando que um simples diploma vai garantir a entrada no mercado de trabalho, um salário crescente e perspectivas promissoras, isto até pode acontecer mas apenas com uma grande minoria, capacitada e bastante esforçada, conscientes de que o diploma no mundo contemporâneo é apenas o pontapé inicial para o mundo do trabalho, as habilidades acumuladas e a capacidade de se reinventar constantemente é o que lhe garante uma maior empregabilidade futura, mas estabilidade é algo pouco provável.

As demandas dos jovens chilenos deveriam motivar os estudantes brasileiros, buscar qualidade na educação deveria ser a bandeira empunhada pela União Nacional dos Estudantes (UNE), enquanto os chilenos buscam a inserção na constituição que a qualidade da educação seja um direito garantido pelo Estado, os estudantes brasileiros se contentam com recursos estatais para financiamentos de congressos e garantia de doação de sedes para movimentos sociais que sobrevivem atrelados ao Estado e distante da verdadeira camada necessitada de educação de qualidade que lhe garantam condições de competir em igualdade com outros trabalhadores.

Os movimentos sociais estão se agitando no mundo todo, reivindicações visando a melhoria da sociedade são uma tônica destes momentos atuais, capacitar a população é uma das mais vantajosas políticas públicas que um Estado pode legar aos seus cidadãos, novas oportunidades exigem desprendimento dos governantes e uma visão estratégica, uma capacidade de vislumbram o futuro imediato, que nos parece distante da grande maioria dos gestores públicos, estes se concentram na visão rasteira da política e se esquecem de que serão julgados pela sociedade pelas ações implantadas e pelos seus resultados no cotidiano dos cidadãos.

O mundo do trabalho é cheio de desafios e de oportunidades, a concorrência que vivenciamos nos causam medos e preocupações constantes, poucos estão preparados para este ambiente competitivo, marcados pela cobrança e pelas metas inatingíveis e implacáveis impostas pelos empregadores como exigência para a manutenção de seus empregos e de sua condição social. O mundo contemporâneo é um grande espaço de transformações, muitos povos estão se rebelando contra os desmandos políticos de governantes lunáticos e autoritários, outros saem para as ruas reivindicando melhores condições educacionais e melhoras concretas para a ascensão social, agora encontramos ainda, outros, que saem às ruas para promover arruaças e saques de aparelhos eletrônicos que se transformam em objetos de desejos de todos os jovens e adultos do mundo, os i-pads, i-phones, blackberrys e outros objetos do desejo são roubados em Londres e se transformam em objetos de estudos de intelectuais de todas as partes, os saques modernos não são mais restringidos aos alimentos e gêneros de primeira necessidade, mas estão se concentrando em produtos supérfluos e usados pelas mídias e o marketing modernos como símbolos de status e ascensão social, um mundo estranho sem sombra de dúvida, um desafio para todos os intelectuais.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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