Juventude agredida, por Carlos Alberto Di Franco

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A iniciação sexual precoce, o abuso sexual e a prostituição infantil são resultadas da cultura da promiscuidade que está aí

Carlos Alberto Di Franco – O Estado de São Paulo, 20/01/2025

O leitor é o melhor termômetro para medir a temperatura do cidadão comum. Tomar o seu pulso equivale a uma pesquisa qualitativa informal. Aos que há anos me honram com sua leitura neste espaço opinativo, transmito uma experiência recorrente: família, ética e valores aumentam o índice de leitura.

Sempre que tratei de temas relacionados à família, recebi muitos e-mails e mensagens. Sem dúvida uma sugestiva amostragem de opinião pública, sobretudo considerando o rico mosaico etário, profissional e social dos remetentes.

Neste Brasil sacudido por uma brutal crise ética, alimentada pelo cinismo dos homens públicos e pela mentira dos que deveriam dar exemplo de integridade, há, felizmente, uma ampla classe média sintonizada com valores e princípios que podem fazer a diferença. E nós, jornalistas, devemos escrever para a classe média. Nela reside o alicerce da estabilidade democrática. Escreva algo, sublinhavam alguns dos e-mails que recebi, a respeito da desorientação da juventude. Meu artigo de hoje, caro leitor, foi pautado por você. Tomarei como gancho um dado objetivo e preocupante.

A gravidez precoce é hoje no Brasil uma das maiores causas de evasão escolar entre garotas de 15 a 17 anos. Dados da Unesco mostraram que, das jovens dessa faixa etária que abandonaram os estudos, 25% alegaram a gravidez como motivo. Outros estudos revelam que complicações decorrentes da gestação e do parto são a terceira causa de morte entre as adolescentes, atrás apenas de acidentes de trânsito e homicídios. A gravidez afeta até quem mal saiu da infância.

A gravidez precoce realmente está se tornando um grande problema na educação. Se 25% das meninas de 15 a 17 anos grávidas deixam a escola, isso significa dizer que mais de 200 mil param anualmente de estudar. Futuro triste. Cenário complicado. Mas dramaticamente coerente com um país em que o ministro mais importante não é o da Educação ou o da Saúde, mas o da Fazenda.

É um absurdo acreditar que uma criança vá ter maturidade para ter um filho com essa idade. Pregar a abstinência sexual de meninas de 11 a 14 anos não significa ser moralista ou careta, mas responsável. Não se trata de histeria conservadora, mas de bom senso.

A culpa não é só do entretenimento permissivo ou da TV, que, frequentemente, apresenta bons programas. É de todos nós – governantes, formadores de opinião e pais de família –, que, num exercício de anticidadania, aceitamos que o País fosse definido mundo afora como o paraíso do sexo fácil, barato, descartável. É triste, para não dizer trágico, ver o Brasil ser citado como um oásis excitante para os turistas que querem satisfazer suas taras e fantasias sexuais com crianças e adolescentes. Reportagens denunciando redes de prostituição infantil, algumas promovidas com o conhecimento ou até mesmo com a participação de autoridades públicas, crescem à sombra da impunidade.

O governo, assustado com o crescimento da gravidez precoce e com o crescente descaso dos usuários da camisinha, investe pesadamente nas campanhas em defesa do preservativo. A estratégia não funciona. Afinal, milhões de reais já foram gastos num inglório combate aos efeitos. A raiz do problema, independentemente da irritação que eu possa despertar em certas falanges politicamente corretas, está na onda de baixaria e vulgaridade que tomou conta do ambiente nacional. Hoje, diariamente, na televisão, nos outdoors, nas mensagens publicitárias, o sexo foi guindado à condição de produto de primeira necessidade.

Atualmente, graças ao impacto da TV e da internet, qualquer criança sabe mais sobre sexo, violência e aberrações do que qualquer adulto de um passado não tão remoto. Não é preciso ser psicólogo para que se possam prever as distorções afetivas, psíquicas e emocionais dessa perversa iniciação precoce. A inocência infantil está sendo impiedosamente banida. Por isso, a multiplicação de descobertas de redes de pedofilia não deve surpreender ninguém. Trata-se, na verdade, das consequências criminosas da escalada de erotização infantil promovida por alguns setores do negócio do entretenimento.

Se quisermos um entretenimento de qualidade precisamos separar o exercício da liberdade de expressão da prática do entretenimento mundo cão. Há uma liberdade de mercado que produz um mercado da liberdade. De resto, mesmo que exista uma demanda de vulgaridade e perversão, deve-se aceder a ela? Suponhamos que exista um público interessado em abuso sexual de crianças, assassinatos ao vivo, violência desse tipo. Nem por isso a TV deveria ter programas especializados em pedofilia e assassinatos. O mercado não é um juiz inapelável. Não se deve atuar à margem dele, mas não se pode sobrevalorizá-lo.

A iniciação sexual precoce, o abuso sexual e a prostituição infantil são, de fato, o resultado da cultura da promiscuidade que está aí. Sem nenhum moralismo, creio que chegou a hora de dar nome aos bois, de repensar o setor de entretenimento, e de investir em programação de qualidade.

A juventude merece atenção e prioridade nas nossas coberturas.

Carlos Alberto Di Franco, Jornalista.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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