Novo presidente será “síndico de uma massa falida”, diz cientista político

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Marco Aurélio Nogueira, cientista político e professor da Unesp – Entrevista Gabriela Fujita – UOL, 14/06/2018.

O brasileiro não foi treinado para o debate democrático, o novo presidente do país será “síndico de uma massa falida” e a corrupção vai ser um tema indigesto para os presidenciáveis. Estas são opiniões do professor Marco Aurélio Nogueira, doutor em ciência política pela USP (Universidade de São Paulo) e livre-docente da Unesp (Universidade Estadual Paulista), a respeito de como ele vê a corrida eleitoral a quatro meses do primeiro turno.

Nogueira acaba de endossar um manifesto que defende a união de partidos de centro para evitar o “pior”: que o pré-candidato Jair Bolsonaro (PSL) consiga chegar ao segundo turno. No começo de junho, siglas como PSDB, MDB, PPS, PV, PSD e PTB lançaram o documento, que recebeu o apoio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O grupo de lideranças avalia o pleito de 2018 como o “mais indecifrável de todo o período da redemocratização” e defende, por exemplo, “tolerância zero com o crime organizado” e a manutenção do programa Bolsa Família.

O professor Nogueira não é filiado a nenhum partido, mas diz que o cidadão comum deve se juntar às discussões que, na sua avaliação, acontecem apartadas: por um lado, no ambiente político, e por outro, no Facebook e na mesa de bar. E não importa de qual partido seja, o próximo presidente do Brasil vai encarar “uma baita encrenca” a partir de 2019. Confira na entrevista a seguir.

UOL – O novo presidente do Brasil vai assumir que país em 2019?

Marco Aurélio Nogueira – Uma baita encrenca… Vai ser uma espécie de síndico de uma massa falida. Essa é uma expressão dramática. Acho que o Brasil não está destinado a acabar ou a cair no precipício, nós ainda temos um pouco de gordura para queimar.

O Brasil é um país muito grande, tem recursos naturais expressivos, tanto o petróleo quanto no plano da capacidade de produção de alimentos. A diversidade cultural brasileira é um recurso interessante, porque ninguém pensa do mesmo jeito no Brasil, isso é uma vantagem. A gente tem um mercado consumidor muito grande, que, se bem abordado e administrado, serve de base para um crescimento econômico expressivo. Temos algumas reservas com as quais contar para não decretar a morte do país, mas tudo isso vai passar para 2019. Não tem como reduzir o desentendimento, reduzir a complexidade, eliminar a desigualdade, o problema da educação, da saúde, de agora até janeiro do ano que vem.

O Bolsonaro, se for eleito, é candidatíssimo a um novo impeachment. Não por qualquer pedalada fiscal, mas por qualquer outro motivo. O desentendimento que ele vai gerar poderá produzir um impeachment.

Seja quem for o eleito, se ele tomar as rédeas, vai organizar um governo de reconstrução do país. Como se a gente tivesse saído de uma guerra.

O próximo presidente vai ter que arrumar as várias partes do país que estão desarrumadas. O sistema político, o sistema eleitoral, ele está precisando, no mínimo, de uma nova demão de tinta. Temos partidos demais, a fragmentação parlamentar é muito grande, o que provoca uma dificuldade de funcionamento do presidencialismo, o tal presidencialismo de coalizão. Também vai ter que mexer aí. No que diz respeito às reformas que tenham impacto direto na sociedade, todas elas são reformas que produzirão dor e exigirão sacrifício. Se mexer na Previdência, é dor e sacrifício. Não há jeito de modificar o sistema previdenciário sem desagradar uma parte ou a totalidade da população.

E se o eleito não topar enfrentar isso tudo?

Se não topar enfrentar isso, vai ter que inventar alguma outra coisa para manter o caixa do Estado suficientemente municiado para poder fazer gastos. Vamos supor que o presidente chegue à conclusão de que não vai mexer na Previdência porque não quer desagradar a população. E se for verdade que a Previdência tem um déficit brutal? Estou falando “e se for verdade” porque o tamanho do déficit é um tema controvertido. E é mais controvertido ainda em que velocidade se ajusta a Previdência. Não vai se ajustar de hoje para amanhã, é uma coisa de 20 anos. Tem que ser aos poucos, tem que ter etapas, não pode sacrificar todo mundo.

E você tem aquelas áreas clássicas de incorporação financeira no Estado. Com a privatização, você pode vender algumas empresas, mas já não temos tantas empresas assim que podem ser vendidas para encher o cofre de dinheiro. A Petrobras, quem quer que seja o eleito, dificilmente vai privatizá-la. Você pode privatizar a Eletrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Federal. Acho difícil que se mexa nisso, porque as resistências vão ser muito grandes. São ações impopulares, no sentido da população, e tem resistências porque cada uma dessas estatais tem sindicatos de trabalhadores ativos, fortes, que vão bloquear as coisas. Além do mais, algumas delas privatizadas não vão trazer tanto dinheiro assim.

Em uma eleição tão fragmentada como a de 2018, o comportamento do eleitor pode se tornar perigoso?

Vai ser muito difícil haver alguma mudança expressiva que altere a predisposição do eleitorado. Teria que acontecer alguma coisa [diferente], e eu não estou conseguindo ver isso acontecer. Um investimento político forte no plano da opinião pública para esclarecer a população, um dos motivos que me levaram a endossar o manifesto [de união dos partidos de centro]. Teria que haver um investimento forte em pedagogia cívica. O eleitorado pode derivar também para o voto nulo e o voto em branco. Se você tiver de um quarto para um terço [do total] de abstenções e votos nulos, é algo complicadíssimo.

Pode ser que, quando a campanha de fato começar, na TV, algo desse sentimento cívico possa ser feito. Que os candidatos mais equilibrados, em vez de ficarem falando mal dos outros, que eles falem com a população, façam uma conclamação a que se valorize a democracia eleitoral. Porque o ambiente está ruim, é um ambiente de mal-estar. As pessoas estão incomodadas, desinteressadas, um querendo pular no pescoço do outro, pouca tolerância e pouca paciência, e com um despreparo para o debate democrático muito grande. O brasileiro não foi treinado para o debate democrático, nós começamos há 30 anos.

Como os temas “Operação Lava Jato” e “corrupção” vão aparecer na campanha eleitoral?

A Lava Jato foi um complicador [nos últimos anos] porque, de certo modo, ela acuou os políticos e fez os políticos ficarem com muita raiva dela, todos eles. Em função disso, vai ser julgada pelos candidatos nestas eleições e também pela população. Dependendo de como forem os debates, ela poderá sair mais forte ou mais fraca, supondo que ela ainda continue, e acho que ela ainda tem gás para isso.

A Lava Jato pode ser julgada de duas maneiras na campanha: uma é dizer ‘somos contra a Lava Jato’; outra é dizer ‘nós somos a favor, mas achamos que ela precisa ser corrigida’

Os juízes facilitaram muito a identificação do político com o corrupto, como se tivessem lavado a criança e jogado a criança fora com a água suja. Acabaram criando uma animosidade entre a população e os políticos. E aí não está certo, porque não tem como tocar um país sem os políticos. É interessante a gente discutir isso. Será que é verdade que todos os políticos não valem nada?

E a “corrupção”?

Eu espero que ela entre em uma posição central, mas não acredito que entre. A rigor, a única candidata que teria disposição para fazer isso é a Marina Silva (Rede). Pode ser que ela ponha esse tema, mas os outros vão sentar em cima. Por vários motivos, sendo o principal deles que todos os outros têm o rabo preso. Talvez o Ciro Gomes (PDT) não tenha, não sei. Talvez você tenha esses dois candidatos insistindo no tema da corrupção, mas os outros abafando. Vai ser um tema indigesto para a maior parte deles. Mesmo a esquerda pura, com Guilherme Boulos (PSOL) e Manuela D’Ávila (PCdoB), não vai ter tanta vontade de apresentar o assunto, porque eles consideram que a colocação da corrupção no centro da agenda tira do foco a questão da desigualdade social, que é a principal para eles.

Os anti-Bolsonaro são agora os novos anti-Lula?

Não acho que a dinâmica anti-Bolsonaro substitui a dinâmica anti-Lula. O que pode estar acontecendo na cabeça de muita gente é uma transferência da frustração ou da raiva contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o Bolsonaro. Os eleitores, na falta de outras opções que apareçam como mais autênticas, vão para o Bolsonaro. “Esse aí é contra a esquerda”, por exemplo. “O Bolsonaro diz que é ficha limpa”, outro exemplo. Tem um certo tipo de sedução que as pessoas podem estar sentindo por uma figura que é o negativo do lulismo.

E em relação aos candidatos? Aqueles que antes batiam em Lula e no PT mudaram de foco após sua prisão?

Se Lula fosse candidato, Ciro Gomes não bateria nele, por exemplo, mas ele tem que bater no Bolsonaro. Assim como a Marina não faria uma campanha para desconstruir o Lula, mas ela tem agora que fazer uma campanha para desconstruir o Bolsonaro.

Não é só que o Bolsonaro ocupou o lugar do Lula, ele materializou um polo que não era muito expressivo na vida brasileira. Tirando a época da ditadura, de 1985 para cá, o Brasil nunca teve um candidato que viesse dessa forma pela direita.

Você tinha liberais, neoliberais, conservadores, mas eram todos “moços de família”, vamos dizer assim. O Bolsonaro é um “cara do boteco”, não é educado, chega chutando a mesa. E ele está chegando aos 20% [das intenções de voto], a luz vermelha de perigo está piscando. Todo mundo tem que bater nele para ver se consegue desconstruí-lo e roubar os eleitores prováveis que ele está conseguindo agregar.

(De acordo com a mais recente pesquisa Datafolha, em um cenário de disputa presidencial sem Lula, Bolsonaro mantém a liderança, com 19% da preferência de votos, sendo que 34% dos entrevistados afirmam ainda não ter candidato. Preso há dois meses, o ex-presidente petista obteve 30% das intenções de voto.)

Por que o senhor assinou o manifesto que defende a união de partidos de centro?

Porque eu acho que hoje, no Brasil, nós chegamos muito próximo daquilo que poderia se chamar de um abismo. O país está muito complicado, não é que antes estivesse melhor, mas ele piorou muito. E não é só porque faltam bons candidatos. Eu acho que o país está perto do abismo porque os problemas que nós enfrentamos em tudo, na economia, na saúde, na educação, na habitação, na Previdência, na infraestrutura do país, na cultura geral, todos os problemas aumentaram de gravidade.

De 2013 para cá, temos um ciclo de cinco anos que expressa uma espécie de ruptura da sociedade com a política. Não estou dizendo que o agora é uma consequência de 2013, mas tem um ciclo aí, uma sucessão de fatos que foram se acumulando e produzindo uma sociedade que não se sente representada pela política e que está pondo para fora a sua desconfiança, a sua animosidade com os políticos, com os partidos, com os governos. Esse ciclo tem algumas marcações: as manifestações de 2013, a Lava Jato, as eleições de 2014, o impeachment de Dilma Rousseff (PT), o governo Temer (MDB) e a prisão de Lula. Todas essas coisas ajudaram a que o questionamento da política crescesse. Esses fatos foram ajudando a compor um cenário de muita polarização, algo inevitável na política, mas não ao nível a que a gente chegou.

Se você pegar o atual número de candidatos, como é que a população vai se posicionar com uma oferta de tantos concorrentes? Como é que ela vai descobrir o que o Geraldo Alckmin (PSDB) tem de diferente do Henrique Meirelles (MDB) ou do Rodrigo Maia (DEM) ou do Ciro Gomes etc.? Provavelmente ela vai acabar definindo sua posição de uma maneira passional: “ah, esse cara é mais bonito”, ou “esse cara é da igreja”, ou “esse cara é machão…”.

E por que fazer uma junção de siglas de centro?

A gravidade e a complicação da agenda não permitem que a gente ache que um candidato, por melhor que seja, vai conseguir atacar os problemas. Até porque presidente da República precisa de Congresso. Se você pegar os candidatos que estão despontando com mais fôlego, que são, até agora, Bolsonaro, Ciro Gomes e Marina, eles têm partidos muito fracos na formação do Congresso. Eles podem ser eleitos sem levar com eles uma base estruturada. Diferentemente do que o PT fez com a Dilma ou com o Lula, diferentemente do que o Fernando Henrique [Cardoso] tinha lá atrás, quando foi governante.

Nesses três últimos casos, mesmo com partidos estruturados, eles tiveram que negociar e formar maiorias circunstanciais, o que complicou o próprio governo deles: o Fernando Henrique se complicou com o problema da reeleição, o Lula teve o problema do mensalão e entregou tudo ao PMDB para conseguir formar uma maioria, e a Dilma foi mais radical ainda. Foi a extensão da base que ela formou no Congresso que acabou cortando o pescoço dela, com Michel Temer.

O Brasil tem mesmo um centro democrático?

Todo lugar tem. O que você não tem [no Brasil] é um centro democrático bem composto. Você tem o “centrão”, que é uma versão fisiológica da ideia de centro, juntando os pedaços e gente daqui e ali, que funciona mais pela barganha do que pela ideologia, não tem programa político. O programa é “eu me virar” ou “me sair bem”. Você tem filiações ideológicas na vida política de qualquer país: socialistas, comunistas, liberais, conservadores. Tem gente que se diz “liberal na economia e conservador nos costumes”. O que se pode agora no Brasil, em nome de uma redução de riscos, é aproximar essas ideologias de um denominador comum, de um ponto de equilíbrio. Por exemplo: eu sou liberal e você é socialista, mas nós concordamos que é preciso estabilizar as contas públicas, reformar a Previdência, melhorar a educação.

Seria uma forma de antecipar ou evitar aquela costumeira negociação entre partidos por apoio no final da campanha presidencial?

Seria isso, com certeza. Na verdade, a gente pode ter duas leituras. Uma é: vamos nos unir agora, vamos aumentar a convergência agora para evitar que os extremos ou os mais afoitos cheguem ao segundo turno.

Quem o senhor considera os “afoitos” na disputa eleitoral? Quem oferece esse “risco”?

O afoito, o inimigo público número 1, para mim, se chama Bolsonaro. Ele não tem preparo. Em cinco mandatos de deputado federal, o que ele fez? Ele não tem conhecimento técnico mínimo para tal. E aí alguém pode dizer que o Lula também não tinha. É verdade, o Lula também não tinha, mas não ficava falando essas loucuras que o Bolsonaro fala, de dar armas para as pessoas e tal. Eu não sou lulista, mas consigo colocar um do lado do outro e ver que um vai dar em confusão e o outro não. O Lula teve uma história no sindicalismo, era um negociador. Se, depois, meteu os pés pelas mãos, é outro departamento. Mas como liderança política ele tinha uma biografia que o qualificava. O Bolsonaro não tem.

A união entre partidos pode diminuir essa possível força de Bolsonaro?

É uma forma de reduzir o “risco Bolsonaro”, que é um dos riscos possíveis. O outro risco é o populista, que também é um objeto escorregadio. Você tem populistas de diferentes tipos, e o Bolsonaro é também populista. O populista é um político que superpõe às instituições o carisma dele, a força imagética dele, o talento que ele julga ter, o discurso que ele tem. Ele se vê como mais forte que as instituições e ele é pouco atento às questões do equilíbrio fiscal.

A esquerda brasileira poderia ou deveria seguir o modelo de unir seus partidos?

Se a esquerda tiver preocupação de constituir um polo competitivo em termos eleitorais, ela tem que se unir. Você tem Ciro, Marina, Manuela e Boulos, mas uma parte está mais perto do centro, que é a Marina, uma parte mais no extremo, que é o Boulos, um cara da luta, do enfrentamento, da mão na massa. A Manuela também, mas ela é de um partido de esquerda que é um pouco mais suave do que o PSOL, que faz política de uma outra maneira. O PCdoB vem de uma trajetória histórica que educou os comunistas a negociarem mais, a entrarem com mais facilidade na composição dos governos. O PT está sem candidato hoje, mas a gente teria que colocar um eventual candidato do PT nesse lote da esquerda. Eles todos poderão se abraçar por conveniências, mas tem diferenças ali.

Do ponto de vista de um cálculo para aumentar a competitividade da esquerda, o correto seria uma unidade, uma frente de esquerda, acho que seria mais produtivo. Mas há dificuldades ali, as mesmas que você tem para o centro democrático se juntar. O único que não enfrenta esse problema é o Bolsonaro. Ninguém vai se unir ao Bolsonaro, e ele não tem que resolver essa questão da unidade

 

A Quarta Revolução Industrial: oportunidades e desafios para o Brasil

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A sociedade mundial passa por momentos de excitação e grande apreensão em decorrências das inúmeras transformações que a estrutura produtiva e as cadeias globais de produção estão passando nas últimas décadas, gerando novas oportunidades de negócios e de emprego, além de muitas incertezas e instabilidades, levando o indivíduo a patologias físicas, sociais e emocionais, neste ambiente a depressão se tornou uma realidade para quase 5% da população mundial, a ansiedade, os transtornos, a obesidade e as síndromes se espalham por todas as regiões e colocam os profissionais da saúde desafios imensos e imediatos.

Inúmeras são as transformações em curso na sociedade, desde comportamentos sociais, medos urbanos, mudanças nos relacionamentos, questões de gêneros, lutas por poder e dominação, ou seja, são muitos e variados, muitos deles existem na sociedade desde os primórdios da humanidade e outros são novos e desafiadores, sentidos fortemente pelos indivíduos, mas pouco compreendidos em sua totalidade, dentre os desafios, gostaríamos de destacar alguns deles gerados pela Quarta Revolução Industrial em curso, seus impactos sobre as empresas, sobre os empregos, sobre os indivíduos e sobre toda a coletividade nacional e internacional, isto porque é importante que destaquemos que estes desafios são de toda a civilização mundial.

Nesta nova sociedade global, alguns dados nos impressionam e nos geram grandes preocupações, segundo a Lei de Moore, a cada dezoitos meses a capacidade de armazenamento dos chips dobram, um tablet tem a capacidade de processamento equivalente a 5 mil computadores de trinta anos atrás, o custo anual de armazenamento de 1GB de dados a 20 anos era de US$ 10 mil, hoje, de menos de US$ 0,03; um floco de grafeno de 1 µm custava em 2014 US$ 1.000, hoje os valores se reduziram imensamente, abrindo novos espaços para negócios e novas oportunidades de investimentos, com potencial revolucionário, semelhante ao do plástico e do silício.

Outro dado que nos chama muito a atenção neste novo momento da estrutura produtiva internacional é que, as grandes indústrias do mundo que dominaram a sociedade mundial desde o início do século XX, perderam espaço para as empresas de tecnologia, que hoje são as grandes responsáveis por grande parte destas mudanças. Em 1990, na cidade de Detroit, nos Estados Unidos, as três grandes montadoras apresentavam valor de mercado de US$ 36 bilhões, vendas de US$250 bilhões e 1,2 milhão de empregados; na atualidade, o grande polo de desenvolvimento norte americano é o Vale do Silício, onde as três maiores empresas possuem US$1,03 trilhão de valor de mercado, vendas de US$247 bilhões e 137 mil empregados, ou seja, estas mudanças estão alterando imensamente toda a estrutura de poder das empresas internacionais, destacando ainda que, de todas as grandes empresas de tecnologia do mundo, a grande maioria são as norte-americanas.

Neste percurso de grandes transformações econômicas, percebemos que as grandes transformações do mundo foram impulsionadas pelos desenvolvimentos tecnológicos, que trouxeram grandes ganhos para a comunidade internacional, mas suscitaram também grandes desafios de adaptação dos indivíduos, exigindo flexibilidades e agilidades que, na atualidade, são fenômenos normais e fundamentais, obrigando-nos a sairmos da zona de conforto e nos habilitarmos à busca pelo conhecimento, ao incremento do estudo e por habilidades que muitas vezes desconhecíamos que as possuíamos. A Primeira Revolução Industrial ocorre na Europa no século XVIII, onde a máquina a vapor, a tecelagem, a siderurgia, as ferrovias, os navios a vapor, além dos setores de bens de capitais, tudo isso impulsionou o processo de urbanização, o trabalho assalariado e contribuiu para o crescimento do mercado mundial.

A segunda grande transformação industrial ocorreu, também na Europa, no período entre 1870 e 1970, neste período, os setores mais dinâmicos deste processo foram: eletricidade, motores de explosão interna, telégrafo, telefonia, linha de montagem, surgem os embriões do que seria mais tarde o modelo Fordista de produção, baseado no consumo de massa, na especialização, no grande contingente de funcionários, na produção em série, etc.

O século XIX trouxe grandes mudanças nas estruturas produtivas, a especialização do trabalhador e os vultosos investimentos em Ciência, pesquisa e inovação, foram fundamentais para que o século ficassem na história da humanidade como um dos momentos mais dinâmicos e progressivos, não apenas no campo do desenvolvimento científico, mas também no campo das ideias, da filosofia e com isso, contribuíram para o surgimento de novas Ciências, tais como a Sociologia, que passa a investigar a relação entre os seres humanos, dos grupos sociais e da sociedade.

Nos anos 1970 surge uma nova estrutura científica e tecnológica que passa a impulsionar novas formas de organização social e política, este período ficou conhecido como Terceira Revolução Industrial, motivada pelo avanço das tecnologias ligadas à informática e as comunicações, surgindo desta união a rede mundial dos computadores, a internet, destacando ainda, semicondutores, mainframes, PCs, automatização da linha de montagem, Globalização, padronização de padrões de consumo, cadeias produtivas globais, etc.

Estas transformações impactaram imensamente sobre os indivíduos, o desenvolvimento da internet aproximou muito as pessoas, intensificou os relacionamentos, criando nichos e grupos específicos com comportamentos, hábitos e costumes diferenciados, gerando alterações nas estruturas sociais, famílias, escolas, religião e, com isso, trazendo novos desafios para as pessoas, comunidades e grupos sociais.

Se observarmos atentamente estas mudanças em curso na sociedade desde a primeira revolução industrial, vamos perceber que, de uma para outra, as mudanças são cada vez mais rápidas, intensas e aceleradas, com isso, os indivíduos não conseguem acompanhar tais mudanças e passam a se assustar com a velocidade e as instabilidades e incertezas das transformações, gerando patologias sociais e emocionais nos trabalhadores, principalmente naqueles dotados apenas de força física e material, com baixa qualificação, sem estudo e sem perspectivas maiores.

O século XXI está nos trazendo novas mudanças na estrutura produtiva, as cadeias globais de produção se espalham por todas as regiões do mundo, o comércio internacional movimenta mais de R$ 25 trilhões por ano, as economias estão cada vez mais integradas e interdependentes, a tecnologia desta nova revolução para muitos conhecida como Quarta Revolução Industrial ou Indústria 4.0, esta está alicerçada na onipresença da internet, na articulação de sistemas físicos e digitais, na computação quântica, na biotecnologia, na inteligência artificial, na internet das coisas, na internet nas nuvens, o resultado destas transformações ainda estão por ser estudados, mas as preocupações com seus impactos são intensos e preocupantes.

Esta Quarta Revolução Industrial é a responsável pelo surgimento de empresas e negócios revolucionários, onde destacamos Uber, AirBnB, WhatsApp, Wase, Netflix, todos estes empreendimentos seriam impossíveis de imaginar a uns 20 anos estão gerando grandes mudanças na sociedade, tudo isso só foi possível graças ao crescimento da internet e da facilidade das conexões, possível devido ao crescimento do mercados de smartphones, praticamente encontramos mais telefones celulares disponíveis do que pessoas no mundo contemporâneo.

Empresas como a Netflix estão alterando por completo um negócio que até então estava bastante acomodado, hoje as plataformas de streaming movimentam bilhões de dólares e exigem que seus concorrentes se transformem, ou melhor, que se reinventem completamente, não o fazendo serão engolidos pela tecnologia avassaladora que movimenta o mercado.

O Uber, aplicativos que liga carros particulares a pessoas que buscam se movimentar nos centros urbanos, vem criando graves constrangimentos para os motoristas de táxi e com governos e prefeituras, uns porque estão perdendo seu monopólio de transporte de pedestre e o outro porque, por esta nova plataforma, os governos perdem controle dos impostos e perdem arrecadação de tributos, inviabilizando muitos agentes públicos.

Devemos salientar ainda, que não se trata apenas de  mudar o “o quê“ e o “como” fazemos as coisas, mas também de definir “quem” somos, ou seja, o mundo digital que estamos mergulhados ou melhor, que estamos mergulhando, exige que os negócios, as empresas, as pessoas e a sociedade de uma forma geral, passe a perceber quem cada um é efetivamente na sociedade, isto passa a ser fundamental para o êxito de todo e qualquer negócio e empreendimento.

Quando analisamos detalhadamente estas transformações, destacamos que elas se sustentam em três grandes vetores por trás da Quarta Revolução Industrial: tecnologias físicas (veículos autônomos, impressão em 3D, robótica avançada, novos materiais e nanotecnologias), tecnologias digitais (inteligência artificial, internet das coisas, Blockchain, Bitcoin, Big Data, economia sob demanda e ampliação da capacidade de armazenamento de dados) e biotecnologias (sequenciamento genético, biomimetismo, ciência do cérebro, Biologia sintética por meio de manipulação do DNA, combinação de edição de genes e impressoras 3D).

A junção de todas estas tecnologia juntas está transformando a sociedade internacional, a pesquisa científica está transformando o século XXI no século da Biologia, inúmeras são as mudanças e os avanços que estão sendo liderados por esta área do conhecimento, desde o sequenciamento genético que, num futuro não muito distante, irá prever doenças e indicar tratamentos específicos individuais, as novas tecnologias de impressão 3D está dando, ao homem, a esperança de impressão de órgãos humanos, ou seja, com isso, o corpo humano poderá ser consertado como se faz na atualidade com os automóveis que, quando apresentam problemas, suas peças são substituídas por outras novas, uma transformação que os mais otimistas e adeptos da tecnologia jamais imaginou que seria possível.

No mundo dos negócios os impactos são variados, muitos mercados até então deveras protegido, estão se abrindo a uma competição global, onde empresas estrangeiras estão entrando, trazendo sua experiência e obrigando as locais a se adaptarem, melhorando a produtividade, reduzindo custos e otimizando processos, além disso, estão investindo cada vez mais em pesquisas nas áreas de marketing para descobrir e se antecipar as demandas e gostos dos consumidores que passam a exigir cada vez mais das empresas, obrigando os gestores a constantes treinamentos e qualificação e os trabalhadores a constantes mudanças, agilidades e flexibilidades.

Neste ambiente de constantes transformações, faz-se necessário, que os trabalhadores se qualifiquem cada vez mais, os diplomas, cursos, extensões, treinamentos estão em moda na sociedade, a qualificação é a mola para se adaptar aos novos modelos de organização dos mercados, aprender e desaprender são habilidades exigidas, proatividade, trabalho em grupo, resiliência, flexibilidade, equilíbrio emocional e uma constante capacidade de se reinventar são centrais nesta sociedade, além de uma alta dose de liderança e empreendedorismo.

Faz-se importante destacar, do ponto de vista político, que o Estado Nacional perde força constantemente, sua capacidade de tributação e controle interno se reduzem e, com isso, a contemporaneidade coloca em xeque a perpetuação deste agente central para a organização social, política e institucional, exigindo que a própria sociedade construa novos instrumentos de organização e estruturação dos agentes econômicos e sociais, este nos parece um dos maiores desafios do Estado nesta nova sociedade.

Dentro deste ambiente citado e analisado acima, como se encontra a sociedade brasileira, diante de tantas transformações? Será que estamos preparados para o mundo do trabalho que se está desenhando?  São inúmeras as perguntas que nos levam a reflexão e nos levam também ao medo, a insegurança e a instabilidades crescentes e ameaçadoras.

No caso brasileiro, percebemos que não mais contamos com o chamado bônus demográfico, estamos nos tornando um país de idosos, assim como os países desenvolvidos, o grande problema é que, enquanto os países europeus enriqueceram antes de  envelhecer o Brasil está envelhecendo sem ficar sem se desenvolver, ou seja, estamos ainda sendo chamado de países em desenvolvimento, uma nomenclatura que se alterou constantemente nos últimos cinquenta anos e, neste período, ainda continuamos subdesenvolvidos.

Com relação a mão de obra brasileira, encontramos aí um outro grande gargalo, nossa força de trabalho apresenta baixíssima produtividade, isto acontece e se perpetua porque ainda não resolvemos problemas centrais na nossa sociedade, temos uma estrutura tributária arcaica e regressiva, que pune os empreendedores e glorificam aqueles que sobrevivem através das benesses do Estado Nacional, sem reverter esta inconsistência, dificilmente vamos atingir o local que a população brasileira espera, um país digno, decente, sem pobreza e com grandes perspectivas de sucesso para as próximas gerações.

O mundo da Quarta Revolução Industrial nos impõe grandes desafios, o jeitinho brasileiro se mostrou ineficiente e limitado, o mundo não mais vai esperar o país acordar de berço esplêndido, estamos nos momentos de acordar para as duras realidades da vida, ou as encaramos de perto ou nos condenamos a ser o eterno país do futuro, um futuro cada vez mais distante e inalcançável.

Não conseguiremos alcançar os padrões dos países desenvolvidos enquanto não investirmos maciçamente na construção de cidadãos conscientes e responsáveis, se continuarmos produzindo em escala consumidores com baixos salários e sem visão política crítica e imediatista, o país continuará condenado a ser governado por governantes míopes dos  interesses coletivos e imensamente concentrado em seus interesses imediatos, estimulando o individualismo e se locupletando dos recursos amoedados da população.

O desenvolvimento tecnológico deve ser visto como um grande instrumento de diminuição das desigualdades sociais e políticas, depois de dominar a natureza e se utilizar dela para sua sobrevivência, o homem contemporâneo precisa desenvolver novas habilidades para construir uma sociedade global cada vez mais consistente, onde os frutos da riqueza social sejam distribuídos por todos e não fiquem concentrados nas mãos de uma pequena classe de privilegiados que, nos dias atuais, nem olham pela janela de suas casas e residências porque estas estão cercadas de grades, muros e câmeras por todos os lados e, principalmente, porque quando olham pelas janelas se deparam com a pobreza, a miséria e a indigência de seres humanos que estão reduzidos a uma condição de inferioridade e exclusão social.

Como destacou Franklin D. Roosevelt: “O teste de nosso progresso não é se agregamos mais à abundância daqueles que têm muito, mas se fornecemos o suficiente para aqueles que têm pouco”. Se analisarmos bem as palavras acima, vamos perceber que estamos muito distantes desta realidade, estamos acrescentando mais e mais aos que tem muito e deixando de lado aqueles que pouco possuem, a tecnologia deve contribuir para o incremento da felicidade humana e não tornar os seres humanos escravos da tecnologia e do lucro desenfreado, só assim vamos construir uma felicidade verdadeira alicerçado na solidez dos valores universais de ética, moral e prosperidade.

Grupo de Estudo – Sociedade em transformação: os impactos da     Tecnologia sobre o trabalhador, o emprego e o mundo do trabalho. Faculdade de Tecnologia de Catanduva – FatCat.

Coordenação Professor Dr. Ary Ramos da Silva Júnior

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

‘O País é refém do cenário externo e dos especuladores internacionais’.

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Entrevista | Pedro Rossi

por Carlos Drummond — publicado 09/06/2018 09h46 – Revista Carta Capital.

O BC usa instrumentos “amigáveis ao mercado” limitados e não tem força para barrar uma fuga de capitais mais forte, alerta economista

A volatilidade da moeda brasileira tende a se agravar no período eleitoral, analisa Pedro Rossi

O real parou de desvalorizar após a ação do Banco Central na quinta feira 7, mas ninguém sabe como serão as próximas semanas, pois a adoção de uma política cambial mais passiva desde 2015 reforçou a vulnerabilidade do País, dispara o economista Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp e autor do livro Taxa de Câmbio e Política Cambial no Brasil (Editora FGV).

Os instrumentos usuais de atuação no mercado de câmbio, diz, como as intervenções e os swaps, apesar de importantes, não são suficientes para mitigar a volatilidade e as tendências cambiais geradas pelo setor financeiro.

“Não é razoável o grau de volatilidade da moeda brasileira que tende a se agravar no período eleitoral, quando a fuga de capitais é instrumento de coação do mercado financeiro. Foi assim em 2002 e um pouco em 2014, deve ser assim em 2018. E o pior é que essa prática antidemocrática funciona: os candidatos favoritos se dobram às demandas do mercado com medo da instabilidade que ele pode gerar.” Rossi concedeu aCartaCapital a entrevista a seguir.

CartaCapital: É possível distinguir, no caso do Brasil, a responsabilidade específica da política cambial do Banco Central na desvalorização do real, semelhante à das moedas de outros emergentes como Argentina, Turquia e África do Sul e que tem a ver também com uma conjuntura de mudança na política monetária dos EUA e guerra comercial mundial iminente?
Pedro Rossi: O que dá a tendência do movimento cambial é principalmente o cenário externo. O Brasil é, entretanto, extremamente vulnerável e sensível aos humores dos investidores internacionais. O BC, ao adotar uma postura de política cambial mais passiva desde 2015, reforça essa vulnerabilidade. A leitura do mercado é que o BC não vai impor perdas para ele. Um dos motivos para a vulnerabilidade é um mercado de derivativos de câmbio muito líquido. Em maio o fluxo cambial foi positivo em 1,7 bilhão de reais, mas a desvalorização veio da pressão dos especuladores no mercado de derivativos.

CC: Como analisa a decisão do BC tomada na quinta-feira 8 de aumentar em 20 bilhões de dólares o volume de operações de swap e quais as consequências da medida para a população e a economia?
PR: É uma medida market friendly ou “amigável ao mercado”, pois oferece liquidez em dólar no mercado futuro. Ou seja, o governo vende dólar futuro para quem quer se proteger da desvalorização do dólar, mas também para quem especula contra o real. Essa operação tem um custo fiscal se o real continuar desvalorizando, mas se a moeda brasileira se valorizar há ganho fiscal que aparece na conta de juros, fora das limitações do superávit primário.

CC: Aparentemente funcionou, ao menos num primeiro momento, pois o dólar caiu. Qual a durabilidade e o custo disso?
PR: Funciona, o resultado de curto prazo é visível inclusive na taxa de câmbio hoje, mas nada garante que isso possa ser sustentado ao longo das próximas semanas. Porque no fundo o Banco Central usa mecanismos que são “amigáveis ao mercado”, mas ele não tem mecanismos estruturais para impedir especulação contra a moeda brasileira. Usa instrumentos, mas não tem força para barrar uma eventual fuga de capitais mais forte. Esse mecanismo de venda de swaps tem efeito limitado.

CC: Por que não tem força?
PR: Porque o mercado brasileiro é muito aberto, muito desregulamentado, principalmente o de derivativos e há uma quantidade muito grande de passivos de curto prazo e de participantes estrangeiros no mercado de derivativos. Quando o mercado atua contra a taxa de câmbio o BC não tem instrumentos estruturais para travar isso.

É diferente de 2012, quando o governo Dilma começou a aplicar uma série de medidas a partir de 2011, entre elas o controle de capitais sobre os fluxos, a administração do mercado interbancário de câmbio com oneração de posições dos bancos e também com o IOF sobre derivativos. Quando o governo fez isso, ele fechou uma estrutura e o mercado perdeu a força para atuar contra o governo. Isso até aumentou a eficiência dos swaps das intervenções, porque o mercado sabia que ele não tinha como enfrentá-lo pois estava mais amarrado, mais regulado. Hoje não tem mais esse controle, retirado ao longo de 2012 e 2013. Aí o mercado ganhou um protagonismo maior na determinação da taxa de câmbio.

CC: Os controles começaram a ser retirados portanto antes do golpe que removeu Dilma do governo.
PR: Sim. Foram substituídos por um programa de swap diário, mais “amigável ao mercado”, a partir de 2013 e 2014, e que deu lugar em 2015 a uma política mais passiva de intervenção no mercado de câmbio.

CC: Ainda mais amigável.
PR: Mais amigável ainda. Swaps e reservas são instrumentos que você oferece ao mercado, se ele quiser compra, se não quiser não compra. São diferentes do IOF, em que se joga o custo no mercado. Então se alguém quiser especular vai ter que incorrer naquele custo. Se quiser por exemplo entrar no País para permanecer por dois meses, terá um custo, pois é um capital de curto prazo que será taxado. Essas medidas não são amigáveis. São justamente as medidas que eu defendo para tornar o mercado de câmbio brasileiro mais resiliente a especulação e fuga de capitais.

CC: Qual a sua explicação para esse recuo ainda no governo anterior?
PR: Ocorre que foi criada toda uma regulação para a apreciação cambial. O câmbio estava valorizando demais, chegou a 1,50 real por dólar em meados de 2011 e aí se montou uma estrutura para conter a valorização. Depois o mercado internacional mudou de sentido e as pressões passaram a ser para desvalorização, mas o governo não montou uma estrutura no sentido inverso, ou seja, para impedir uma volatilidade excessiva do real no rumo oposto.

Substituiu o que existia pelo mecanismo do swap. Depois, em 2015, passa a predominar uma mentalidade que fez parte do governo como um todo, uma guinada completa na política econômica incluindo uma política de crédito mais liberal, redução do papel dos bancos públicos e das estatais, política monetária e fiscal contracionistas e uma política cambial mais liberal no sentido de que o mercado determina a taxa de câmbio e o governo intervém pouco. Uma política passiva portanto, a partir da dupla Joaquim Levy no ministério da Fazenda e Alexandre Tombini no Banco Central.

CC: Há encaminhamento alternativo? Qual seria?

PR: Sim. Os instrumentos usuais de atuação no mercado de câmbio, como as intervenções e os swaps, apesar de importantes, não são suficientes para mitigar a volatilidade e as tendências cambiais geradas pelo setor financeiro. O desafio da política cambial é mais complexo e exige um olhar transformador sobre a atual institucionalidade do mercado de câmbio. A política cambial tem a importante função de neutralizar distorções provocadas pelo setor financeiro, reduzir a volatilidade da taxa de câmbio e fazer com que esse preço estratégico acompanhe as necessidades da economia brasileira. Não é razoável o grau de volatilidade da moeda brasileira, e é preciso atuar em três frentes de política cambial: a regulação de fluxos de capital, do mercado interbancário e do mercado de derivativos.

CC: Segundo relatam os jornais, alguns participantes do mercado receiam uma alta dos juros de supetão, do mesmo modo como fez o BC da Turquia, embora o BC brasileiro negue sistematicamente mexer nas taxas. É mesmo inevitável esse aumento dos juros? Por quê?PR: O aumento de juros seria uma tentativa desesperada de conter a especulação contra o real às custas de mais recessão no Brasil. Essa discussão só mostra o quanto não temos autonomia de política econômica e o País é refém do cenário externo e dos especuladores internacionais.

CC: O Brasil está no primeiro pelotão dos países com moedas mais desvalorizadas o que seria uma decorrência, segundo vários economistas, de se aceitar nas últimas décadas déficits em transações correntes para viabilizar uma política econômica que visasse o controle da inflação e a atração de capital externo, em tese para financiar investimentos produtivos, mas na prática encaminhado em sua maior parte para a especulação. Concorda com essa visão? Por quê?

PR: Acho que essa explicação pode ser melhorada. O que fez o real valorizar demais tempos atrás, hoje faz o real depreciar demais. Desde 1999, quando adotamos o câmbio flutuante, o real tem sido uma das moedas mais voláteis do sistema internacional e sujeita a ciclos de forte valorização e desvalorização.

Essa volatilidade é decorrente de dois fatores (1) do alto patamar da taxa de juros que torna a moeda brasileira um alvo preferencial das operações especulativas e  (2) de um ambiente institucional atraente para fluxos de capitais de curto prazo e para apostas nos mercados de derivativos de câmbio, onde se forma a taxa de câmbio dada a sua maior liquidez.

Por isso somos muito vulneráveis ao ciclo de liquidez internacional: por um lado, quando o cenário internacional está positivo, recebemos muito passivos de curto prazo e entrada de estrangeiros nos mercados de derivativos e por outro lado, sofremos mais pressão vendedora quando o cenário se deteriora.

Essa volatilidade tende a se agravar no período eleitoral quando a fuga de capitais é instrumento de coação do mercado financeiro, foi assim em 2002 e um pouco em 2014, deve ser assim em 2018. E o pior é que essa prática antidemocrática funciona; os candidatos favoritos se dobram às demandas do mercado com medo da instabilidade que ele pode gerar. Mas, por enquanto, ainda é cedo para associar diretamente essa forte desvalorização ao processo eleitoral.

 

Chico Xavier E foi assim…

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Uma obra bastante polêmica de Carlos A. Baccelli, em muitos momentos me parece mais um grande desabafo, sua leitura é de suma importância para todos que buscam a compreensão de como funciona o Movimento Espírita, seus desafios e necessidades.

 

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Transição Planetária: um novo homem para um mundo novo

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A sociedade mundial se encontra em um momento de grande apreensão e instabilidade, momentos de medo e inseguranças gerados por grandes transformações em curso que ninguém sabe informar para onde vamos e quais os impactos destas mudanças para os seres humanos e para a sociedade em geral, mas todos sabemos que estas transformações são irreversíveis e inadiáveis.

A imprensa, os sites, a mídia e os jornais publicam informações variadas sobre as catástrofes que ocorrem no mundo contemporâneo, as fomes generalizadas, a violência crescente e descontrolada, o xenofobismo constante, as guerras fratricidas, os confrontos assustadores e os medos interiores, gerados pela depressão, pela ansiedade, pelos complexos, pela obesidade e, em último caso pelo suicídio crescente que atingem milhares de pessoas no mundo todo.

Diante desta realidade, muitos nos abordam para perguntar o que está acontecendo com o mundo em que vivemos, para onde vai toda esta sociedade e quais as perspectivas para as relações entre os seres humanos em um mundo marcado por tantos medos e inseguranças generalizadas.

A Doutrina Espírita nos traz grandes informações sobre o momento atual, seu estudo e reflexão críticas nos mostra que vivemos um momento único e especial na história da humanidade, um momento de mudanças e transformações, tudo isso geram medos e incertezas em todos os indivíduos e estes medos levam a população a se enveredar por caminhos pouco conhecidos, buscando soluções mágicas e respostas imediatas e encontram charlatanismo e explorações constantes, abrindo espaço para inescrupulosos e explorados que se apropriam dos medos para enriquecimentos ilícitos e comportamentos reprováveis.

A chamada transição planetária pode ser descrita como um momento novo da sociedade em que os Espíritos superiores estão impulsionando o progresso da humanidade, acreditamos que este impulso se dará com o expurgo de todos aqueles espíritos que não estão em condições de contribuir, no momento, com o progresso da humanidade e serão levado para outros planetas até que consigam uma evolução que os permita aqui regressar e participarem ativamente deste novo momento da humanidade terrestre. Esta experiência de expurgos não é nova na história do planeta Terra, Edgar Armond em Os exilados de Capela, nos detalha um momento em que um grupo de espíritos renitentes no mal foram retirados compulsoriamente da constelação de Castela e foram trazidos para o planeta Terra e, com isso, contribuíram decisivamente para o progresso terrestre, isto porque apesar de serem espíritos ainda atrasados nos valores morais eram bastante adiantados no conhecimento científico e tecnológico, sendo responsáveis por avanços e impulsos em regiões como o Egito e a Grécia antigos, países que os receberam e cresceram muito nos períodos onde estes capelinos ali estiveram e, com o retorno destes a seu planeta de origem, se viram mais atrasados e perderam o eixo do progresso, se transformando na atualidade em povos dotados de uma herança cultural e científica imensas e um atraso social considerável.

A Transição Planetária que vivemos na atualidade é um período parecido com o descrito por Armond, o mundo contemporâneo precisa progredir, a espiritualidade maior já deu ordens expressas de que precisamos sair da letargia e crescer de forma organizada e generalizada, para que isso aconteça, faz-se necessário, que todos aqueles espíritos que retardam o progresso sejam transferidos para outras paragens mais atrasadas que o Planeta Terra e fiquem aqui apenas aqueles que estão em consonância com os novos rumos que Jesus, o governador do Planeta Terra, quer implementar para nosso planeta. Faz-se necessário ainda, destacar, que muitos espíritos estão chegando ao planeta Terra compulsoriamente, irmãos renitentes no mal que lutaram com toda sua força para não voltar ao mundo da matéria e foram obrigados pela espiritualidade maior a regressar, estes irmãos estão muito vinculados ao mal, sentem prazer em ver o atraso da humanidade, se sintonizam com os sentimentos mais negativos e mesquinhos que conhecemos e, mesmo assim, foram convidados a reencarnar, como não quiseram e lutavam contra isso, pois sabiam que seus débitos eram imensos e não poderiam comandar seu processo reencarnatório, fugiram durante muitos séculos até que foram obrigados a voltar ao corpo material e estão ao nosso lado no planeta Terra, a grande maioria destes espíritos são altamente inteligentes e capacitados, mas se comprazem com os malfeitos e tentam impingir ao mundo contemporâneo seus valores e sentimentos negativos, é por isso que percebemos, no mundo contemporâneo, uma grande desordem e instabilidade, tudo isso em decorrência das energias emanadas por estes irmãos que estão tendo sua última chance na Terra, se não se utilizarem desta chance para sua melhoria íntima serão compulsoriamente expurgados para outras regiões do espaço que mais se afinizam com seus sentimentos e energias.

O século XXI é o momento exato destas grandes mudanças, percebemos todos os momentos que vivemos em um mundo diferente dos anteriores, de um lado encontramos muitas energias deletérias e negativas, marcadas por atrasos de espíritos que ainda se comprazem ao mal e, ao mesmo tempo, percebemos inúmeros avanços científicos e tecnológicos, doenças que até pouco tempo condenavam os indivíduos a morte ou a condições indignas de sobrevivência, na atualidade são curáveis e possuem tratamentos acessíveis a grande maioria da humanidade, trabalhos que anteriormente degradavam o corpo dos trabalhadores condenando-os a morte precocemente ou até gerando graves distúrbios emocionais e psicológicos na atualidade são realizados por máquinas e equipamentos baseados em tecnologia de ponta, tudo isso mostra que vivemos no mundo uma grande contradição, um período onde o bem e o mal se mostra cada vez mais intensamente dentro dos corações e espíritos de cada um dos indivíduos numa luta constante, preocupante e, muitas vezes, fratricida.

Segundo os relatos dos espíritos superiores, este momento demandará grandes esforços da humanidade, neste período muitos irmãos que ainda se comprazem com os malfeitos estarão “soltos” no mundo e suas energias e sentimentos deletérios podem gerar constrangimentos para aqueles que não se precaverem e se fortalecerem energeticamente, conseguindo, com isso, forças e antídotos para se livrarem da influência deste mal gerado por estes irmãos.

Entendemos como antídotos para nos proteger deste ambiente de medos e energias menores, os passes, as boas vibrações, a caridade e os trabalhos assistenciais, tudo isso contribui para que os indivíduos se fortaleçam neste mundo estranho e cheio de situações embaraçosas que nos afligem e causam preocupações, o trabalho no bem, a transformação íntima e a caridade, somados ao cultivo de bons pensamentos nos fortalecem de forma generalizada, nos auxilia na construção de uma grande redoma do bem que nos protege e nos abriga, abrindo-nos espaços sempre para mais trabalhos assistenciais e auxílios, pois sabemos que é muito melhor, para cada um de nós, auxiliar os irmão com dificuldades do que sermos auxiliados por outros irmãos.

A Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec nos mostra inúmeros caminhos para vivermos este momento de instabilidade e incertezas, nos mostram como devemos trilhar nosso caminho, superar as dificuldades e improvisos e construir uma trajetória de sucesso e progresso, com isso, seremos impulsionados para frente e conduzidos para um mundo melhor, mais solidário e construtivo, devemos com esta doutrina nos preparar para este mundo novo que está se abrindo para todos nós, um mundo onde o mal, ou a ausência do bem, se reduzirá e as oportunidades serão cada vez maiores para todos mas, tenhamos calma, e confiemos em Deus, trabalhando, orando e buscando nossa melhoria íntima e pessoal, só assim perceberemos a importância de caminhar ao lado do bem em todos os momentos de nossa caminhada.

A mídia nos mostra muitas violências no cotidiano, muitas mortes, injustiças e medos, ao vermos tudo isso nos perguntamos o que está acontecendo com nosso planeta e qual será seu futuro imediato, suas chances de sobrevivência e suas oportunidades de progresso, nos esquecemos claramente que neste mesmo mundo, o governador espiritual é o nosso querido mestre Jesus, que está no leme desta embarcação e tem planos claros e ambiciosos para este planeta, chega de maldade e inverdades, o mundo em que vivemos é um mundo que se preparar para ser cada vez melhor para todos ou, pelo menos, para a grande maioria, desde que sigamos as pegadas do mestre Jesus.

Os crimes e as violências que percebemos na sociedade contemporânea está diretamente ligada aos sentimentos inferiores que ainda vivem e repousam dentro de cada um de nós, se cada um refletir sobre suas inclinações seremos bombardeados por sentimentos variados, somos seres em evolução, ainda imperfeitos, temos muitas negatividades dentro dos nossos corações, cultivamos o egoísmo e o orgulho, queremos crescer, nos melhorar e contribuir para a criação de um mundo melhor, mas para isso devemos nos utilizar desta reflexão para progredirmos e cultivar sentimentos melhores e mais saudáveis e não como forma de ficar reclamando e colocando a culpa de nossas dificuldades naqueles que estão ao nosso lado ou naqueles que nem conhecemos, mas já elegemos como os responsáveis por nossas desditas intimas.

A Transição Planetária escancará nossos males, mostra para todos nós que o mal do mundo é o mal dos seres humanos, os irmãos que comprazem com o mal são espíritos como nós, precisam ser amados e respeitados por todos, muitas vezes os vemos como seres abjetos e monstruosos, com isso, nos colocamos como superiores e esquecemos de que são nossos irmãos, merecem e precisam de nosso carinho e respeito, se não emitirmos sentimentos, pensamentos e energias salutares a estes irmãos estaremos os condenando a viverem no mal por muitos e muitos anos, migrando por inúmeros planetas e se posicionando em escalas inferiores durante muitos séculos.

O mundo material que vivemos está imerso em imediatismo, nossa sociedade se compraz com os prazeres da matéria, o mundo do sexo mostra claramente suas facilidades, o poder do dinheiro nos desnuda muitas oportunidades e possibilidades de acumulação, nossa ética e nossa consciência moral estão cada vez mais elástica, nos comportamos de acordo com nossos desejos imediatos e nos esquecemos de que a morte não existe da forma como acreditamos, muitos fazem desta vida um verdadeiro parque de diversão, acumulam e gozam a vida de forma desvairada e quando chegam no mundo espiritual se encontram em condições lamentáveis de indigências e deturpações emocionais e espirituais, neste instante percebem que a morte não existe, apenas saímos do mundo material e migramos para o mundo dos espíritos e nesta migração seremos cobrados por nossas ações, nossos pensamentos e realizações, não cabendo mais espaços para subterfúgios, é neste momento que percebemos que muitos figurões do mundo contemporâneo, que dedicaram seus dias para os acúmulos monetários e financeiros, chorarem e se debaterem feitos crianças de colo que choram desesperadamente implorando um pouco de leite para saciar sua fome e suas carências alimentares e, ao mesmo tempo, encontramos mendigos e pessoas humildes que passaram pela vida sem recursos e, mesmo assim, conseguiram, dividir o pouco que possuíam com os mais desvalidas e desprovidos, estes serão exaltados na hora da passagem e serão recompensados por suas atitudes e gestos caridosos e edificantes, cabe a nós escolhermos aonde queremos e vamos nos posicionar nesta equação que a todos envolve na vivência do cotidiano.

 

Crise, caos e desgoverno no Brasil: uma visão perturbadora do futuro do país

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Nos últimos anos o Brasil vem passando por situação de grande instabilidade, incerteza e um caos generalizado, onde as discussões giram sempre em torno de questões irrelevantes e as soluções surgem como propostas demagogas e autoritárias, um verdadeiro desgoverno de fazer inveja aos tempos conturbados de Dilma Rousseff. Estamos mesmo regredindo ou estamos numa situação de reconstrução da realidade nacional? Uma resposta para esta pergunta só o tempo vai nos mostrar de forma mais clara, aguardemos então.

Nestes momentos de crises e caos estamos ouvindo de tudo, desde assobios autoritários de pessoas ignorantes e desqualificadas até tabelamentos de preços de fretes e a busca por socorro do velho Estado, passando por discursos exaltados de combate a violência urbana, intervenções generalizadas das Forças Armadas através de solicitações de governos civis, uma verdadeira pantomina, cujo final nada tem de positivo e de auspicioso, mas de medo, instabilidade e incertezas.

De um lado enxergamos muitos pontos positivos desta situação de caos generalizado, a sociedade passa a tomar consciência de que o Estado não tem mais brechas fiscais e financeiras para financiar novas demandas imediatas, os governos municipais, estaduais e federal não tem mais sobras para aumentar os gastos públicos, as grandes demandas construídas sob o suporte da Constituição Federal de 1988, que completa trinta anos, não mais podem ser atendidas pelo Estado, que se encontra em uma crise fiscal pouco vista em sua história e necessita de um novo pacto social ou entra em condição de insolvência e, com isso, caminhará, a passos largos, para a bancarrota.

Os inúmeros subsídios públicos precisam ser rediscutidos, as isenções fiscais e tributárias para muitas instituições sociais e políticas devem ser repensadas, os altos salários e benefícios dos servidores federais, principalmente judiciário e legislativo, devem ser revistos e as federações e sindicatos devem ser melhor investigadas pelos órgãos especializados, tudo isso deve ser feito para que o Estado Nacional recupera seu papel de protagonista na sociedade brasileira, sob pena de que, se não for feito, a sociedade civil tende a entrar em um clima de mais insatisfação, o que pode culminar em guerras, conflitos e insegurança generalizadas para todos os cidadãos brasileiros.

Ao analisarmos a situação fiscal do Estado brasileiro, percebemos que os desequilíbrios orçamentários sempre foram frequentes, inicialmente o governo se utilizava da inflação como instrumento de financiamento, o desequilíbrio nos preços aumentava os recursos que eram utilizados para financiar os gastos públicos, a partir de 1994, com o Plano Real e posterior queda da inflação, o governo passa a utilizar o aumento de impostos para financiar os desajustes do orçamento, no período 1995 a 2016 a carga tributária saltou de 24% do PIB para 34%, um incremento de dez pontos percentuais, atualmente, percebemos que a população não quer mais incremento tributário, com isso o Estado está buscando se financiar via venda de títulos públicos, esta política se encontra próximo do esgotamento, isto porque os agentes econômicos estão reticentes com relação a capacidade de pagamento do Estado, tudo isto leva o governo a buscar com urgência uma reforma fiscal verdadeira que abra novas possibilidades para o setor público, sem uma reforma consistente o Estado terá grandes dificuldades de financiamento, sendo obrigado a pagar taxas de juros cada vez maiores, o que inviabiliza o país no médio e longo prazo.

Num país como o Brasil, com as graves desigualdades que temos, numa sociedade que se diz civilizada, onde uma parcela substancial de seus cidadãos vivem em condições sociais bastante precárias e um pequeno grupo, menos de 1% da população, se compraz com altos salários e belas remunerações, muitas delas vindas do setor público, donos de aposentadorias milionárias e benefícios generosos que levam o Estado a condições de sangria constantes para financiar seus benesses mais íntimos, designar esta sociedade de civilizada é algo bastante equivocado e reducionista.

Precisamos rever estes benefícios exagerados que são concedidos a poucos funcionários e custam muito caro ao Estado, comprometendo sua capacidade fiscal e financeira e deixando o país próximo daqueles que, num futuro próximo, estarão condenados a uma situação de incerteza generalizada, de um lado um pequeno grupo formado por grandes salários e benefícios e de outro uma grande maioria que sobrevive com migalhas e indignidade.

Devemos destacar ainda, que muitos subsídios concedidos aos grupos financeiros e empresariais contribuem imensamente para que a situação fiscal do Estado se fragiliza mais rapidamente, políticas protecionistas de cotas, taxas e sobretaxas que inibem a concorrência e condenam o trabalhador brasileiro a ter que comprar produtos caros e ineficientes e a pagar preços extorsivos, gerando um círculo vicioso que perpetua a pobreza e a exploração dos cidadãos.

Muitas vezes ouvimos reclamações dos cidadãos sobre a classe política, seus privilégios e benefícios generalizados, seus grandes salários e vantagens adicionais, isto gera grande revolta nas pessoas, devemos deixar claro que o poder legislativo é o mais transparente para a população, basta buscarmos nos sites e nos jornais encontramos informações atualizadas deste poder, por mais que tenham grandes benefícios devemos destacar que cabe a todos nós cobrar de todos os nossos representantes atitudes políticas corretas e dignas para a adoção de uma postura ilibada e distantes de roubalheiras e conchavos políticos.

O Poder Judiciário é dono de uma aura que atrai os indivíduos, marcado pela pompa e pelos privilégios generalizados, mas cabe a todos perguntarmos, para que este poder presta contas na sociedade brasileira ou será que presta contas para alguém? Esta pergunta deve ser feita por todos que pensam o país e sonhem para que o nosso Brasil se transforme em um país desenvolvido, não apenas economicamente, mas desenvolvido e justo socialmente e não uma ilha onde um pequeno grupo vive cheio de privilégios generalizados e uma grande parte se afunda na pobreza, na indignidade e nas indiferenças dos governantes e das elites políticas e empresariais.

Se tivermos a oportunidade de entrar nos sites dos tribunais de justiça dos estados brasileiros, vamos nos deparar com uma situação de escárnio com a população, encontramos desembargadores ganhando salários de mais de quinhentos mil reais ao mês, isso mesmo, mais de quinhentos mil reais ao mês, enquanto de outro lado temos favelas crescendo em escala exponencial, violência generalizada, filas crescentes nos hospitais e educação de péssima qualidade, um paradoxo que só desnuda a incapacidade que temos de construir uma nação verdadeira.

Estamos próximos de uma eleição e convivemos com o governo fraco e com pouca legitimidade, um presidente que dificilmente seria eleito na próxima eleição a um cargo de vereador em uma cidade brasileira, um presidente que foi denunciado por corrupção pela Procuradoria Geral e só não foi retirado do cargo porque se utilizou de sua capacidade de atuar nos bastidores para se segurar na presidência mas, a que custo Michel Temer conseguiu se segurar no cargo de Presidente da República?

Embora tenhamos severas críticas a estrutura política e aos representantes eleitos na última eleição, acredito que cabe a sociedade fazer uma grande reflexão, isso porque a grande maioria da sociedade se estivesse em cargos eletivos utilizá-los-ia da mesma forma ou de forma parecida, usá-los ia para manter ou aumentar os seus benesses com os recursos da sociedade e pouco se importaria com o eleitor, acreditando na velha tese de que o eleitor esquece e na próxima eleição seria reconduzido ao posto com até mais votos e mais legitimidade eleitoral.

Vivemos em uma sociedade caracterizada pela concorrência e pela competição generalizadas, o estudo, o conhecimento e a informação são as molas para o século XXI, sem estes recursos e investimentos na estrutura social estamos condenados ao atraso e a indignidade, não estamos preparados para este novo momento histórico da sociedade capitalista mundial, precisamos eleger as principais bandeiras para este novo século e, de todas as bandeiras, a mais sólida e consistente é a bandeira da educação que deve se transformar em um mantra nacional, só ela pode resgatar a dignidade do povo brasileira e fazer com que consigamos construir uma sociedade onde a dívida social seja reduzida e a pobreza extrema seja dizimada por completo.

A atual crise nos leva a grandes reflexões, o brasileiro está desesperançado com o país, não acreditamos na política, nos partidos políticos e principalmente, não acreditamos nos políticos e homens públicos, esta história não é nova e sabemos o final, embora saibamos que a política no Brasil apresenta graves desajustes e desequilíbrios, precisamos compreender que a Política é uma ciência fundamental para que consigamos sair desta situação e construir novos espaços de esperança e de dignidade para este povo, demonizar a Política só serve para aqueles que se locupletam com a situação que vivenciamos na atualidade e nos condenemos a um futuro de desigualdade, de medo e de incertezas.

Recentemente o país mergulhou no caos completo, a greve dos caminhoneiros deixou claro a dependência do país ao transporte rodoviário, nenhum país com dimensões continentais apresenta tanta dependência deste setor como o Brasil, quando estes resolvem parar o caos é generalizado e o custo destes impropérios são sentidos por todos os grupos mas, os grandes perdedores, são os mais pobres, os trabalhadores mais humildes e desprovidos de recursos, estes sim são os mais atingidos e sentem na pele o desabastecimento e os aumentos generalizados que se espalham por toda a cadeia produtiva da economia brasileira.

A greve é um instrumento legítimo para todas as categorias, mas da forma como foi feita gerou graves constrangimentos para a economia, uma economia que começava muito lentamente sua recuperação que foi abortadas trazendo custos para todos os indivíduos, de uma perspectiva de crescimento de 3% no começo do ano, a nova perspectiva para o produto interno bruto não passa de 2%, alguns economistas e analistas acreditam em um número menor que este, recuperação mais lenta, menos investimentos, menos empregos, menos renda, menos produção, menos consumo e menos frete, ou seja, prejuízo para todos os trabalhadores.

Grupos que apoiaram a greve num primeiro momento, perceberam que os custos da paralisação deverá ser pago por alguém, e este alguém será ele mesmo, com as propostas atendidas pelo governo com custos estimados em mais de R$ 13,5 bilhões os exportadores já sentiram na pele os custos das concessões, além de cortes generalizados em políticas públicas de saúde e educação, ao menos aí a greve teve um impacto interessante, mostrou para a sociedade que não existe almoço grátis, como diria o economista norte americano, prêmio Nobel de Economia e um dos grandes baluartes do pensamento liberal contemporâneo.

A crise na sociedade brasileira é generalizada, do lado político não vislumbramos pessoas capacitadas para recuperar a economia do país, melhorar a auto estima do brasileiro, estamos próximos da Copa do Mundo da FIFA, um dos eventos esportivos mais celebrados no mundo e os brasileiros se encontram alheios ao evento, muito disso se explica pela situação de descrença com o país, a roubalheira generalizada que se descobriu nas federações internacional e brasileira, gatunagem esta que levou alguns dos presidentes da confederação brasileira de futebol a cadeia ou ao ostracismo, melhorar e recuperar este país nos parece uma situação difícil e bastante trabalhosa, por isso, fujamos dos demagogos, dos autoritários e dos populistas da política brasileira, fujamos daqueles que se dizem donos de ideias e pensamentos mirabolantes, fujam daqueles que divulgam melhorias imediatas e rápidas, será que se fizermos isso teremos em quem votar?

 

“Da favela para o mundo: Não importa de onde você vem, mas para onde você vai”.

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Uma obra interessante que conta a trajetória de Edu Lyra, um jovem empreendedor nascido nas favelas paulistanas que se tornou um dos jovens mais admirados no Brasil, leitura fácil e empolgante, vale a pena este investimento.

 

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“É legítimo o cidadão apoiar a greve. Mas deve saber que é ele quem vai pagar essa conta” – Gustavo Franco, Ex-presidente do Banco Central

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Revista Isto É Dinheiro – Machado da Costa – 31/05/2018

O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco é um dos economistas mais influentes do Brasil. Ele foi um dos membros da equipe econômica responsável pela criação do Plano Real. Por outro lado, muitos o criticam pela crise cambial vivida pelo País na década de 1990, ao tentar, por tempo demasiado, manter a paridade entre o real e o dólar. O cargo no Banco Central se foi, mas o prestígio não. Agora, Franco encabeça a equipe econômica de João Amoêdo, pré-candidato à presidência pelo partido Novo. E uma crise, como a dos caminhoneiros, que parou o Brasil por mais de uma semana, é uma terra fértil para esse economista plantar a semente do liberalismo. Segundo ele, todas as dificuldades vividas pelo País desde que Michel Temer assumiu o Planalto, em maio de 2016, têm uma única origem: a reeleição de Dilma Rousseff, em 2014. “Temos que lembrar que, até o fim deste ano, o que estamos vivendo é o mandato da Dilma. É o seu vice que está lá. É o seu Congresso que lá está”, afirma. A revolta dos caminhoneiros, para ele, é apenas um dos barris de pólvora que estão prontos para explodir. E a solução é a abertura do mercado. “Por que não discutir a privatização da Petrobras?”, questiona o economista, que defende a política de preços praticada por Pedro Parente, presidente da estatal. Leia a seguir a entrevista que Franco deu à DINHEIRO.

DINHEIRO – Por que o governo está sofrendo tanto com a rejeição da população?

GUSTAVO FRANCO – Nós estamos em um fim de governo muito difícil, por todos os déficits de popularidade e de legitimidade. Sua eficácia cai com o tempo e, a cada problema, a capacidade de resolver é menor. Esse assunto dos caminhoneiros não era para ter tido essa dimensão. A ineficácia junta-se à impopularidade, que nos faz lembrar muito de algo que aconteceu em 2013, as jornadas de junho.

DINHEIRO – O Datafolha mostra que 87% da população apoia a greve, mas que não querem pagar a conta. O que isso significa?

FRANCO – É legítimo o cidadão apoiar a greve. Mas deve saber que é ele quem vai pagar a conta desse arranjo que vai beneficiar os caminhoneiros. Todo mundo gosta de pensar que pode ter um almoço grátis. Mas isso não existe. Quem vai pagar os prejuízos causados a terceiros, causados pelo protesto? Quantos litros de leite foram desperdiçados e quantas aves morreram sem ração? Os prejuízos são imensos. Quem se responsabilizará por isso?

DINHEIRO – Com certeza não serão os grevistas…

FRANCO – Esse é um protesto amplo, com alguns elementos sindicais e outros patronais. Com esse tipo de movimento, espontâneo, não há característica negocial. Havia gente pedindo a cabeça de presidente da Petrobras, Pedro Parente, outros a intervenção militar. Em muitos momentos, o protesto perdeu relação com a realidade. Muitos pedidos não tinham cabimento. Infelizmente, o que deveria ter sido feito, era ter prevenido o protesto.

DINHEIRO – Era possível?

FRANCO – Isso tudo começou com um choque de petróleo. Quem se lembrar dos anos 1970, recorda que aconteceram coisas traumáticas. Aquele choque produziu recessão, inflação, problemas no balanço de pagamentos. Agora, não há nada parecido com isso. Existe apenas a irritação de quem foi afetado por uma mudança inevitável no custo do petróleo. Tivemos muitas experiências com a Petrobras que comprovam que o preço doméstico tem de ficar alinhado com os preços internacionais. Não podemos viver fora da realidade da vida econômica. A fórmula de preços a Petrobras está correta filosoficamente. Dá para se discutir se o repasse deve ser diário ou não. Vejo vários especialistas falando sobre a criação de um tributo regulatório, que desce quando o preço está alto e sobe quando está baixo. Isso serviria para suavizar preços mais sensíveis à população, não só o diesel ou a gasolina, mas o gás também. Uma lástima que isso não tenha sido feito antes deste barril de pólvora explodir. Agora, vai ter de ser feito às pressas.

DINHEIRO – A mudança de política de preços feita pela Petrobras está correta, então?

FRANCO – Esse era o caminho. Vivíamos em uma situação absurda de populismo tarifário extremo. Uma política que quase quebrou a Petrobras. É de responsabilidade de Dilma Rousseff a produção de um endividamento escandaloso da companhia. Sair dessa política era inevitável. E caminhamos para o que é muito próximo do correto. Particularmente, não simpatizo com o reajuste diário dos derivados. Outros mecanismos deveriam existir para suavizar as variações. Também devemos discutir o monopólio. Estamos descobrindo que temos dois problemas muito sérios no fornecimento do diesel. O primeiro que a Petrobras estabelece um monopólio e o segundo é que ela é estatal.

DINHEIRO – Isso é um único problema ou são dois?

FRANCO – Bem… se não fosse estatal, o monopólio poderia ser pior. Quando tínhamos monopólio nas telecomunicações, a solução foi quebrar e transformar em várias empresas, para gerar competitividade em várias etapas do serviço. O propósito era beneficiar o consumidor. Na Petrobras, quando se pensa no consumidor, o governo vai para o populismo. O que talvez tenha faltado, no pensamento dessa política, foi envolver mais o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), a ANP (Agência Nacional do Petróleo), para que houvesse uma moderação na prática monopolista que a empresa se acostumou a ter. O próprio Cade publicou um documento com recomendações para aumentar a competição neste mercado. São várias propostas de bom senso de gente que entende de concorrência. No limite, uma das propostas é o autosserviço. Estamos pagando frentistas que não precisam existir. Todos pagamos por um interesse corporativista.

DINHEIRO – Isso resolveria a questão do monopólio. Mas o senhor disse que o fato dela ser estatal também é um problema.

FRANCO – Esse episódio e, antes dele, o Petrolão, serviram para tirar a Petrobras de um terreno do sagrado. Falar da privatização era um sacrilégio. Esses problemas a trouxeram para o terreno das empresas comuns. Ela é um monopólio e monopólios não são bons, sejam estatais ou privados. Quem sabe, faça sentido dividir. Mas, para que tenha competição, seria interessante privatizar um pedaço ou outro. Essa discussão agora começou e vamos demorar um tempo debruçado sobre o assunto para chegar a uma solução.

DINHEIRO – Acredita que esse tema será discutido no processo eleitoral?

FRANCO – Pode ser um tema prematuro para a eleição. As ideias ainda não estão muito disseminadas. Mas é papel dos economistas dos partidos falar sobre coisas que ainda estão verdes na cabeça dos eleitores. Não se paga nada para pensar e imaginar como poderia ser diferente. Nesse processo, é preciso levar uma consideração importante ao consumidor. A soberania nacional, a economia de divisas, a autossuficiência – tudo isso mudou no decorrer do tempo. Esse ideal de autossuficiência foi muito relativizado.

DINHEIRO – Entre as reivindicações, havia pedidos de intervenção militar. E regimes rígidos, por definição, são intervencionistas. Será que essa pauta cabe neste momento?

FRANCO – Eu vi essas manifestações, mas elas são pontuais, minoritárias, e o radicalismo existe para os dois lados. Cada um tem a liberdade de expressar sua irritação e, às vezes, ela se manifesta desse jeito. É uma forma de mostrar a insatisfação com a situação atual. O que isso mostra é somente a cabeça feita dos extremos. Três quartos do País não têm ainda uma opinião formada sobre os candidatos. O resto do país tem mais serenidade, equilíbrio, e não decidiu ainda. De algum jeito, é o centro moderado que vai decidir a eleição e torço para que escolhamos certo.

DINHEIRO – O PIB apontou um crescimento de 0,4% no primeiro trimestre, o que mostra que a recuperação ainda é lenta. O PIB baixo impulsiona esse extremismo?

FRANCO – A recuperação é lenta, mas foi o que deu para fazer nesse ambiente político muito difícil, de ausência de liderança política e incerteza eleitoral. Acho que a economia, personificada na dona de casa, está prendendo a respiração, esperando passar esse momento. A vida vai começar para valer em 2019, com uma liderança que traga algum alento econômico. Temos que lembrar que, até o fim deste ano, o que estamos vivendo é o mandato da Dilma. É o seu vice que está lá. É o seu Congresso que lá está. Foram eleitos baseados em uma aliança entre PT e PMDB. O impeachment deu um cavalo de pau na economia, mas é o mandato da Dilma que estamos terminando. Não daria para ser diferente. Já deixamos para trás parte do péssimo legado dela, mas temos que terminar esse mandato.

DINHEIRO – O senhor está chefiando o plano econômico de João Amoêdo, pré-candidato do Partido Novo. Como prevê a participação dele na corrida ao Planalto?

FRANCO – Barulho, te-nha a certeza de que vamos fazer. Nós somos um partido jovem. É apenas a nossa segunda eleição e a primeira nacional. E achamos que podemos formar uma bancada. Não sabemos qual vai ser o tamanho. Mas, hoje, a bancada de deputados liberais é próxima de zero. Quem sabe, na próxima legislatura, poderá ter mais de 10, seja do Novo ou de outras legendas com essa mesma mentalidade. Isso vai fazer uma diferença importante no Parlamento. Lá, prevalece uma rotina modorrenta corporativista. Tivemos a experiência de eleger quatro vereadores, em quatro capitais. Sabemos a encrenca que essa voz do liberalismo pode gerar. Imagine se conseguirmos eleger 30 deputados. Isso seria magnífico. Os partidos do Centrão não têm nitidez ideológica, então a representação do Novo teria uma visibilidade desproporcional ao seu número.

 

‘Quem pede intervenção militar não sabe o que foi a ditadura’, diz sociólogo

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Ana Estela de Sousa Pinto – Folha de São Paulo – 04/06/2018

SÃO PAULO

“Há uns malucos querendo a ditadura. Eles não sabem o que querem. Nunca viram, não têm ideia do que foi a intervenção militar no país, porque não têm formação. Não sabem isso e também não sabem mais nada.”

Para o sociólogo Reginaldo Prandi, 72, esse é um dos reflexos do principal problema do país hoje, a frágil cidadania.

Outra consequência é a politização mal definida. “Até no PT, que já teve consistência ideológica, quando o Lula vai preso ninguém sabe o que fazer. Ainda estamos na era do culto à personalidade.”

Religião, trabalho e educação foram temas estudados por Prandi nos últimos 50 anos. O domínio em metodologia de pesquisa o levou a participar, no começo dos anos 1980, da criação do Datafolha, empreitada que atraiu críticas desde o início: de candidatos, institutos concorrentes e colegas marxistas.

Decidido a responder a elas com embasamento teórico, Prandi passou meses estudando a formação da opinião pública nos EUA. Numa época pré-informática, encheu as malas com cópias xerox dos textos que embasariam sua tese. A bagagem, no entanto, se perdeu na volta ao Brasil.

Docente da Universidade de São Paulo desde 1976, o sociólogo será nesta terça-feira (5) o 12º de seu departamento a se tornar professor emérito, homenagem já feita a Fernando de Azevedo, Florestan Fernandes, Azis Simão, Fernando Henrique Cardoso e Chico de Oliveira, entre outros.

 

O que seus predecessores indicam sobre as questões que têm ocupado os sociólogos?

O primeiro homenageado, Fernando de Azevedo, era envolvido com a transformação da sociedade a partir da educação. Já os seis seguintes estudaram a questão racial. Todos passaram por como a escravidão contribuiu na formação nacional economicamente, populacionalmente e culturalmente.

Depois, sob uma ótica marxista, aparecem estudos sobre o operariado e a classe empresarial.

Dentre os eméritos, o Azis Simão é muito especial. Formou-se em 1930 em farmácia, porque queria ser professor de ciência. Mas teve um descolamento de retina, que lhe tirou a visão.

Formado em farmácia e cego, como virou professor da USP?

Azis era amigo de Mário e Oswald de Andrade e da intelectualidade socialista e anarquista. Frequentava palestras de professores estrangeiros, promovidas pela Faculdade de Filosofia e foi incentivado a se matricular por Fernando de Azevedo.

Ele já não enxergava mais, mas sua irmã o ajudava lendo os livros em voz alta, e ele fez cursos de braile.

Quando se formou, Azevedo o convidou para assistente. Passou em todas as provas, mas seria barrado no exame médico, e foi preciso passar uma lei na Assembleia Legislativa para que ele pudesse ser efetivado.

Como professor e militante, ele fez o primeiro trabalho sobre o voto operário no Brasil.

A gente chama o Azis de “precursor do Datafolha”, porque, mesmo cego, trabalhava com tabelas e números.

São dois pontos em comum com o sr.: formação em biológicas e ligação com pesquisas eleitorais.

Há um terceiro. Assim que me formei, veio a cassação dos professores, e alguns fundaram o Cebrap [Centro Brasileiro de Análise e Planejamento], onde trabalhei de 1971 a 1976, enquanto fazia pós-graduação na USP. Em 1976, também entrei para o corpo docente da USP, mas meu contrato foi barrado.

Não no exame médico!?

Não. Pelo terceiro estágio, uma instituição ligada ao SNI [Serviço Nacional de Informações] que examinava toda contratação. Dependendo do que achavam, o processo nunca chegava à mão do reitor.

Passava um ano, dois, três, até que a pessoa desistia.

Trabalhei mais de um ano de graça, e começaram a falar “Ah, você caiu no terceiro terceiro estágio, pode desistir”. O Azis, que era coordenador da sociologia e muito destemido, resolveu verificar pessoalmente, e o contrato saiu.

Como surgiu sua ligação com pesquisas eleitorais?

Fui trabalhar com o professor Oracy Nogueira, nas matérias de metodologia de pesquisa. Tinha boa formação em estatística e computação, que nessa época estava apenas engatinhando.

Do estudo de veterinária?

Na veterinária, tive um professor maravilhoso, o Pimentel, que sabia tudo sobre modelos experimentais e desenho de amostragem. Na USP, estudei dinâmica populacional e fui orientado por grandes metodólogos.

Aí veio a redemocratização, fundaram-se novos partidos, e fui para o PT. Lula era candidato a governador em 1982, e o PT não tinha nem um tostão para contratar pesquisa eleitoral, e não confiava nas que havia. Bolei um modelo de amostragem que pudesse ser mais fácil, mais rápido e mais barato.

Por que não deu certo no PT?

Quando a gente mostrava os resultados, ninguém acreditava: “Como vamos ficar em quarto lugar? Impossível. Em toda parte a que a gente vai falam que vão votar no Lula!” [O PT terminou mesmo em 4º lugar, com 11% dos votos].

Acharam melhor gastar forças em conquistar votos em vez de levantar intenções, e deram por encerrado.

O seu Frias [Octavio Frias de Oliveira (1912-2007), publisher da Folha] ficou sabendo dessa história e me chamou [leia texto abaixo]. Houve oposição dentro da universidade.

Qual era a crítica?

Que a gente influenciava a opinião pública. Colegas ligados ao departamento de filosofia eram contra a própria ideia de pesquisa, que “reduziria a classe social à massa”.

Passei a achar que tinha obrigação de dar respostas teóricas à altura, e resolvi fazer minha tese de livre docência sobre a formação da opinião pública.

Fui fazer um pós-doc nos EUA, levantei muita informação. Naquela época não tinha internet, tudo era preciso xerocar. A gente ia para Paris só para tirar xerox. E nos EUA não era só deixar o livro e vir buscar depois: você mesmo punha as moedas e tirava as cópias, folha por folha.

Vim embora pronto para fazer minha tese. Mas minha bagagem foi perdida pela Varig. As malas, com toda a pesquisa dentro, não chegaram.

Perdeu toda a pesquisa?

Eu tinha duas saídas: mudar de assunto ou fazer tudo de novo. Meus professores me aconselharam a retomar o tema do mestrado, e resolvi estudar os candomblés de São Paulo. Consegui financiamento, contratei gente. Quando estava tudo pronto chegaram as malas [risos].

Uns seis, sete meses depois.

Tinham sido achadas num depósito de malas perdidas no aeroporto de Tóquio. Nessa altura já havia escolas de marketing e comunicação, que passaram a tratar desse assunto.

E a própria pesquisa eleitoral foi se legitimando sozinha, independentemente do que achavam alguns colegas meus.

Mas há ainda tentativas de desqualificá-la, e na reforma política tentaram proibir a publicação na véspera do voto..

Isso desde sempre. A pesquisa é sempre usada politicamente. Há muita gente que se opõe, mas nunca é por razões científicas, e hoje ninguém mais passa sem elas.

Houve um ano em que foi proibido publicar uma semana antes. A Folha soltava notas na coluna Painel dizendo “A temperatura em São Paulo está mais para Mário Covas. Vai chegar a 34 graus nesta tarde” [risos].

Sempre houve em algum lugar da sociedade ou do governo ou do parlamento alguém interessado em castrar esse tipo de informação. O monopólio da informação sempre foi desejo de empresários, políticos, líderes e dirigentes.

Que questões são fundamentais hoje para a sociologia no Brasil?

Temos um problema muito sério, um velho problema. O Brasil evoluiu muito em termos tecnológicos em vários campos, mas falta muito ainda na formação humana.

Somos muito atrasados em questões de cidadania, de tolerância, de aceitação das diferenças. Nossa escola formadora é muito ruim.

Não há investimento, nenhuma preocupação em formação de gente.

Há uns malucos querendo a ditadura. Eles não sabem o que querem. Nunca viram, não têm ideia do que foi a intervenção militar no país, porque não tem formação. Não sabem isso e também não sabem mais nada.

A falta de formação é o maior problema do Brasil. Não há respeito às tradições e, muito pior, nem às pessoas.

Não há nem sequer uma formação ideológica consistente. As pessoas chutam para um lado hoje e amanhã chutam para o outro, como se fosse absolutamente normal.

Esses movimentos de rua, nada garante que amanhã eles não sejam completamente diferentes, sem consistência, sem continuidade, sem fundamentação ideológica ou científica.

Somos um país que lê pouquíssimo. Nossa cidadania é muito frágil.

Falta politização?

Exatamente por isso: a frágil cidadania leva a uma politização também fragilizada, mal definida, inconsistente. Até no PT, que já foi um partido com consistência ideológica maior, quando o Lula vai preso ninguém sabe o que fazer, porque o PT não existe sem o Lula.

Isso mostra que ainda estamos na era do culto à personalidade. Se você não tem um personagem para assumir uma liderança e resolver todos os problemas do país, ninguém sabe o que fazer.

Enxerga algum foco de mudança?

Sempre sou otimista, porque, quando você menos espera, há um avanço social. Um exemplo claro nesses dias é a Irlanda, que aprovou o aborto. Quando ninguém acreditava, aprovaram o divórcio, depois o casamento gay e agora o aborto.

Existe movimento.

Mas ele vem com muitos custos, é muito atrasado.

Há um problema sério de reconhecimento dos direitos da mulher, dos direitos dos negros. O fato de um negro ganhar a metade do que ganha um branco na mesma atividade e mesmo período é muito, muito sério no país.

Mas, apesar de tudo, sempre há forças sociais que vão para a frente.

O que vai para a frente no caso do Brasil?

Veja, tudo isso surgiu no curso da minha vida, o movimento feminista, o movimento negro. Quando entrei no Cebrap, não existia nem movimento social ainda, e isso faz menos de 50 anos.

Apesar de tudo, isso se constituiu e ganhou força.

É possível.

Plagiando Galileu Galilei e depois o Chico de Oliveira, “Eppur si muove” [“no entanto, se move”, frase que Galileu teria murmurado depois de negar diante da Inquisição sua convicção de que a Terra gira em torno do Sol].

Claro que Galileu pensava nos astros, e Chico, na sociedade e na economia, mas eles têm razão. Elas se movem. Mas como? E com que velocidade?

NO FIM DA DITADURA, SOCIÓLOGO AJUDOU A CRIAR O DATAFOLHA

Em 1982, ainda sob o governo militar no país, houve eleição direta para governadores. O PT, do qual Prandi fazia parte, não tinha dinheiro para pesquisas eleitorais. Especialista em desenho de amostras, o sociólogo esboçou um método mais barato para levantar a preferência dos eleitores: ouvi-los em pontos de fluxo, em vez de em suas residências.

A nova metodologia interessou o publisher da Folha, Octavio Frias de Oliveira, que nos anos 1970 já testara enquetes para levantar a opinião do público. Prandi foi apresentado ao empresário por um amigo em comum, o sociólogo Vilmar Faria.

Ele relata a conversa: “Seu Frias me chamou: ‘Vamos fazer aqui na Folha, Prandi! Você tem todo o meu apoio!’. Perguntei ‘Tenho carta branca para gastar dinheiro também?’. ‘Não, isso não! Só estou te convidando porque o Vilmar me disse que seu método é muito mais barato.’ [risos]”

RAIO X

Reginaldo Prandi, 72
Formado em sociologia na Fundação Santo André, fez mestrado e doutorado na FFLCH-USP, onde se tornou livre-docente. Aposentado em 2005, continua no departamento como orientador de pós-graduação. É autor de 37 livros, entre obras científicas, ficção policial e literatura infantojuvenil

O QUE LER

Mitologia dos Orixás
Companhia das Letras, 2001, 24ª reimpressão, 591 pgs.
A coleção de mitos iorubás, que começou como subproduto de sua pesquisa sobre candomblés em SP, é o livro mais vendido do sociólogo

Minha Querida Assombração
Companhia das Letrinhas, 2003, 23ª reimpressão, 138 pgs.
Em segundo lugar entre seus sucessos está o livro infantojuvenil em que o sociólogo reconta histórias de suspense que ouvia na infância em Potirendaba (SP)

 

Herdeiros da Imortalidade

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O livro Herdeiros da Imortalidade pode ser descrito como uma leitura de destaque com informações importantes que nos leva a uma intensa reflexão, nos auxiliando a compreender melhor as dificuldades e as oportunidades que a vida nos oferece todos os momentos.

 

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