O sono nas reuniões espíritas

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Todos nós sabemos da necessidade do sono para o refazimento do nosso organismo físico. No entanto, é preciso que se atente para o fato de que nem sempre nos é adequado fazer uso dessa bênção para nos restabelecer o equilíbrio, havendo mesmo ocasiões em que ele pode até se tornar fatal para nossas vidas.

Há momentos em que não se pode admitir que alguém possa estar dormindo como, por exemplo, na hora do trabalho remunerado, que pode lhe custar até mesmo a demissão por justa causa; ou quando estiver com a responsabilidade de cuidar de uma criança; ou ainda no trânsito ao volante de um veículo nas rodovias brasileiras. Imagine um médico dormindo ou mesmo cochilando, durante uma cirurgia delicada, etc. etc. Assim, podemos afirmar que “o sono exercido à hora em que se solicita a vigília, pode tornar-se inimigo cruel e implacável”.

Alan Kardec nos esclarece a respeito da utilidade do sono conforme segue:

 

À hora de dormir

“O sono tem por fim dar repouso ao corpo; o Espírito, porém, não precisa de repousar. Enquanto os sentidos físicos se acham entorpecidos, a alma se desprende, em parte, da matéria e entra no gozo das faculdades do Espírito. O sono foi dado ao homem para reparação das forças orgânicas e também para a das forças morais. Enquanto o corpo recupera os elementos que perdeu por efeito da atividade da vigília, o Espírito vai retemperar-se entre os outros Espíritos. Haure, no que vê, no que ouve e nos conselhos que lhe dão, ideias que, ao despertar, lhe surgem em estado de intuição. É a volta temporária do exilado à sua verdadeira pátria. É o prisioneiro restituído por momentos à liberdade.

Mas, como se dá com o presidiário perverso, acontece que nem sempre o Espírito aproveita dessa hora de liberdade para seu adiantamento. Se conserva instintos maus, em vez de procurar a companhia de Espíritos bons, busca a de seus iguais e vai visitar os lugares onde possa dar livre curso aos seus pendores.

Eleve, pois, aquele que se ache compenetrado desta verdade, o seu pensamento a Deus, quando sinta aproximar-se o sono, e peça o conselho dos bons Espíritos e de todos cuja memória lhe seja cara, a fim de que venham juntar-se-lhe, nos curtos instantes de liberdade que lhe são concedidos, e, ao despertar, sentir-se-á mais forte contra o mal, mais corajoso diante da adversidade.” ¹

Nas reuniões espíritas, sejam nas palestras, nos grupos de estudos, nas reuniões mediúnicas, ou outra qualquer, não se pode admitir que o trabalhador espírita dê menos importância aos labores da Seara do Mestre de Nazaré, que, nos afazeres normais do seu dia a dia, visto que, em sendo ele admitido para essas tarefas na seara da mediunidade, acredita-se que esteja consciente de sua responsabilidade nas referidas atividades da Casa Espírita que frequenta.

Temos visto muitos companheiros, alistados nas tarefas das cassas espíritas, que são protagonistas de situações realmente desagradáveis, por se entregarem ao sono nas reuniões doutrinárias, que normalmente já chegam atrasados com a intenção única de dar passes no final das palestras, para que sejam observados por todos como tarefeiros passistas de suas instituições. Quando se veem chamados a dar algumas explicações sobre o sono que lhes domina, saem com as maiores e mais absurdas desculpas tais como:

1- Estou sendo utilizado pelos Espíritos para ceder fluidos para ajuda ao orador;

2- Estou trabalhando em parcial desdobramento;

3- Alguns chegam a afirmar, que aprendem muito mais desdobrados que em vigília, etc.

Claro que esse desculpismo, infundado e sem lógica doutrinária, é natural naqueles que se julgam mais sabidos que os outros, mas, que na verdade em nada condiz com alguém que conhece os preceitos de uma Doutrina clara e lógica como a nossa. Sabemos que o cansaço físico de um dia atribulado no trabalho profissional, aliado à falta de motivação e a monotonia de determinados oradores, muito pode contribuir para a sonolência de quem já tem o mau hábito de dormir nas atividades espirituais da Casa Espírita.

Mas, esses fatores predisponentes aqui citados, não representam a verdadeira causa do adormecimento nesse tipo de reunião, que, na sua grande maioria, se processa pela interferência de mentes viciosas do mundo espiritual inferior, que operam magneticamente à distância, com a finalidade de não permitirem que o indivíduo adormecido se beneficie do tema edificante da palestra.

“Sobre o assunto, vejamos o que diz o assistente “Aulus” para André Luiz: “(…) Os expositores da boa palavra podem ser comparados a técnicos eletricistas, desligando «tomadas mentais», através dos princípios libertadores que distribuem na esfera do pensamento.

Sorriu bem-humorado e prosseguiu:

— Em razão disso, as entidades vampirizantes operam contra eles, muitas vezes envolvendo-lhes os ouvintes em fluidos entorpecentes, conduzindo esses últimos ao sono provocado, para que se lhes adie a renovação”.2

Irmã Zélia também confirma a ação perniciosa dos desencarnados infelizes que se aproveitam da invigilância de certos tarefeiros, que, imprevidentes e despreparados para os misteres da mediunidade, se deixam envolver por essas influências negativas conforme narra a Otília Gonçalves:

“Alguns – prosseguiu – penalizada-, embora libertados momentaneamente das expressões obsedantes, penetram o recinto, com desrespeito e indiferença, entregando-se, durante o trabalho, ao sono reprochável, resultante da intoxicação mental de que são portadores ou se deixam conduzir pelos pensamentos habituais, refazendo as ligações mentais e ameaçando o serviço venerando, pela possibilidade de invasão intempestiva dos seus algozes revoltados, constrangidos, na retaguarda, e que, destarte, encontram brechas no conjunto que deve ser protegido e defendido por todos.” 3

Dessa forma, é de suma importância que nos preparemos adequadamente para exercer as atividades no labor mediúnico, em nossas Casas Espíritas, observando alguns ensinos ministrados pelos amigos espirituais dentre os quais destacamos:

a- Quando possível, fazer um pequeno relaxamento físico e mental, antes de se dirigir ao trabalho espiritual da Casa Espírita;

b- Evitar alimentação exagerada e de difícil digestão;

c- Dedicar-se com alegria e empenho às atividades espirituais, por saber que estamos representando Jesus ante o necessitado que O busca;

d- Evitar conversas negativas, como críticas, comentários sobre doenças, queixas, etc., portando-se de forma mais digna exigida para um trabalhador da Seara do Mestre de Nazaré;

e- Manter-se em sintonia elevada, orando e vibrando positivamente, contribuindo para o êxito do trabalho.

Precisamos atentar para o fato de que somos os únicos responsáveis pelas escolhas que fazemos e não podemos ficar acusando este ou aquele indivíduo ou este ou aquele motivo para nos desculpar dos nossos insucessos perante as tarefas de cunho espiritual a nós confiadas pela Espiritualidade Maior. Sobre esse assunto, observemos o que nos escreve André Luiz:

“Não acuse os Espíritos desencarnados sofredores, pelos seus fracassos na luta. Repare o ritmo da própria vida, examine a receita e a despesa, suas ações e reações, seus modos e atitudes, seus compromissos e determinações, e reconhecerá que você tem a situação que procura e colhe exatamente o que semeia”.4

Que Jesus nos guarde em sua paz, e que não sejamos nós os responsáveis pelo fracasso das atividades de intercâmbio nas tarefas a que nos candidatamos por livre e espontânea vontade.

Francisco Rebouças – Mundo Espírita

Fontes:

1) E.S.E. – Cap. XVIII, item 38.

2) Livro: Nos domínios da mediunidade , 23ª edição– Cap. 4, pag. 39.

3) Livro: Além da Morte , 9ª edição – Cap. XVI, pag. 239.

4) Livro: Agenda Cristã – Cap. 18.

 

 

“Vivemos um momento de grandes equívocos na sociedade…”

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A revista eletrônica “O Consolador”, redigida especialmente para circular na internet, ofereceu ao jornal “Mundo Espírita”, na íntegra, a entrevista concedida pelo médium e conferencista Divaldo Franco, por ocasião do primeiro aniversário da Revista. É a soma dos esforços de líderes espíritas de todo o Brasil, entre eles José Passini, Ricardo Baesso de Oliveira, Arthur Bernardes de Oliveira, Jorge Hessen, José Carlos Munhoz Pinto, Orson Peter Carrara e Astolfo O. de Oliveira Filho, todos residentes no Brasil, e as confreiras Elsa Rossi, Claudia Werdine e Kátia Fabiana Fernandes, radicadas na Europa.

A entrevista foi dividida em três blocos: temas de natureza doutrinária, questões e problemas da atualidade e assuntos pertinentes ao Movimento Espírita. Neste número, publicamos a primeira parte e, no número de agosto próximo, a parte final.

Ei-la, a seguir, na íntegra:

O Consolador – Nossos animais de estimação ficam por algum tempo numa espécie de erraticidade, no chamado mundo espiritual, ou são de imediato encaminhados a uma nova encarnação? 

O egrégio Codificador do Espiritismo informa-nos que o período em que os animais se demoram na erraticidade é breve, logo retornando à reencarnação. Nada obstante, a mediunidade vem demonstrando que ocorrem períodos mais longos, conforme encontramos narrações nas obras ditadas pelo Espírito André Luiz ao venerando médium Francisco Cândido Xavier, assim como Charles à nobre médium Yvonne do Amaral Pereira. Essas informações não colidem com a palavra do mestre de Lyon, porque o desdobramento dos estudos doutrinários estava previsto por ele, ampliando as informações contidas nas obras básicas.

Recordo-me, por exemplo, de Sultão, o cão que acompanhava o padre Germano, conforme narrado nas Memórias do Padre Germano, de Amália Domingo Soler, e da vida de Dom Bosco, que era defendido por um cão, nas diversas vezes em que atentaram contra a sua vida.

Pessoalmente, já tive diversas experiências com animais, especialmente cães desencarnados, que permanecem na erraticidade há algum tempo.

O Consolador – Para haver gravidez, independentemente do desejo dos pais e do reencarnante, existe necessidade de autorização das autoridades espirituais?

Certamente que sim, porquanto no mapa da reencarnação dos futuros pais já se encontram delineados os filhos que devem, que podem ou que queiram ter. Graças a isso, ocorrem as facilidades na concepção ou os grandes impedimentos que vêm sendo vencidos pela ciência, através dos tempos, facultando a ocorrência, sempre sob supervisão espiritual.

O Consolador – Você acha válida a proposta de Kardec pertinente à atualização periódica dos ensinamentos espíritas, tendo em vista o avanço da Ciência? Se acha válida, como devemos implementar essa medida? 

Creio que o pensamento do preclaro Codificador encontra-se firmado no seu bom senso e na percepção dos notáveis avanços que teriam a ciência e a tecnologia do futuro, conforme vem ocorrendo. Em razão disso propôs que, pelo menos uma vez em cada quarto de século, fosse realizada uma atualização dos ensinamentos espíritas. Nada obstante, também me pergunto como isso seria realizado, por exemplo, na atualidade, com tantas correntes dissonantes em nosso Movimento, pelo menos no Brasil…

O Consolador – Em sua opinião, os Espíritos desencarnados mantêm relações sexuais tal qual se verifica na crosta? 

Conforme a questão nº 200 de O Livro dos Espíritos, o Espírito é, em si mesmo, assexuado, sendo-lhe a anatomia uma contribuição para o fenômeno da procriação. Ao desencarnar, no entanto, o Espírito mantém as suas tendências, especialmente aquelas de natureza inferior às quais aferrou-se em demasia, prosseguindo com as construções mentais que lhe eram habituais. Como resultado, acreditam-se capazes de intercursos sexuais nas regiões inferiores onde se encontrem, como efeito da condensação das energias viciosas no perispírito. Frustrantes e perturbadoras, essas relações são degradantes e afligentes, porquanto são mais mentais que físicas, dando lugar a processos de loucura e de perversão…

O Consolador – Como deve posicionar-se um casal espírita diante do diagnóstico de anencefalia no filho que se encontra na fase de gestação. 

Espírita ou não, o casal que gera um filho anencéfalo e cuja anomalia é detectada ainda na vida fetal, deve amar a esse Espírito que irá reencarnar-se com a problemática a que faz jus em razão de atos praticados anteriormente e que lhe modelaram a forma atual. A vida fetal não pode ser interrompida, senão quando a gestante encontra-se ameaçada.

Diversos anencéfalos, mesmo diante dos prognósticos médicos de que não sobreviveriam ao nascimento, demoram-se despertando mais amor até o momento em que concluem o período de que necessitam para a libertação.

O Consolador – Qual deve ser, à luz do Espiritismo, a posição de uma jovem e sua família diante de uma gravidez originada de um estupro?

Embora lamentável e dolorosa a circunstância traumática da ocorrência, é dever da jovem e dos seus familiares manterem a gravidez, auxiliando o Espírito que se reencarna em situação aflitiva e angustiante. Compreende-se a dor da vítima e dos seus familiares, no entanto, não se tem o direito de matar o ser reencarnante que necessita do retorno naquela maneira, a fim de crescer para Deus. Não raro, esses seres que renascem nessa conjuntura tornam-se amorosos e profundamente agradecidos àqueles que lhe propiciaram o recomeço terrestre: a mãe e os familiares.

“A culpa, consciente ou não,  desempenha na depressão um papel de alta relevância”

O Consolador – Como sabemos, a depressão é um problema que aflige muitas pessoas nos dias atuais. Em uma obra espírita recente lemos que a depressão, em qualquer de suas variantes, é sempre consequência da posição de arrogância cultivada pelo ser na aventura de superar a si mesmo e aos semelhantes. É verdade essa informação? 

Sem dúvida, anuímos que não há enfermidades, mas enfermos, isto é: o Espírito é sempre o incurso no processo de evolução, trazendo as marcas do passado que se  manifestam como enfermidades ou processos outros degenerativos de que necessita para resgatar os comportamentos equivocados e infelizes. A culpa, consciente ou não, desempenha na depressão, entre outros fatores endógenos e exógenos, um papel de alta relevância. No entanto, centrar todas as causas na posição de arrogância do Espírito parece-me algo desproposital. Esse conceito deve ter as suas raízes na opinião dos estudiosos que afirmam tratar-se a depressão de um conflito que se deriva da necessidade de impor-se, de dominar, e, não conseguindo, o indivíduo tomba na armadilha do grave transtorno.

O Consolador – Se é verdade que o advento do mundo de regeneração está tão próximo, qual será a situação dos nossos amigos terrenos que ainda vivem tão primitivamente em tribos existentes em muitos lugares do mundo?

É verdade, sim, que o advento do mundo de regeneração está próximo, mas não imediato, e aqueles Espíritos que ainda se encontram em fase primitiva estão tendo a oportunidade de despertar para a realidade, dando continuidade ao processo evolutivo em outro planeta, caso não logrem fazê-lo aqui mesmo, qual ocorre periodicamente com as grandes migrações de um para outro sistema, conforme ensina a Doutrina. 

O Consolador – Se a Terra está em evolução, por que ainda tantos crimes hediondos acontecem, especialmente com crianças? Como explicar tantas atrocidades? 

Vivemos o momento da grande transição de mundo de provas e de expiações para mundo de regeneração, que ainda se demorará ocorrendo por algum tempo na Terra.

É natural que estejam reencarnando, neste período, Espíritos inferiores que estavam retidos em regiões punitivas desde há muito, em face da crueldade de que são portadores. Muitos deles fizeram parte das tribos bárbaras que invadiram a Europa: hunos, godos, visigodos, normandos e que, agora, estão sendo beneficiados pela oportunidade de optar pelo Bem. Permanecendo vinculados ao primarismo em que se comprazem, serão exilados para outros planetas na escala dos mundos inferiores, a fim de se depurarem, retornando oportunamente, porque “o Pai não deseja a morte do pecador mas sim a do pecado”, conforte acentuou Jesus.

As atrocidades que sucedem amiúde, especialmente com crianças – Espíritos velhos em reencarnação libertadora – são também um convite à reflexão das demais pessoas, que marcham indiferentes aos acontecimentos dolorosos em relação ao seu próximo…

Resgatando os seus graves delitos, esses Espíritos não necessitariam que outros fossem o instrumento da sua libertação, pois a Divindade possui mecanismos especiais que dispensam o concurso desses infelizes, mas se utiliza do seu estado primitivo para que se executem as propostas do progresso.

O Consolador – Como você vê a oficialização do casamento entre homossexuais e a adoção de filhos por parte deles? 

A questão é momentosa, em face das ocorrências desse gênero que não mais podem permanecer ignoradas pela sociedade. O homossexualismo sempre esteve presente no processo histórico, aceito em um período, noutro combatido, desprezado em uma ocasião e noutra ignorado, mas sempre presente… Penso que se trata de uma conquista em relação aos direitos humanos a legalização de algo que permanecia à margem, dando lugar a situações graves e embaraçosas.

Quanto à adoção de filhos, penso que, do ponto de vista psicológico, será gerado algum conflito na prole em relação à imagem do pai ou da mãe, conforme o caso, que se apresentará confusa e perturbadora. O tempo demonstrará o acerto ou o equívoco de tal comportamento.

O Consolador – Qual deve ser o posicionamento dos espíritas em relação às pesquisas com células-tronco embrionárias? 

A reencarnação, conforme nos ensina a Doutrina Espírita, tem início no momento da fecundação do óvulo, a  partir de cujo momento passa a existir vida, seja pelo processo biológico natural, seja in vitro. Qualquer tentativa de interrupção do desenvolvimento do futuro zigoto, que é o ser humano em formação, constitui um crime.

As pesquisas com as células-tronco embrionárias são de resultado ainda incerto, embora se apresentem teoricamente positivas, porquanto não está comprovado que os resultados sejam os anelados, mesmo porque existe alto risco como a geração de tumores, provável rejeição…

Em face dos bons resultados conseguidos com as células-tronco adultas, é mais válido que se prolonguem as experiências, com menores risos e excelentes resultados em doenças como a leucemia, o acidente vascular cerebral, etc.

Continuando os esforços dos pesquisadores, certamente hão de surgir alternativas tão benéficas como as que se esperam das células-tronco embrionárias.

“Nunca será demais que os  dirigentes espíritas e todos nós estejamos vigilantes”

O Consolador – O terrorismo vem causando muitos males em todos os cantos da Terra. Muitas vidas foram e continuarão sendo ceifadas em nome do fanatismo religioso. Como entender que alguém possa morrer e matar em nome de Deus? 

Infelizmente, o fanatismo de qualquer natureza responde pela predominância da natureza animal sobre a natureza espiritual do ser (questão 742 de O Livro dos Espíritos), dando lugar a atrocidades inimagináveis. Entretanto, o suicídio através de bombas e de outras formas hediondas constitui o mais degradante processo de conduta em relação à dignidade humana, porque a vida física é sublime dom concedido por Deus, que ninguém tem o direito de interromper, porque faculta o desenvolvimento intelecto-moral do Espírito.

Tal comportamento demonstra o estágio primário em que ainda se reencarnam muitos Espíritos desvairados sem possibilidade de manter o equilíbrio…

O Consolador – Qual deve ser a atitude dos dirigentes espíritas relativamente a essa enxurrada de obras mediúnicas de origem duvidosa que tem infestado o mercado de publicações espíritas nos últimos tempos? 

Vivemos um momento de grandes equívocos na sociedade, em face do tumulto que ocorre em toda parte. Nesse sentido, há uma grande busca por notoriedade, pela fama. Pessoas imprevidentes, portadoras ou não de mediunidade, são tomadas de improviso por tais inquietações e, porque entraram em contato com o Espiritismo, logo se acreditam portadoras de faculdades extraordinárias, em razão do campo fértil para a credulidade e tornam-se, de um para outro momento, psicógrafos, expositores, debatedores de relevo. Nunca será demais que os dirigentes espíritas e todos nós estejamos vigilantes, observando as recomendações da Doutrina, mantendo critérios cuidadosos, a fim de não sermos enganados nem enganarmos a ninguém. Por outro lado, Espíritos perversos, adversários do Bem, aproveitam-se do descalabro existente e inspiram pessoas invigilantes, presunçosas, falsamente humildes, mas prepotentes, tornando-as portadoras de mensagens destituídas de autenticidade, que geram confusão e dificuldades no Movimento Espírita. Alguns desses descuidados irmãos auto-elegem-se herdeiros de personalidades históricas e missionários do amor, utilizando-lhes indevidamente o nome, apropriando-se da sua herança para o exibicionismo no banquete da fatuidade, o que é realmente lamentável.

O Consolador – Como resgatar as velhas e boas sessões práticas de doutrinação de Espíritos desencarnados que tantos benefícios trouxeram a companheiros em dificuldade, na carne ou fora dela, em face da penúria de bons medianeiros com que se vêm defrontando nossos centros espíritas?                                                                    

Penso que se torna inadiável o dever de voltarmos à simplicidade e à humildade, evitando-se as complexidades que ora se apresentam em torno da mediunidade, exigindo-se estudos úteis, indiscutivelmente, mas que se prolongam por vários anos, evitando-se o treinamento edificante e salutar.

Por outro lado, um expressivo número de pessoas recusa-se a servir de instrumento aos sofredores, aspirando ao contato com os anjos e serafins, sem se recordar de que a mediunidade está a serviço da consolação e da iluminação de consciências.

No silêncio do anonimato nas instituições espíritas, sem alarde nem divulgação, devem ser instalados os grupos sinceros de devotados servidores de Jesus, a fim de trabalharem em favor da doutrinação dos irmãos em sofrimento, por cujo meio ascendemos na direção do Servidor Incessante, que é Jesus.

O Consolador – Como despertar o interesse de jovens e adolescentes para o estudo da Doutrina Espírita? 

O Espiritismo é, essencialmente, uma doutrina para jovens e adolescentes, tendo em vista o seu conteúdo iluminativo, de fácil aplicação no cotidiano e libertador de tabus e influências perniciosas. Esclarecendo a mente e confortando o sentimento, o Espiritismo fascina as mentes juvenis, convidando-as a reflexões demoradas e a comportamentos saudáveis.

Infelizmente, o exemplo dos pais no lar, nem sempre compatível com as lições ministradas pela Doutrina Espírita, constitui um grande impedimento para o estudo e a vivência dos postulados espiritistas por esses candidatos juvenis.

Tomando conhecimento da filosofia espírita e da necessidade de aplicação em todos os momentos, os jovens decepcionam-se no lar, quando verificam a diferença de comportamento dos pais, no que se refere àquilo em que dizem crer e a maneira pela qual se conduzem.

Desse modo, o exemplo no lar é de fundamental importância para o despertamento dos jovens e adolescentes para o estudo e a vivência do Espiritismo, ao mesmo tempo em que instrutores jovens e sinceros tornem-se líderes em relação aos demais membros do grupo juvenil.

 

‘Religião e política se misturam desde sempre’, afirma teólogo

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Autor iraniano-americano Reza Aslan demonstra o quanto Deus é a mais sofisticada criação humana

Ronaldo Bressane*, Especial para o Estado

08 Setembro 2018

Quando Reza Aslan respondeu a esta entrevista sobre seu novo livro, Deus – Uma História Humana (Zahar, trad. Marlene Suano), estava em plena Terra Santa. E não muito satisfeito: o parlamento de Israel havia acabado de declarar o país “a terra dos judeus” – excluindo o território, ao que parece, da presença de muçulmanos, cristãos, ateus ou representantes de outras crenças. “Israel vem se tornando cada vez mais radicalizado e menos democrático”, afirmou Aslan, um iraniano-americano de 46 anos. “Esta lei é nada menos do que uma declaração oficial de apartheid. É o prego que faltava para colocar no caixão da democracia israelense”, detonou o teólogo e sociólogo, presença constante na mídia dos EUA por conta de seu carisma e suas formulações claras e nada partidárias a respeito de qualquer religião. Autor de Zelota – A Vida e a Época de Jesus de Nazaré, em seu novo livro Aslan tece, em linguagem elegante e bem-humorada, uma complexa rede de conhecimentos para mostrar como a ideia de “alma” já era acalentada antes do Homo sapiens, e como as religiões, na realidade, foram concebidas à imagem e à semelhança do ser humano.

O teólogo e sociólogo iraniano-americano Reza Aslan Foto: Zahar

Nascido em Teerã, em uma família muçulmana, Aslan converteu-se ao cristianismo, depois ao sufismo – e hoje se assume como um panteísta: professa a fé de que Deus é todo o universo. Nesta conversa com o Aliás, o teólogo – que hoje realiza o fantástico projeto Volta ao Mundo em 80 Dias com a mulher e os três filhos, justamente para mostrar aos pequenos a diversidade religiosa da Terra –, falou sobre como religião e política se misturam desde sempre; comentou as disputas religiosas no Rio de Janeiro do bispo Crivella e do evangelizado Comando Vermelho; e afirmou que até mesmo as inteligências artificiais podem vir, um dia, a acreditar em Deus. Em tempos de fundamentalismo religioso e político, ouvir o livre-pensador Aslan é como ser ungido com um bálsamo – nem é necessário ser crente para admirar seu profundo conhecimento em religião, conforme atesta este jornalista ateu.

Por que, em pleno 2018, uma religião pretende ser monoteísta? É uma disputa mercadológica pela alma?

Esta é uma questão interessante. Talvez uma das maiores surpresas sobre a qual escrevo neste livro é sobre quão impopular o monoteísmo foi ao longo de toda a história das religiões. De fato, quando você olha os milhares de anos na história da espiritualidade humana, o conceito de deus único só esteve aí por uns 3 mil anos. A mente antiga simplesmente não conseguia abraçar a ideia de que um deus único poderia ser responsável pelo bem e pelo mal, pela escuridão e pela luz, pelo céu e pela terra. Fazia mais sentido um deus separado para cada um dos nossos diversos atributos – um deus para representar cada uma de nossas emoções. Isso não quer dizer que o conceito de deus único não tenha aparecido de tempos em tempos – no livro escrevo sobre as duas tentativas de estabelecer o monoteísmo no Egito e no Irã. Foi só como resultado da crise existencial da fé entre os antigos hebreus que a ideia de monoteísmo começou a lançar raízes na religião judaica – foi o resultado do que hoje se conhece do exílio babilônico em 586 a.C. Mesmo os cristãos primitivos – cuja vasta maioria era de romanos – também engoliam com dificuldade a ideia de deus único, e por isso eles desenvolveram a ideia de Trindade. O que mais importava não era a teologia do monoteísmo, mas suas práticas políticas. A identidade da Igreja, com seu único bispado em Roma, com a autoridade do Império Romano com seu imperador único, requeriam uma religião com um deus único. Hoje, o monoteísmo é a forma dominante da espiritualidade humana. Talvez seja por causa da história que acabei de traçar. De todo modo, é importante notar que a ideia de deus único é um conceito totalmente diverso do que aparenta ser.

Tudo bem misturar política e religião?

Se você acha que religião é uma experiência privada em que simplesmente um ser humano tem uma conexão com o divino, então não faz sentido misturar religião com política. O problema é que religião não é só isso. Religião é principalmente uma questão de identidade, muito mais do que de fé ou prática. Quando alguém diz “sou muçulmano” ou judeu ou cristão, está formulando tanto uma definição de sua fé quanto uma definição de sua identidade. Está falando sobre quem é, como vê o mundo, como compreende seu lugar nele. Em questão de indentidade, religião é profundamente entrelaçada com todos os outros aspectos da identidade de uma pessoa: cultura, etnia, raça, gênero, orientação sexual, e, claro, orientação política. Então simplesmente não faz sentido divorciar religião da política. Fazer isso não é democrático. É obvio que podem haver problemas, especialmente uma vez que religião diz muito respeito a “mandamentos”, enquanto a política (pelo menos em teoria) supõe-se ser a respeito de compromissos. Mas, se o Estado oferecer liberdade de culto, então não se pode esperar que a religião se separe da política. De todo modo, é preciso assegurar proteções para aqueles que não compartilham da religião majoritária ou que não têm nenhuma religião.

O crime organizado brasileiro é muito próximo dos cultos evangélicos, e existe uma guerra entre estes grupos e pessoas que seguem religiões afrobrasileiras tradicionais, como a umbanda e o candomblé. Estamos vendo uma guerra entre o monoteísmo e o politeísmo semelhante ao que você descrebe em seu livro na história da perseguição do faraó Akhenaton em relação a outros cultos politeístas, no Antigo Egito. Como você vê este fenômeno hoje?

O que você está vendo, não só no Brasil mas também em outros países de maioria cristã, é uma revolta contra a profunda corrupção, manipulação e politização do cristanismo ao prejudicar quem não segue a fé cristã. Nos EUA, o cristianismo se tornou uma ferramenta do partido Republicano. Tornou-se um instrumento para separar as minorias do acesso aos direitos humanos, para proibir mulheres que sofrem e crianças refugiadas de receber asilo e ajuda, para afastar os mais pobres das políticas de bem-estar e acesso à saúde universal e outros serviços para os mais necessitados, e, em lugar disso, empoderam a supremacia branca. Para muitas pessoas, incluindo cristãos, isto é uma traição de tudo o que Jesus pregou, e por isso muitos têm abandonado o cristianismo e procurado formas alternativas de espiritualidade. É exatamente o que vem acontecendo no Brasil. Não é só uma guerra entre monoteísmo e politeísmo. É uma batalha entre o establishment cristão e os que se sentiram abandonados pela igreja. É também uma tentativa de acobertar o que muitos acreditam ser uma espiritualidade mais autêntica, radicada no solo do Brasil, mais do que outras espiritualidades trazidas por estrangeiros e colonizadores.

O que você acha do ensino religioso nas escolas? Funciona? Meu caso: fui criado em uma escola adventista, depois em um colégio jesuíta, então em um colégio católico apostólico romano… e agora você está conversando com este sujeito ateu. Por que não ensinar filosofia às crianças? Ensinar creacionismo em pleno 2018 não seria algum tipo de crime?

Esse é um assunto muito espinhoso, porque ensinar religião para crianças pode facilmente se tornar um tipo de doutrinação. Mas o fato é que a cultura religiosa é incrivelmente importante em nosso mundo. Crianças precisam aprender sobre as religiões do mundo do mesmo modo como precisam aprender sobre as culturas do mundo. Não vejo como seria difícil ensinar religião sem ensinar alguma teologia em particular (mas aqui não defendo ensinar o creacionismo nas escolas, assim como não tem cabimento dar lugar a teorias do tipo “terra plana”). O problema não está nos pais ateus que não querem que seus filhos aprendam sobre religião. O problema são os pais religiosos que sentem que, se seus filhos aprenderem sobre outras religiões, podem questionar a sua própria (aliás é exatamente isso o que a maioria faz). Assim que eles aprendem mais sobre outras concepções religiosas, questionam o absolutismo sobre suas próprias ideias. Diria que é um aspecto positivo, mas entendo por que pais religiosos não o apreciem. De qualquer modo, se você quer criar um cidadão global, você precisa ensinar a suas crianças as múltiplas maneiras que as pessoas têm para pensar sobre Deus e a fé. Minha mulher e eu atualmente levamos nossos três filhos em uma viagem de 80 dias pelo mundo (80-ish.com) precisamente para fazê-los imergirem em diferentes tradições religiosas pelo planeta. Porque não queremos criar só cidadãos dos EUA: queremos criar cidadãos globais.

Acha possível um cruzamento entre o livre-pensar e a aproximação religiosa da descrição da realidade objetiva? Em outras palavras, cientistas têm alma?

Claro que sim! Rejeito completamente a noção de que ciência e religião sejam coisas incompatíveis. Ciência e religião respondem a duas questões fundamentalmente diversas. Ciência trata do “como”. Religião trata do “porquê”. Ciência e religião são duas maneiras diferentes de conhecimento. E talvez enquanto começamos a mergulhar cada vez mais fundo naquilo que verdadeiramente acreditamos ser humano, veremos ciência e religião convergirem em uma só disciplina – uma que reconheça que há mais na realidade objetiva do que aquilo que vivenciamos.

Você se define como um panteísta. É possível um cruzamento entre panteísmo e ateísmo? E qual a sua opinião sobre movimentos ateístas como Ateísmo 3.0 e Novos Ateístas?

Não sou o único que tem descrito os novos movimentos ateístas não como um tipo de ateísmo, mas como um anti-teísmo, nem sou o único que percebeu quão fluidamente o novo movimento ateísta tem se entregue ao racismo e à misoginia. É só você ir a um desses sites e blogs dos novos ateístas e ler os comentários e compreender que eles têm muito menos a ver com uma ausência de crença em Deus do que um novo conceito de fundamentalismo secular – do tipo, eu diria, que tem mais em comum com o fundamentalismo religioso do que eles admitiriam. De todo modo, se estamos falando sobre o ateísmo filosófico, claramente consigo enxergar uma profunda conexão entre panteísmo e ateísmo, na medida em que ambos rejeitam o autoritarismo das religiões estabelecidas e da supremacia dos dogmas.

Já considerou a possibilidade de que a existência da alma seja uma ficção, uma ilusão?

Talvez. Mas é um fato fundamental de que a crença na existência na alma é uma crença universal. É um fato da vida que pode ser encontrado em qualquer cultura, em qualquer parte do mundo, e através de toda a história humana. É nossa primeira crença. A pesquisa histórica tem mostrado que as crianças nascem acreditando na substância dualista – a ideia de que corpo e mente (ou alma) podem ser distintas. Na verdade, conforme conto no livro, a crença em uma alma precede a existência do homo sapiens em milhares de anos. Podemos encontrar evidências dessa crença nos neandertais e mesmo no homo erectus. Assim, talvez toda a humanidade, durante toda a história, tenha sofrido da mesma ilusão. Ou talvez exista realmente algo nessa ideia de alma que a gente devesse prestar atenção seriamente.

No livro A Era das Máquinas Espirituais, o futurista Ray Kurzweil vê os seres humanos divididos entre corpo e alma em analogia aos computadores (hardware e software), e propõe que o advento da Singularidade aconteça quando um ser humano possa fazer um upload de consciência, transferindo seu “software” para um “hardware” mais desenvolvido. Do ponto de vista da alma, como você vê esta possibilidade? Uma inteligência artificial pode evoluir para criar uma alma?

Se podemos ensinar uma inteligência artificial a mimetizar emoções humanas ao manipular um hardware neurológico, e se a fé é o produto de conexões neurológicas, então uma máquina crente não me parece uma ideia tão maluca assim. A verdade mais fundamental e simples a respeito da experiência religiosa é que resulta de reações químicas no cérebro. Em outras palavras, a religião é um fenômeno neurológico. Isso não deslegitimiza a experiência religiosa. Toda experiência é o resultado de reações quimicas cerebrais. Não existe razão para dizer que a experiência religiosa seja diferente. Agora, se você está me perguntando se algum dia poderemos recriar essas mesmas reações químicas em uma inteligência artificial para produzir a experiência religiosa, eu responderia: por que não?

*Ronaldo Bressane é escritor e jornalista, autor do romance Escalpo (Reformatório), entre outros

 

Sexo e Destino

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O livro faz parte da série A vida no mundo espiritual, de André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, onde se retrata as agruras e os emaranhamentos sexuais entre duas famílias no Rio de Janeiro do final dos anos 50, uma obra imperdível para que entendamos as consequências dos desequilíbrios sexuais e do sexo desenfreado.

 

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A ‘guerra civil’ na Igreja Católica que pode abalar pontificado do papa Francisco

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Alessandra Corrêa – De Winston-Salem (EUA) para a BBC News Brasil

Uma guerra ideológica que há anos divide a Igreja Católica deixou os corredores do Vaticano nesta semana para ser travada em público.

De um lado, estão o papa Francisco e aqueles que apoiam sua visão de uma Igreja mais liberal em relação a temas como divórcio e homossexualidade. De outro, conservadores que criticam essa tentativa de abertura e temem um enfraquecimento da religião.

O embate ganhou manchetes com a divulgação, no domingo passado, de uma carta em que o ex-núncio apostólico na capital americana, Carlo Maria Viganò, acusa Francisco de ter acobertado crimes sexuais cometidos pelo ex-arcebispo de Washington, Theodore McCarrick, e pede a renúncia do papa.

O documento de 11 páginas, publicado por sites religiosos conservadores nos Estados Unidos, não oferece provas, mas chega em um momento em que fiéis do mundo inteiro estão abalados por sucessivas revelações de abusos sexuais contra crianças cometidos durante décadas por membros do clero em vários países.

A carta foi divulgada enquanto o papa visitava a Irlanda, um dos países afetados. Francisco se reuniu com vítimas e pediu perdão por abusos cometidos por membros da Igreja, ritual repetido em outras viagens. Mas muitos católicos lamentam a falta de medidas concretas e de uma resposta rápida aos escândalos, e alguns chegaram a abandonar a Igreja.

Nesse momento de vulnerabilidade, a sugestão de que o papa seria cúmplice dos abusos pode abalar seu pontificado e expôs as divisões na alta hierarquia da Igreja Católica.

“Essas acusações se tornaram parte de um embate ideológico muito maior. Um dos lados vê Francisco como o papa que finalmente abriu a Igreja a um entendimento mais realista sobre sexualidade, casamento, homossexualidade”, disse à BBC News Brasil o professor de teologia e estudos religiosos Massimo Faggioli, da Universidade Villanova, na Pensilvânia.

“O outro lado acredita que isso significa o fim da Igreja, e está disposto a fazer qualquer coisa para impedir isso. Mesmo que seja o maior tabu, que é pressionar um papa a renunciar, o que não acontece há seis séculos”, ressalta, referindo-se à renúncia de Gregório 7º, em 1415.

Oposição

Desde que foi eleito, em março de 2013, o papa é alvo de oposição por parte da ala conservadora da Igreja, tanto dentro do Vaticano quanto entre acadêmicos, que rejeitam o que consideram um afastamento da doutrina e tentam impedir reformas. No ano passado, dezenas de teólogos chegaram a assinar uma carta em que acusam Francisco de divulgar heresias na exortação apostólica sobre a família Amoris Laetitia, de 2016.

O documento, que é uma tentativa de abrir novas portas para católicos divorciados e tornar a Igreja mais tolerante com questões relacionadas à família, representa um sinal claro de dissidência, que reflete o descontentamento dos setores mais conservadores da instituição.

Apesar de não ter adotado mudanças concretas profundas nos ensinamentos da Igreja, o papa defende uma postura menos rígida e em sintonia com atitudes modernas em relação a fiéis que se afastaram da doutrina, demonstrando tolerância a homossexuais e permitindo que católicos divorciados ou casados novamente recebam a comunhão.

Francisco também deu destaque a questões sociais, incentivando os fiéis a cuidar dos pobres, acolher imigrantes e refugiados e combater mudanças climáticas, e rejeitou alguns privilégios do cargo, optando, por exemplo, por não morar no Palácio Apostólico.

Em sua carta, Viganò não apenas acusa Francisco de acobertamento, mas tenta conectar as críticas que conservadores fazem ao papa, especialmente à postura de aceitação de gays – em referência a uma entrevista dada após viagem ao Brasil, em 2013, quando o pontífice disse “Se um gay busca Deus, quem sou eu para julgar” -, aos escândalos de abusos sexuais, afirmando que “redes homossexuais” dentro da hierarquia da Igreja são cúmplices na “conspiração de silêncio” que permitiu que os abusos praticados por McCarrick e outros continuassem.

A sugestão de que homossexualidade e abusos estejam relacionados é amplamente rejeitada por especialistas, mas ainda persiste em algumas alas da Igreja. Apesar de muitos dos abusos terem ocorrido há várias décadas, durante os pontificados dos antecessores de Francisco, opositores ligam a crise à incapacidade do papa de manter sob controle a homossexualidade entre o clero.

McCarrick, que liderou a arquidiocese de Washington de 2001 a 2006, durante os pontificados de João Paulo 2º e Bento 16, renunciou ao posto de cardeal em julho, após acusações de que teria assediado seminaristas adultos e abusado de um menino durante anos. Ele diz que é inocente.

McCarrick havia deixado a arquidiocese ao completar 75 anos, idade em que os bispos católicos são obrigados a apresentar sua renúncia – que pode ser aceita pelo papa ou não -, mas permaneceu no Colégio dos Cardeais, que aconselha o pontífice.

Viganò alega que vários membros do Vaticano sabiam da conduta imprópria do cardeal havia anos. Segundo a carta, depois que McCarrick deixou a arquidiocese em Washington, Bento 16 havia proibido que ele, que ainda era cardeal, oficiasse missas e vivesse em um seminário, entre outras restrições. Mas Francisco, apesar de saber das acusações, teria levantado essas restrições e até permitido que o cardeal ajudasse na escolha de bispos americanos

Os católicos americanos ainda tentam digerir as revelações divulgadas no início de agosto em um relatório da Suprema Corte do Estado na Pensilvânia. O documento acusa pelo menos 300 padres de terem abusado de mais de mil crianças ao longo de 70 anos e líderes da Igreja de terem acobertado os crimes.

Reações

Apoiadores do papa e alguns sobreviventes de abusos questionam a credibilidade das alegações, apresentadas sem evidências, e acusam Viganò de usar o sofrimento das vítimas para avançar sua agenda política e uma vingança pessoal contra Francisco.

Alguns observam que McCarrick apareceu em vários eventos, inclusive ao lado de Bento, no período em que supostamente estaria sob sanções, e lembram que foi Francisco, ao contrário de seus antecessores, que forçou o cardeal a renunciar.

Também ressaltam o fato de os principais nomes criticados na carta serem liberais e aliados do papa, o que levantaria suspeitas de que as acusações têm motivação ideológica.

“Esse documento não tem o objetivo de proteger crianças, e sim atacar o papa e qualquer um associado a ele”, disse à BBC News Brasil o pesquisador de estudos católicos Michael Sean Winters, colunista do jornal National Catholic Reporter.

Mas alguns bispos conservadores defenderam o ex-núncio como um homem de princípios. Um deles, Joseph Strickland, de Tyler, no Texas, orientou padres de sua diocese a ler durante a missa do último domingo uma declaração em que afirma acreditar nas alegações.

Um dos principais opositores do papa, o cardeal americano Raymond Burke, ex-arcebispo de St. Louis, disse em entrevista à imprensa italiana que, caso as alegações sejam comprovadas, “sanções apropriadas” devem ser aplicadas.

Histórico de polêmicas

Viganò tem um histórico de polêmicas. O italiano de 77 anos trabalhou em missões do Vaticano no Iraque e no Reino Unido, foi núncio apostólico na Nigéria e ocupou altos cargos na Cúria Romana, mas nunca foi promovido a cardeal.

Ele próprio já foi acusado de tentar acabar com uma investigação sobre a conduta sexual de um ex-arcebispo em 2014, segundo documentos relacionados à arquidiocese de St. Paul-Minneapolis. Também foi personagem no escândalo “Vatileaks”, em 2012, em que documentos do Vaticano foram vazados, entre ele cartas em que Viganò sugeria que sua transferência para Washington, em 2011, estaria relacionada aos seus esforços contra a corrupção na Santa Sé.

Em 2015, durante a visita de Francisco aos Estados Unidos, Viganò organizou um encontro surpresa entre o papa e uma funcionária pública que havia se recusado a emitir licenças de casamento para casais do mesmo sexo alegando motivos religiosos. O encontro foi visto como um desafio à mensagem de inclusão do papa e obrigou o Vaticano a divulgar uma declaração se distanciando da funcionária. Pouco tempo depois, Francisco substituiu Viganò.

Em sua temporada em Washington, Viganò cultivou relações com setores católicos conservadores críticos do papa, um grupo que Winters descreve omo “pequeno, mas muito bem organizado e muito bem financiado”.

Segundo Faggioli, desde o início do pontificado de Francisco, círculos conservadores do catolicismo americano deixaram claro que não gostavam do papa e de suas tentativas de reforma. Ele observa ainda que poucos bispos nos Estados Unidos defenderam o papa após a publicação da carta. “A maioria dos bispos está esperando (para de posicionar)”, acredita.

Por enquanto, o papa tem mantido silêncio sobre as acusações de Viganò, limitando-se a dizer que o documento “fala por si próprio”. Segundo analistas, o papa não quer dar mais visibilidade a seus críticos.

Mas no avião ao voltar da Irlanda, ao responder a uma pergunta sobre o que pais deveriam dizer a um filho ou filha que revela ser gay, o papa disse: “Não condene. Dialogue, entenda.”

Faggioli diz acreditar que a carta de Viganò tem inconsistências e “buracos”, mas mesmo assim considera fundamental que o papa e outros líderes católicos respondam a algumas questões, especialmente sobre McCarrick.

“Os católicos americanos, tanto liberais quanto conservadores, querem saber como foi possível que essa pessoa se tornasse um dos mais importantes líderes da Igreja enquanto outros sabiam (dos abusos). Como isso pode acontecer?”

 

Crise econômica e degradação da segurança pública

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A economia brasileira vem derretendo nos últimos cinco anos, do período 2003 a 2013, as taxas de crescimento econômico foram generosas com o Brasil, a melhoria na economia gerou uma certa sensação de que o país tinha encontrado os rumos para seu desenvolvimento econômico, o ufanismo estava assentado nos indicadores positivos, a economia crescia motivada pelas demandas chinesas e pelas políticas de inclusão do governo federal, o salários e a renda agregadas cresceram e colocaram o país no radar das grandes empresas transnacionais e os investimentos anunciados eram bastante positivos, neste ambiente a revista britânica The Economist dedicou uma matéria de capa para saudar o crescimento brasileiro, a foto mostrava o cristo redentor decolando.

Neste ambiente de prosperidade aparente, os governos petistas se sucederam no comando do país e se concentraram em uma política bastante ambígua, de um lado abriram os cofres para as populações mais necessitadas, com inúmeras políticas públicas direcionadas diretamente para estes grupos sociais mas, ao mesmo tempo, adotaram políticas que garantiram um forte crescimento dos setores mais ricos da população, em nenhum momento da história do país os ricos ganharam tantos recursos e enriqueceram, os dados da revista Forbes nos mostrava que o Brasil foi um dos países que mais aumentaram seu número de milionários e de bilionários, o clima era de euforia.

Todo analista mais criterioso, ao olhar as bases da política econômica adotada pelos governos petistas, percebia que toda aquela situação dificilmente se manteria por muito tempo, os recursos do Estado dificilmente teriam condições de manter as altas taxas de crescimento que colocavam o Brasil na berlinda da economia internacional como um case de sucesso e de crescimento econômico com melhorias sociais mas, mesmo assim, a grande maioria evitava proferir críticas mais sólidas e consistentes por medo de parecerem antipatrióticos e desinformados sendo, com isso, degredado ao esquecimento eterno e perdendo, com isso, os altos valores destinados a propaganda oficial.

A situação começou a se alterar com os graves erros econômicos cometidos pela presidente Dilma Rousseff, onde destacamos os equivocados controles sobre os preços dos combustíveis e da energia elétrica que geraram graves constrangimentos financeiros para a Petrobrás, que era obrigada a comprar combustíveis no mercado internacional e vendê-los internamente a um preço mais barato, e das empresas do setor de energia que para renovar suas concessões aceitaram redução nos preços das tarifas que as levaram à beira da insolvência, obrigando toda a população a pagar mais caro pelo consumo da energia.

Destacamos ainda a desoneração de inúmeros tributos para aumentar os recursos das empresas e, com isso, abrir espaço para novos investimentos produtivos que culminariam em aumento nos empregos e uma melhora considerável da renda e da demanda agregadas, gerando novas perspectivas para a economia do país que já sentia a redução do crescimento e do investimento, esta desoneração girou em muitos bilhões de dólares e os investimentos das empresas privadas não se materializaram, o resultado desta política foi a queda na arrecadação e a piora das contas públicas que levaram o país a perder o grau de investimento, selo dado pelas agências de rating internacional atestando que o país cumpre de forma correta com todos os seus compromissos financeiros internacionais, com a perda deste selo, os juros pagos pelo país para rolar suas dívidas cresceu de forma acelerada e colocou a crise fiscal no centro das discussões econômicas.

O resultado fiscal do governo federal foi avassalador, o resultado primário do setor público consolidado saiu de um superávit de R$ 128,7 bilhões em 2011, para R$ 105 bilhões em 2012, R$ 91,3 bilhões em 2013, para um déficit de R$ 32,5 bilhões em 2014, déficit de R$ 111,2 bilhões em 2015, outro déficit de R$ 155,8 bilhões em 2016, em 2017 o déficit caiu para R$ 118,6 bilhões, a projeção para 2018 é de R$ 159 bilhões e as estimativas para o próximo ano são bastante ruins, déficit de R$ 139 bilhões, tudo isso exige da sociedade medidas draconianas de ajuste, mais impostos a população não aceita mais, então é fundamental reduzir as despesas e estimular o crescimento, sem isso o país fica cada vez mais inviável e as perspectivas serão cada vez mais perturbadora.

A falta de competência  para negociar com o Congresso Nacional e as dificuldades de comunicação e de liderança, levaram a presidente a amargar um impeachment, mais um em um período muito curto de tempo, dos últimos quatro presidentes eleitos pela população, dois foram apeados do poder por denúncias variadas, o país se transformou em uma nação difícil de ser governada, devemos destacar ainda, que o atual presidente, por pouco também não sofreu uma tentativa de investigação devido a declarações de empresários, o país se transformou numa grande incógnita, estamos vivendo uma crise política pouco vista em nossa história recente, precisamos de uma liderança confiável, competente e apaziguadora, somente desta forma poderemos reconstruir os cacos do país e construir uma nova sociedade, lutando contra as agruras sociais e os desequilíbrios históricos que construímos em quase duzentos anos de história como país independente.

Nos últimos anos o Brasil mergulhou em uma crise econômica brutal, o país só não se degradou por completo na seara econômico porque nos anos recentes o país acumulou uma grande quantidade de reservas internacionais, estes recursos acumulados estão lastreados em moeda forte e servem como um grande colchão para aparar nossos outros desequilíbrios, perdemos uma chance histórica de reconstruir este país na primeira década deste século, neste momento o Brasil alcançava índices elevados de crescimento e, infelizmente, o governo sucumbiu da missão de fazer as reformas que, na época, já eram inadiáveis, dentre elas destacamos a Previdenciária, a Tributária e a Política, como não foram feitas voltam a tona todos os anos e incomodam todos os gestores que pensam a sociedade brasileira no longo prazo.

Acompanhando as discussões políticas e econômicas desde o começo dos anos 90, percebemos que, neste período, tínhamos um partido fortemente contrário a todas as políticas e proposições do governo FHC, um período onde as críticas das esquerdas eram fortes e bem formuladas, percebíamos tudo isso e mais ainda, uma esquerda que se colocava no centro das virtudes e dotada de sólidos valores éticos e morais, conscientes de sua integridade e de seu papel na sociedade, com isso angariaram admiradores e seguidores, com isso, conquistaram a vitória nas eleições presidenciais e conseguiram realizar o sonho de todos os grupos políticos, chegaram a Presidência da República.

Os anos petistas foram emblemáticos, todos os indicadores econômicos e sociais sob o manto petista melhoraram, a união de programas sociais e a criação de outros incluíram na sociedade de consumo um grande contingente de pessoas antes excluídas, aumentaram as vagas nas universidades públicas e conseguiram colocar um grande contingente de pessoas, antes excluídas, nos bancos das universidades privadas, através do Programa Universidade para Todos (Prouni). Destacamos ainda um amplo projeto de capitalização das instituições financeiras, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) recebeu mais de R$ 500 bilhões para canalizar estes recursos para a economia, era a velha política de escolha dos campeões nacionais, que transformou empresas como a JBS, o Grupo X e o Grupo Telemar em grandes conglomerados, muitos deles com presença internacional de destaque, atualmente a situação financeira é bastante desconfortável para cada uma destas organizações.

Todo este crescimento desmoronou em 2014, os números positivos foram revertidos e o país mergulhou em uma grande recessão, com impactos negativos para a sociedade, o desemprego aumentou imensamente e os indicadores de violência se mostram cada vez mais desanimadores, os assassinatos aumentaram imensamente, em 2011 foram 48,084 vítimas de homicídios, latrocínios e lesões corporais seguidas de mortes, estes números saltaram para 53.054 em 2012, 54.163 em 2013, 57.091 em 2014, 55.492 em 2015, 57.549 em 2016 e 59.103 em 2017, com isso, o Brasil se destaca como um dos países mais violentos do mundo, enquanto isso, a indústria das armas e dos equipamentos de vigilância e de defesa cresce como se a crise não existisse.

Estes números nos mostram questões muitos claras e insustentáveis, somos um país violento, a máxima de que somos um povo gentil e agregador é mais um mito de muitos que nos foram contados na nossa história oficial, que reproduzimos e pouco refletimos, como se fosse um verdadeiro dogma que nunca se deve questionar, pois seremos descritos como hereges, e muito menos se rebelar, como cordeiros que sempre fomos e vamos continuar durante muitos anos.

Esta violência destrói todas as esperanças da população, de um lado encontramos um discurso de falta de dinheiro, que nos parece uma realidade no modelo fiscal que temos mas, de outro lado, encontramos setores mais organizados se estruturando e conseguindo benefícios e isenções de todas as naturezas, desde as fiscais até as tributárias, enquanto a classe média definha e os setores mais necessitados vivem, ou melhor, sobrevivem acumulando as maiores privações e humilhações, os grupos mais privilegiados acumulam benesses das mais generosas possíveis, férias polpudas, salários gordos e benefícios bastante atrativos, um país com várias realidades diferentes, somos um país à beira de uma das rupturas mais intensas e perigosas de nossa história.

Outro ponto central que deve ser destacado, dentre os crimes que mais crescem no Brasil contemporâneo devemos destacar o feminicídio, a violência contra as mulheres, a violência doméstica, um crime muitas vezes cometidos por seus parceiros ou companheiros, os crimes são tão violentos que chegam a chocar pela agressividade, pela insensibilidade e pela crueldade, levando muitos homens a se identificar com os mais cruéis dos monstros, uma degradação que nos permite dizer, claramente, que os seres humanos estão se deixando levar por processos obsessivos e sua agressividade se torna cada vez mais destrutiva, criando vínculos de ódio, rancor e ressentimentos.

Neste ambiente de guerra não declarada, encontramos um avanço considerável do crime organizado pelo país, o crescimento e expansão do Primeiro Comando da Capital (PCC) está na origem deste crescimento da violência, percebemos uma guerra entre as facções, o período de tréguas entre elas chegou ao fim e as mortes dos grandes líderes já foi anunciada, alguns já foram executados e outros mais o serão, os modelos de gestão destas organizações chamam a atenção como cases de sucesso e, muito brevemente serão estudados nas universidades e nos cursos de MBA, o resultado final desta guerra ainda é incerto mas temos hoje, atualmente no país, que os perdedores deste tiroteio são todos os cidadãos de bem que pagam seus tributos e se desencantam com a situação de descaso e degradação dos serviços públicos de saúde, educação, moradia, infraestrutura, etc…não é difícil, diante de todo este cenário sombrio e de desesperança entender porque na liderança das pesquisas eleitorais para presidente da República temos um militar, que prega antes de mais nada um endurecimento das leis e uma medida de exceção para que os militares quando forem atender uma chamada possam atirar, matar e não ser julgados pelas autoridades, mas sim condecorados pelo seu gesto de coragem e de bravura, estamos na maior guerra de nossas vidas e o futuro não nos reservas melhorias consideráveis, apenas medos e preocupações, que Deus proteja a todos nós.

 

 

“O mundo está dando uma nova chance ao Brasil”

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Marcos Troyjo, Cientista Político e Economista

Revista Isto é Dinheiro – 03082018 – Germano Oliveira

O economista e cientista político Marcos Troyjo, professor da Universidade Columbia, em Nova York, avalia que o Brasil já teve inúmeras oportunidades para desenvolver sua economia e obter papel de destaque no comércio internacional, mas desperdiçou a maioria delas, sobretudo por não realizar reformas estruturais que tornassem o País mais atraente aos investidores estrangeiros, que hoje dispõem de enormes recursos para aplicar em países emergentes. Uma dessas oportunidades perdidas, segundo ele, aconteceu no governo Lula, período no qual as commodities agrícolas viveram um momento amplamente favorável, mas o petista preferiu adotar políticas populistas e protecionistas que afastaram grandes investimentos. Agora, contudo, de acordo com Troyjo, o mundo está dando “uma nova chance ao Brasil”, mas adverte:“o País não pode eleger um presidente que defenda o nacional-desenvolvimentismo como alternativa, como é o caso do PT, PCdoB, PSol e, às vezes, Ciro Gomes”. Especialista em política externa, Troyjo está finalizando o livro “Choque de Globalizações: o Brasil em Busca da Grande Estratégia”, que chega às livrarias em outubro.

O senhor diz no seu livro que a globalização vem perdendo força, sobretudo por causa do crescimento do populismo e da intolerância no mundo. Como isso está se dando?

Quando acabou a guerra fria, a queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética, o mundo foi tomado de um grande entusiasmo no início da década de 90, com a vitória do Ocidente, dos países mais democráticos, com economias abertas, prevalecendo o livre mercado. Desse período até a grande crise do Lehman Brothers em 2008, vivemos um processo de globalização profunda. De 2008 para cá, os sinais se inverteram. O clima de livre comércio foi substituído por sinais do protecionismo e pelo mundo do cada um por si, devido ao populismo e intolerância. Eu chamo esse período dos últimos dez anos de desglobalização. O comércio internacional, por exemplo, começou a cair. A livre circulação de bens e de serviços, também começaram a cair. E ao mesmo tempo aumentaram as restrições no intercâmbio de universidades, no mercado de trabalho.

O que a desglobalização está provocando de malefícios para a humanidade?

Estamos tendo uma perda de eficiência da economia muito grande. Num momento em que uma empresa como a Starbucks tem que comprar o papel que envolve os canudinhos de uma fábrica em Ohio, em vez de comprá-los em uma fábrica na Tailândia, por uma fração do preço que paga nos Estados Unidos, isso gera desemprego no local onde anteriormente a empresa tinha sua operação. E isso onera a plataforma de custos das empresas, afetando seu balanço patrimonial. Na última sexta-feira 27, quando se anunciou o PIB americano, de 4,1% de expansão no trimestre, todo mundo ficou de olho arregalado, mas as bolsas caíram. E não foi só por causa do efeito das ações do Facebook e Twitter. Mas também porque há a idéia de que haverá uma adequação do PIB americano por conta da guerra comercial desenvolvida por Trump e essa é uma das facetas da desglobalização. Com a guerra comercial que vem por aí, quem perde mais são os países que tem grandes empresas transnacionais e nenhum país tem tantas empresas transnacionais como os EUA.

O senhor diz ainda no seu livro que o Brasil também teve um grande um ciclo populista e protecionista. Como foi esse processo?

Tivemos um ciclo populista e protecionista de 2003 a 2016, durante os governos do PT. E por que esse período foi lamentável? Em primeiro lugar, porque o mundo esteve muito bom para o Brasil e não se aproveitou as chances que nos foram dadas. Se levarmos em consideração o grande ciclo favorável das commodities, os grandes estoques de liquidez disponíveis no mundo para serem aplicados em países com pouca poupança, como era o caso do Brasil, e também as vantagens comparativas que temos em produtos como a soja, poderíamos ter aproveitado esse vento de cauda para ter feito as reformas estruturais e nós não as fizemos. E não fizemos por quê? Porque o governo teve a sensação de que os bons tempos iriam perdurar para sempre. E isso fez com que os governos petistas não mexessem em problemas cruciais, como a Previdência e as questões trabalhistas, o que nos deixou em continuado atraso, vivendo esse grande ciclo populista.

E o ciclo protecionista?

Também durante os governos petistas vivemos o renascimento das antigas teses de substituição de importações, com a idéia de desenvolver uma cadeia de produção vertical em todo o território nacional e que, para isso, deveríamos dar incentivos aos chamados campeões nacionais. O Brasil voltou a adotar uma estratégia econômica parecida com a que foi adotada nos anos 40 ou 50, ou mesmo no período nacional-desenvolvimentista do regime militar. É muito parecida a filosofia econômica do PT com a adotada pelo governo militar. E um dos legados disso foi ver como o Brasil diminuiu sua participação no fluxo do comércio internacional. Tudo o que o Brasil exporta e importa — e que chegou ser de 2,5% do comércio mundial — agora é de 1%. Se fizermos uma radiografia do nosso comércio, vamos perceber que tudo o que o Brasil importa, somado ao que exporta, dá 22% do nosso PIB. Das 15 maiores economias do mundo, é o menor contingente em relação ao PIB.

O período petista representou, então, um retrocesso?

Foi uma oportunidade desperdiçada. Deveríamos ter feito as reformas internas e, sobretudo, a reforma na nossa inserção internacional. Reforma que levasse nosso comércio ao patamar de 35% a 40% do PIB, com a adoção de uma política voltada para a ampliação das exportações e importações, assinando novos acordos comerciais.

Dos candidatos a presidente que estão aí, quem ameaça o nosso melhor desempenho internacional?

Quem continua defendendo o nacional-desenvolvimentismo como alternativa é o PT, PCdoB, PSol e às vezes Ciro Gomes, que tem um discurso um pouco pendular. A não ser que ele esteja utilizando a estratégia do violino: pega com a esquerda, mas toca com a direita. Já o Meirelles, o Alckmin e o Bolsonaro/Paulo Guedes, têm adotado uma retórica mais liberal de inserção internacional. Eles entendem melhor as necessidades do dinamismo do nosso comércio.

O senhor afirma que, além dos Estados Unidos na era Trump, também a Europa tem se tornado mais protecionista. De que forma isso está acontecendo?

O protecionismo da Europa é mais sofisticado. As tarifas na União Européia até estão caindo, mas eles têm muitas barreiras fitossanitárias e barreiras técnicas, que acabam funcionando como protecionistas. Vou dar um exemplo. Exportação de carne de gado. Eles exigem a rastreabilidade, desde o momento do nascimento do animal, com chip subcutâneo, para o acompanhamento em real-time da sua saúde. Fazem exigências enormes. Ou então eles dão subsídios para seus produtores e isso torna os produtos dos concorrentes quase que inviáveis.

O senhor avalia que a tendência é da China se tornar a maior economia do mundo, superando os EUA. Então o Brasil deveria se aproximar ainda mais da China?

Já estamos muito próximos da China. É o nosso principal parceiro comercial e provavelmente vamos fechar 2018 com exportações para a China que representam quase o dobro das nossas exportações para os EUA. Para a China, vendemos muita soja, minério de ferro, petróleo. Mas é importante perguntar para os candidatos a presidente que estão aí qual é sua política para a China? Além de parceiro comercial, a China cada vez mais é fonte de investimento estrangeiro direto. Nesses processos de fusões e aquisições, os chineses estão comprando muita coisa no Brasil. Ainda é um dos poucos países do mundo que podem atuar como fonte de empréstimo governo a governo, porque isso quase não existe mais no mundo. Existia nos anos 70 e 80, quando o governo americano e o governo japonês faziam empréstimos-ponte. Isso só os chineses fazem hoje. E como os chineses precisam ter garantias para seu processo alimentar, é natural que seus investimentos também venham mais para o Brasil. Os candidatos a presidente precisam saber lidar com a China.

Nessa guerra comercial que os EUA começam a fazer, o Brasil pode sair como perdedor?

Pelo contrário. Nos próximos dois anos e meio, a guerra comercial travada pelo Trump trará mais benefícios do que malefícios para o Brasil. Trará benefícios porque hoje os chineses compram R$ 14 bilhões por ano em soja dos EUA. E se os chineses retaliarem os americanos na soja, o produto tem que ir de algum lugar. E pode ser do Brasil e da Argentina. 

Um dos legados da política nacionalista dos governos do PT foi ver que a participação do Brasil no comércio mundial caiu de 2,5% para os atuais 1%

O mundo não está ruim para o Brasil. Há uma demanda aquecida por commodities e há um grande estoque de dinheiro no mundo sedento por aplicações em mercados emergentes. Os grandes centros internacionais de liquidez, como China, Japão e países Árabes, querem diversificar seus investimentos. Temos espaço agora para correr atrás na atração desses capitais. Provavelmente, teremos que intensificar nosso processo de privatizações e de projetos de parcerias-público-privadas. Uma das características umbilicais desse nocivo processo de desenvolvimento nacionalista do governo petista entre 2003 e 2016 foi a de cultivar a idéia de que poderíamos fazer tudo por meio da liderança do Estado.

O que o novo presidente pode fazer para melhorar a inserção do Brasil no comércio internacional?

É indispensável uma maior promoção do Brasil no exterior. Nossa presença física em vários mercados é inadiável. Ter agências de promoção de negócios em Cingapura, Xangai, Londres. Poderíamos aproveitar melhor nosso patrimônio no exterior. O Brasil tem um imóvel gigantesco em Nova York, na rua 79. E para o que serve aquilo? Para o embaixador dormir. A embaixada deveria ser uma agência de promoção do Brasil.

E não podemos repetir erros do passado, certo?

O mundo está, mais uma vez, dando uma chance para o Brasil. O que poderia ser negativo, como a guerra comercial, nosdará oportunidades para novos negócios. Eu não digo que estamos entrando num dia de sol perfeito, mas estamos com boas chances de crescer no comércio internacional e alavancar nossa economia. Já tivemos várias oportunidades e perdemos quase todas. Vamos perder mais uma chance ou vamos aproveitar que nossas commodities serão valorizadas e que há um grande volume de recursos para investir nos países emergentes? Não podemos perder essa nova chance.

 

 

Amores e relacionamentos líquidos

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Os filmes de Hollywood sempre nos mostraram histórias de amor cheias de sentimentos intensos e verdadeiros, romances marcados por abraços e beijos acalorados, casais apaixonados e vivendo intensamente este sentimento, tudo isso sempre encantou a sociedade mundial e embalou muitos sonhos de amor verdadeiro, levando casais a juras eternas de amor, de respeito e de fidelidade, sentimentos nobres e intensos que, na sociedade contemporânea, se encontram fora de moda, o amor romântico se tornou ultrapassado e pouco cultivado.

Nos contos modernos os mocinhos foram substituídos, as princesas foram trocadas e os sentimentos verdadeiros estão adormecidos, as histórias em quadrinhos não atraem nem mesmo as crianças que, nesta sociedade acelerada são estimulados, logo cedo, a acessar seus aparelhos digitais e navegar num mundo de descobertas e fantasias, mas ao mesmo tempo de perigos e ameaças de todas as naturezas, obrigando dos pais ou responsáveis atenção e controle.

Vivemos numa sociedade marcada pela superficialidade, nossos relacionamentos são sempre muito vazios, as instabilidades do mundo invadem os corações das pessoas e impedem que os enamorados se entreguem, o medo da frustração é tanto, que preferimos cultivar toda esta superficialidade, fugir dos grandes amores e dos grandes sentimentos e se contentar com momentos fixos de prazer, de sexo e de gozos sexuais, somos marionetes do ficar e fugimos assustadoramente do amar e se entregar.

O sociólogo polonês Zygmunt Baumann, famoso intelectual da sociedade contemporânea, cunhou a expressão mundo líquido, para definir uma sociedade que se compraz com a superficialidade, no mundo atual tudo é líquido, os amores e os sentimentos escorrem pelas mãos, os modelos mais intensos de relacionamentos foram deixados para trás, o medo dominou as relações cotidianas, não queremos nos frustrar com os relacionamentos mais intensos e verdadeiros, pois eles podem nos causar dores íntimas, decepções violentas e criar mágoas e constrangimentos dos mais severos possíveis.

Nesta sociedade do século XXI vivemos o drama do individualismo, depois da hegemonia do pensamento liberal em que o indivíduo é visto como sobrepondo ao coletivo, percebemos que este indivíduo cunhado pelas teorias liberais se encontra em crise profunda, esta crise se manifesta numa intensa solidão e desesperança, estamos mergulhados num mundo em que não mais confiamos no futuro, as bases da democracia estão solapadas, os modelos de liberdade clássica estão ameaçadas e o ser humano amedrontado e infeliz, a crise da modernidade é, antes de mais nada, a crise dos indivíduos.

A lógica econômica se sobrepõe a todas as outras lógicas da sociedade contemporânea, acreditamos que pensamos e agimos como o homem econômico, todas as nossas ações julgamos racionais e calculadas, nosso trabalho se dá envolto em contas e cálculos intensos de ganhos e perdas, no campo religioso buscamos maximizar nossas oferendas e trocas com o divino, nossos relacionamentos são colocados na ponta do lápis e maximizamos nossos gozos e buscamos reduzir, e até acabar, com nossas dores, somos seres quase racionais que nos julgamos reflexivos e racionais, mero autoengano.

As grandes mudanças contemporâneas estão criando novos modelos de família, os modelos tradicionais estão sendo substituídos por novas organizações familiares, o modelo clássico baseado em um casamento heterossexual, papai e mamãe, está sendo substituído, em ritmo acelerado, por vários modelos diferentes, casais de homem com  homem, de mulher com mulher, de relacionamento com três pessoas, dentre outros, são várias as fórmulas de amores em constantes transformações na sociedade contemporânea, tudo isto gera medos, instabilidades e incertezas crescentes nos indivíduos e acabam abrindo espaços crescentes para xenofobismo, intolerâncias e sectarismos.

As famílias deixaram de ser o porto seguro para as crianças e para os casais, se transformando em um espaço de confrontos e inconveniências, onde encontramos conflitos, rancores e ressentimentos que contribuem para minar o papel social da família, soma-se a isto, as violências que crescem de forma acelerada, pais violentos que se agridem mutuamente, pais austeros se insurgem com seus filhos discordando de atitudes, comportamentos ou relacionamentos, acumulando mágoas e dores intensas e, para muitos, insustentável.

A violência contra filhos homossexuais cresce de forma acelerada, alguns pais dizem que não batem em seus filhos, mas quando descobrem sobre sua sexualidade, os marginalizam, humilhando e os agredindo verbalmente, criando um caldo de rancores e ressentimentos que quando explodem resultam em violências das mais intensas que existem, culminando em crises que seus impactos são sentidos muito além desta vida atual.

As famílias contemporâneas não mais fazem as refeições juntas, uns comem no quarto assistindo a programas de televisão, outros estão tão envoltos com o trabalho cotidiano que almoçam e jantam na rua, desta forma percebemos um distanciamento cada vez maior entre pais e filhos, abrindo caminho para um encontro, muitas vezes inadiável entre seu filho e o traficante da comunidade, este conhecerá a rotina de seu filho e se disponibilizará a acolhê-lo nos momentos de dúvidas quando tiver interesse em lhe vender drogas e tóxicos, o resultado desta equação as famílias brasileiras estão visualizando todos os dias, destruição, lágrimas, revoltas e arrependimentos.

Outro traço marcante desta nova configuração familiar é a falta de diálogo, as pessoas que compõem a família pouco conversam, os pais não encontram tempo para ver e, muitos menos, dialogar com seus filhos, que se perdem num mundo cheio de ilusões, os prazeres sexuais são fortes e chamativos, atraem os indivíduos e muitas vezes os levam a caminhos perigosos e tortuosos, as festas, os passeios e as alegrias geram prazer e também cobram um preço alto e, muitas vezes, impagável.

As religiões que sempre foram o espaço da conversação com o divino, o local do reequilíbrio, da conversa serena e da reflexão crítica, hoje se perdem na busca incomensurável pelos recursos materiais, pela gana do acumular, do ter, nos templos nos dedicamos a ouvir músicas e louvores sem consistências, cantamos e não sentimos os sentimentos mais nobres que deveriam emanar do local, o espaço religioso se perde do mundo do marketing, o dízimo é substituído pelo orar e os resultados são alienação e intolerância.

Vivemos em uma sociedade em forte transformação, viver neste momento é um misto de prazer, de medo e de incerteza, refletir sobre o mundo contemporâneo é um intenso procurar respostas para as variadas perguntas que nos são feitas todos os dias, neste mundo de transformações constantes, as tradições estão sendo destruídas e novas estruturas estão sendo colocadas no lugar, o resultado imediato é um misto de medo e preocupação, todos sabemos que estamos indo para uma nova sociedade e num ritmo crescente, mas ninguém saberia definir, com clareza, para que lugar estamos sendo conduzidos.

Quando falamos das dificuldades da sociedade internacional, é importante destacar que as famílias estão no centro destas mudanças, antigamente tínhamos família enormes, onde os filhos eram aproveitados como mão de obra na produção rural, com o crescimento da sociedade urbana, o desenvolvimento de novas técnicas reprodutivas, os investimentos cada vez maiores na criação de uma criança e as mudanças nos relacionamentos, tudo isto contribuiu para a diminuição do crescimento vegetativo, na atualidade encontramos lares com poucos filhos, muitos deles dirigidos por mulheres e sem a figura masculina presente no cotidiano.

As incertezas do mundo contemporâneo colocam em xeque a tolerância e a democracia, os indivíduos estão tão abobados com a sociedade que está emergindo que relutam em tentar compreender os seres humanos, não buscam se colocar no lugar das outras pessoas, a empatia tão fundamental para a construção de uma sociedade mais sólida se encontra perdido em algum local entre os indivíduos, suas crenças e seus mais intensos medos e desesperanças.

A violência crescente na sociedade brasileira, apenas no ano passado, mais de 63 mil pessoas foram assassinadas, deixando um rastro de dores e tristeza em famílias enlutadas, deixando muitos órfãos e órfãs a deriva, desestruturando famílias e aumentando as incertezas e os medos com relação ao futuro, onde muitos lares serão destruídos e marcados pelas dores dos assassinatos e das violências crescentes que assolam a sociedade.

A depressão e o suicídio também surgem como males contemporâneos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada quarenta segundos, uma pessoa se suicida no mundo, gerando desequilíbrios intensos sobre as famílias e todos que os cercam; a depressão se dissemina e atinge 5% da população mundial, algo em torno de 350 milhões de pessoas, uma doença que afeta todas as classes sociais e todos os indivíduos, levando os indivíduos a conviver com uma dor crescente e uma insatisfação generalizada, todos estes problemas mostram que a sociedade acelerada em que vivemos é uma sociedade doente em estado avançado e os indivíduos podem ser descritos como doentes terminais, perderam os verdadeiros valores da vida, a família é deixada de lado e as consequências de tudo isso visualizamos a todos os momentos no cotidiano.

 

 

 

 

Instabilidade financeira internacional e guerra comercial

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A economia mundial está passando por grandes transformações nos últimos anos, gerando impactos incertos em todas as regiões do mundo, de um período de forte crescimento econômico, estamos nos aproximando de um momento de crises financeiras e conflitos comerciais entre potências econômicas como a que está em curso entre as duas maiores economias mundiais, Estados Unidos e China, podendo reverter anos de crescimento do comércio internacional, de democracia e de estabilidade entre países e regiões.

O comércio internacional foi um dos grandes motores da economia internacional no pós segunda guerra, aumentando a integração e a interdependência entre os agentes econômicos e produtivos, os modelos foram sendo internacionalizados e as economias passaram a ser mais competitivas, abrindo espaço para uma redução das políticas protecionistas e uma melhora nas condições sociais de muitos países e regiões, como na Coréia do Sul, na Malásia, na Indonésia, na China, no Chile, entre outros.

Os ventos do comércio internacional, infelizmente, não prosperaram no Brasil da forma como cresceu em outras regiões, ainda somos um país imensamente protecionista, nossa estrutura econômica ainda se caracteriza por uma grande proteção do Estado aos setores produtivos, encontramos muitas queixas dos excessos de burocracia do Estado brasileiro mas percebemos que as empresas nacionais não abrem mão da proteção dada pelo governo, acreditando que esta proteção é fundamental para a sobrevivência das empresas nacionais, relutam na concorrência com empresas de outros países acreditando que as condições internas não concedem as isonomias necessárias para a competição com grupos mais fortes do mercado internacional, perpetuando uma relação de dependência entre o empresariado nacional e o Estado, muitas vezes criando espaços claros de corrupção e ineficiência.

Países que adotaram uma estrutura econômica mais aberta e integrada ao comércio internacional foram mais bem sucedidos no desenvolvimento de suas economias, melhoraram as condições de vida de suas populações e conseguiram construir uma sociedade mais equânime, mas além de abrirem suas estruturas econômicas e exporem seus agentes produtivos a uma maior competição, foram responsáveis por políticas protecionistas exitosas, protegeram suas economias, mas estimularam um clima de concorrência durante os momentos de proteção e quando sentiram que estas empresas estavam em condição, abriram os setores e estimularam a concorrência internacional, colhendo resultados promissores e bastante positivos.

Nas últimas décadas, depois da segunda guerra mundial, os Estados Unidos tomaram as rédeas da economia internacional, estimularam a abertura das economias, a integração regional, a redução das políticas protecionistas, além de estimular a democracia representativa e os princípios liberais, todas estas medidas auxiliaram no desenvolvimento da economia global que cresceu de forma acelerada até meados dos anos 70 e contribuíram para uma maior integração e interdependência entre os países, com blocos econômicos, acordos comerciais e áreas de livre comércio.

De todos os países, os asiáticos foram os maiores beneficiados com esta nova estrutura econômica e comercial, dentre eles destacamos o Japão e a China, mas poderíamos destacar outros, como os países do leste asiático, como a Coréia do Sul, Hong Kong, Indonésia, Malásia e Cingapura, todos cresceram de forma acelerada, aumentaram sua integração regional e melhoraram as condições de vida de seus cidadãos, garantindo espaços para o surgimento de uma nova classe média, mais instruída, mais consciente de suas necessidades e dinâmica.

O Japão se caracterizou como uma das economias de maior crescimento no pós 1945, sua estrutura econômica se diversificou fortemente, novos setores centrados em alta tecnologia nas áreas de elétrica e eletrônica, além de novos ganhos na indústria automobilística, garantindo às empresas japonesas uma forte competitividade na indústria global, elevando o status de várias empresas, como Sony, Toyota, Honda, Nissan, Mitsubishi, Panasonic, etc…e aumentando a competição nos mercados globais, garantindo ao país novos ganhos de produtividade e rentabilidade, que possibilitaram a exportação de seu modelo econômico produtivo no final dos anos 1970.

No começo dos anos 90, tínhamos um certo consenso na economia mundial de que o Japão se tornaria a economia hegemônica do século XXI, os ventos favoráveis ao país asiático eram muitos, suas indústrias cresciam de forma acelerada, sua população enriquecia enormemente e o país era visto como um celeiro de novas tecnologias e novas políticas de desenvolvimento, deixando países tradicionais, como os Estados Unidos e Europa, para trás no jogo do crescimento econômico. Esta visão se mostrou equivocada, no final dos anos 80 os Estados Unidos elevaram suas taxas de juros e absorveram grande parte dos dólares disponíveis na economia internacional fragilizando a economia japonesa e forçando um ajuste no país asiático, estas transformações geraram graves desequilíbrios no Japão e abriram espaço para que os norte-americanos retomassem a hegemonia internacional ameaçada com a ascensão japonesa.

A China acordou para este movimento no final dos anos 70, depois da morte de Mao Tsé Tung, o grande líder da Revolução Chinesa, quando Deng Xiaoping assumiu e mudou as regras da estrutura econômica, alterando o modelo de economia socialista para uma nova estrutura produtiva centrada na iniciativa privada e fortemente organizada e planejada pelo Estado chinês. Neste período, a economia chinesa se abriu para o comércio internacional, um protecionismo forte marcado pelo estímulo a reestruturação de setores inteiros com exigências  de ganhos constantes de produtividade, estes incentivos eram datados e os setores privilegiados deveriam melhorar sua performance, garantindo ganhos de produtividade para a economia em geral.

Os ganhos foram tão consideráveis, que a economia chinesa se transformou na segunda maior economia mundial, perdendo apenas para a economia norte-americana, e foi alçada ao posto de maior exportador mundial, ultrapassando países com forte tradição de comércio internacional, tudo isso fez o país asiático se transformar em um grande agente econômico global, gerando medos, incertezas e inseguranças em vários setores da economia internacional.

Depois de décadas de crescimento do comércio internacional, o mundo está envolto em uma perigosa guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo, de um lado os Estados Unidos, que se sentem prejudicados com os altos superávits comerciais chinesas, e de outro lado a China, uma economia em forte expansão econômica que, nos últimos anos se transformou no maior ator do comércio global, na relação comercial entre os dois países encontramos um forte superávit para a China, que exportou US$ 530 bilhões e importou dos US$ 140 bilhões, ou seja, acumulando um superávit de quase US$ 400 bilhões, garantindo ganhos fabulosos para o país asiático e a ira dos Estados Unidos que, neste momento está se materializando nas ameaças protecionistas do presidente Donald Trump contra a economia chinesa.

Os efeitos desta guerra comercial são imprevisíveis para todos os países, de um lado encontramos novos espaços e oportunidades para os produtores, e de outro percebemos perdas para  outros, o fenômeno ainda é bastante recente e não se tem dados claros dos possíveis resultados concretos do conflito, o que se tem mais claro é que o comércio internacional perde e, com isso, todos os países perdem, as regras do comércio também são afetadas e a confiabilidade destes setores também são prejudicadas, ameaçando o equilíbrio da economia mundial.

Os ganhos crescentes dos chineses estão baseados em uma política fortemente protecionista, muitos setores ganharam espaço no cenário global devido ao apoio do governo chinês, crédito farto a taxas de juros reduzidas, além de uma estratégia baseada em preços baixos levaram as empresas do país a ganhar novos mercados e garantir retornos consideráveis, levando a China a acumular uma grande reserva internacional em moeda conversível, algo em torno dos US$ 3,9 trilhões, recursos estes agora utilizados para abrir novos mercados, comprar empresas de vários países e garantir ao país recursos para os investimentos futuros na formação e consolidação de uma educação de qualidade capaz de melhorar as condições de vida da população.

Os gastos, ou melhor, os investimentos da China em educação, pesquisa, ciência e tecnologia, garantem ao país, uma atração, todos os anos, dos melhores pesquisadores disponíveis na comunidade científica internacional, estes buscam no país asiático condições favoráveis para o desenvolvimento de suas pesquisas, recursos em abundância e novos espaços de consolidação profissional.

Os avanços na área da educação são visíveis e palpáveis, as escolas gozam de autonomia pedagógica, de recursos em abundância e de ótimas condições de trabalho, os professores são bem remunerados, respeitados e vistos como agentes centrais para o crescimento do país no cenário internacional, mas destacamos ainda, que todas estas condições são garantidas e aumentadas, se necessário, desde que os ganhos sejam mantidos, as metas alcançadas e os alunos se destacarem em testes, provas e avaliações globais, como as aplicadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o conhecido exame de PISA (Programa Internacional de Avaliação de alunos).

Com a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, em 2016, aumentaram as chances de uma guerra comercial contra a China, esta possibilidade se transformou em um fato com as medidas adotadas pelos norte-americanos para proteger sua estrutura produtiva, estas medidas estão fortemente atreladas a grupos, dentro dos Estados Unidos, que acreditam que a piora das suas condições de vida estão atreladas ao forte protecionismo chinês, a solução para este imbróglio está na diminuição dos superávits chineses no comércio bilateral entre os dois países, este pensamento encontra guarida em muitos setores da sociedade americana.

O grande problema deste pensamento, é que o crescimento dos superávits chineses está atrelado a entrada de empresas norte-americanas em território chinês, estas empresas perceberam que o custo de produção nos Estados Unidos estava crescendo de forma acelerada e viram nesta oportunidade, a chance de produzir no país asiático como a forma de conseguir competir na economia internacional, sem esta medida, as empresas americanas perderiam mercados e seriam fragilizadas na concorrência mundial. Grande parte do superávit comercial chinês com os Estados Unidos é composto por exportações de empresas americanas para seus mercados locais, ou seja, para atender os interesses de seus consumidores dentro dos Estados Unidos da América.

A ascensão de Donald Trump nos Estados Unidos gerou grandes desequilíbrios para a economia norte-americana, as falas atabalhoadas do presidente e suas posições retrógradas em termos comerciais estão gerando um clima de animosidade com antigos parceiros comerciais em todas as regiões do mundo, a Europa, que desde o final da segunda guerra mundial, sempre se caracterizou como um grande parceiro comercial dos americanos, vem se afastando e se incomodando com as posições defendidas pelos norte-americanos, criando uma cisão importante e com vários impactos sobre o comércio internacional, abrindo espaço para que a região caia na zona de influência da China, que neste momento se estrutura e se fortalece para este conflito iminente.

A economia internacional se aproxima de uma situação de fortes ajustes, a ascensão de Donald Trump nos Estados Unidos pode antecipar um movimento recente de novos protecionismos e mais, um movimento de intolerância e xenofobismo, com isso, as bases da economia, criadas depois do Acordo de Bretton Woods, podem estar ameaçadas com fortes perdas para a comunidade internacional, reformar o modelo é uma das atitudes mais urgentes para a boa governança global, mas para que isso seja efetivamente construído, é fundamental o diálogo democrático e construtivo entre os países, sem isso, o mundo caminhará a passos largos para o caos generalizado com graves prejuízos para todos os atores econômicos, aumentando a desesperança e insatisfação com a política tradicional, pavimentando o caminho para lideranças autoritárias, sectárias e antidemocrática.

 

“O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história da economia”

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Considerado de direita na Coreia do Sul e de esquerda na Inglaterra, economista critica rumo das políticas brasileiras e defende protecionismo nos países emergentes

Regiane Oliveira – El País – São Paulo – 15/01/2018

Ha-Joon Chang,especialista em economia do desenvolvimento da Universidade de Cambridge

Você se considera de esquerda? Mesmo acostumado a dar entrevistas, essa pergunta ainda faz gaguejar Ha-Joon Chang, professor de economia da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, que se tornou conhecido por expor os problemas do capitalismo. “Bem…eu possivelmente sou”, respondeu um pouco reticente o acadêmico, como quem confessasse um pecado. Para ele, no mundo polarizado de hoje, admitir-se de qualquer tendência ideológica pode significar uma sentença de morte para um potencial diálogo. Além disso, em diferentes países, a percepção de direita e esquerda é diferente. “Na Coreia do Sul e Japão, por exemplo, o tipo de política industrial que defendo é considerada de direita. Já na Inglaterra, onde vivo hoje em dia, é uma política de esquerda”, afirmou o autor sul-coreano do best-seller Chutando a Escada: A Estratégia do Desenvolvimento em Perspectiva Histórica (Editora Unesp), que veio ao Brasil participar do Fórum de Desenvolvimento, em Belo Horizonte. Ha-Joon Chang conversou com o El PAÍS sobre polarização política, história econômica e o futuro do sistema econômico mundial, que, para ele, não é nem capitalista, nem socialista.

Pergunta. Como a polarização política afeta o desenvolvimento econômico?

Resposta. A polarização é a pior coisa que pode acontecer para a economia. Tudo se torna simbólico. Você começa a se opor a determinada política simplesmente porque ela está associada a um partido de esquerda ou direita. Os debates estão se tornando cada vez mais difíceis. Ambos os lados, ao invés de debater, gritam uns com os outros. Eu gosto de me descrever como um pragmatista. Não importa de onde vem determinada política para o desenvolvimento econômico, contanto que ela funcione.

  1. Desde o Consenso de Washington, no final da década de 1980, muitos países pobres abraçaram as recomendações internacionais para propagar o livre comércio como uma das formas de combater a miséria e se desenvolver. Como você avalia o resultado dessa medida?

R: Hoje, quando olhamos para os países ricos, em sua maioria, eles praticam o livre comércio. Por isso, é comum pensarmos que foi com esta receita que eles se desenvolveram. Mas, na realidade, eles se tornaram ricos usando o protecionismo e as empresas estatais. Foi só quando eles enriqueceram é que adotaram o livre comércio para si e também como uma imposição a outros Estados. O nome do meu livro, Chutando a escada, faz referência a um livro de um economista alemão do século XIX, Friedrich List, que foi exilado político nos Estados Unidos em 1820. Ele critica a Inglaterra por querer impor aos EUA e à Alemanha o livre comércio. Afinal, quando você olha para a história inglesa, eles usaram todo o tipo de protecionismo para se tornar uma nação rica. A Inglaterra dizendo que países não podem usar o protecionismo é como alguém que após subir no topo de uma escada, chuta a escada para que outros não possam usá-la novamente.

P: Como se deu o desenvolvimento dos países ricos na prática?

R:Estes países cresceram com base no que Alexander Hamilton [1789-1795], primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos [que estabeleceu os alicerces do capitalismo norte-americano], defendeu como o argumento da indústria nascente. Do mesmo jeito que mandamos nossas crianças para a escola ao invés do trabalho quando são pequenas, e as protegemos elas crescerem, os Governos de economias emergentes têm que proteger suas indústrias até que elas cresçam e possam competir com as indústrias de países ricos. Praticamente todos os países ricos, começando pela Inglaterra no século XVIII, Estados Unidos e Alemanha, no século XIX, Suécia no começo do século XX, além de Japão, Coreia do Sul e Taiwan…todos estes países se desenvolveram usando protecionismo, subsídios estatais, controle do investimento direto estrangeiro, e em alguns casos, até mesmo empresas estatais.

P: Como esse passado dialoga com as medidas atuais de austeridade, que se tornaram fetiche em todo mundo como promessa de crescimento?

R: A receita de austeridade usada na Grécia é a mesma tentada na América Latina, na África e em alguns países da Ásia nas décadas de 1980 e 1990, e que criou desastrosos resultados econômicos. Investir em política de austeridade é contraproducente. As pessoas que defendem esse tipo de política entendem que, quando você tem uma grande dívida pública, um jeito de reduzir essa dívida é cortar os gastos do Governo a fim de reduzir o déficit fiscal. Mas um jeito melhor de reduzir o déficit é fazer a economia crescer mais rápido. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Grã-Bretanha tinha uma dívida mais de 200% de seu PIB [Produto Interno Bruto], mas sua economia estava crescendo rápido. E depois de algumas décadas, isso deixou de ser um problema. Hoje, a Inglaterra tem tentado uma política de austeridade, mais amena que a da Grécia, é verdade, mas também sem sucesso em reduzir o déficit público proporcionalmente a renda nacional. Isso porque o PIB está crescendo muito lentamente. Se você corta os gastos, seu endividamento pode ficar um pouco menor, mas a renda precisa crescer.

P: O país corre o risco de ficar estagnado?

R: Exatamente. O que é incrível é que essa política vem sendo usada várias vezes, como no Brasil nas décadas de 1980 e 1990, e nunca funcionou. Albert Einsteinfalava que a definição de loucura é fazer a mesma coisa várias vezes e esperar resultados diferentes. O problema é que muitos economistas que defendem essas medidas, quando sua teoria não funciona, culpam a realidade. Como se a teoria nunca estivesse errada.

P: Você é bastante crítico da desindustrialização dos países emergentes. Por que é tão ruim ser dependente das commodities?

R: As pessoas têm que entender como é séria a redução da indústria de transformação no Brasil. Nos anos 80 e 90, no ponto mais alto da industrialização, esse setor representou 35% da produção nacional. Hoje não é nem 12% e está caindo. O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história, em um período muito curto. O país tem que se preocupar. E eu não estou dizendo nada novo. Muitos economistas latino-americanos já levantavam o problema da dependência de commodities primárias na década de 1950 e 1960. Quando você é dependente de commodities primárias há uma tendência de que o preço dos produtos caia no longo prazo em comparação com os produtos manufaturados. Além disso, os países dependentes de commodities não conseguem controlar seu destino.

P: Por exemplo?

R: Quando alguém inventa uma alternativa para o seu produto, isso pode devastar o valor de sua economia. A indústria brasileira de borracha foi um grande hit até que os americanos e russos inventaram a borracha sintética nos anos 1930 e 1940. Quando os alemães inventaram a chamada síntese de Haber-Bosch para a produção de amônia, a ser usado na fabricação de fertilizantes, Chile e Peru, que costumavam ganhar muito dinheiro exportando o fertilizante natural guano, que foi o mais valioso fertilizante nos século XIX, tiveram anos de estagnação econômica. Isso sem contar o potencial lento de crescimento das commodities e relação a outras indústrias, como a de tecnologia.

P: Mas o caso do Brasil não seria diferente, já que o país investe em tecnologia na área agrícola, e não só extração de commodity?

R: Para ser justo, eu sei que o Brasil tem tido algum sucesso na área agrícola, como produzir soja no Cerrado, que é uma região muito árida, onde tradicionalmente esta espécie não cresceria. É realmente impressionante. Mas quando você se especializa em soja você não pode aumentar sua produtividade da mesma forma que um país especializado em alta tecnologia, que pode aumentar sua produtividade em 20%, 30% ao ano. Sinceramente, o Brasil é um dos países que parece estar voltando no tempo no seu desenvolvimento econômico.

P: Como você avalia o papel do Estado neste cenário?

R: Ao contrário de outros países em desenvolvido, o Brasil tem a habilidade de fazer as coisas acontecerem por meio da intervenção governamental. A Embraer, por exemplo, é uma empresa de economia mista. A agricultura no Cerrado é subsidiada com recursos do governo. Em vários setores, o país já mostrou que quando quer fazer uma coisa, ele consegue. Infelizmente, os responsáveis por fazerem as políticas públicas parecem que perderam o rumo. Eles basicamente desistiram do modelo de desenvolvimento econômico por meio de um upgradena economia, com investimento em indústrias de alta tecnologia.

P: Onde você acha que a política pública falhou?

R: Eu conheci vários empresários irritados em São Paulo pois as pessoas no Governo não parecem estar preocupadas com o declínio da indústria manufatureira no país. Sei que muitos economistas defendem que não importa se você está exportando soja ou aviões, desde que esteja fazendo dinheiro. E, no curto prazo, isso pode até ser verdade. Mas no longo prazo, é muito ruim para a economia. Além disso, as políticas macroeconômicas têm sido muito ruins para o setor industrial, especialmente a alta taxa de juros, uma das maiores do mundo.

P: No Governo Dilma, vários setores receberam subsídio e mesmo assim, os empresários não pareciam estar satisfeitos. O que faltou?

R: O Governo de Dilma canalizou vários subsídios em alguns setores em particular. Mas isso só foi necessário por conta da política de alta taxa de juros, uma vez que as companhias brasileiras não conseguem competir no mercado global de outra forma. Não sei todos os detalhes. Mas sei que houve erros, corrupção. As metas governamentais também foram determinadas de forma equivocada…sempre privilegiando a estabilidade macroeconômica. Já o declínio da indústria não foi considerado um problema. Focou em ações como Bolsa Família, mas sem prestar atenção em dar um upgrade na economia.

P: A Coreia do Sul pode ser considerada um exemplo de economia que conseguiu dar esse upgrade?

R: Depende de qual Coreia do Sul que estamos falando. A Coreia do Sul depois da crise asiática de 1997 abraçou o neoliberalismo, não tanto como os países da América Latina, mas desregulamentou o mercado financeiro e alavancou políticas industriais. O resultado é que uma economia que costumava crescer 6%, 7%, 8% até 1990, agora está sofrendo para crescer 3%. Isso porque as mudanças que criaram líderes globais na área industrial, automotiva e eletrônica, também produziram baixo crescimento, falta de trabalho e não impediram que estas indústrias migrassem para outros países. E mesmo assim, não tivemos o colapso industrial que se vê no Brasil.

P: Qual foi o papel da educação no crescimento da Coreia do Sul?

R: No começo, a educação teve um papel muito importante. Até os anos 80, era possível alguém de uma família pobre se tornar juiz, governador ou cirurgião. Infelizmente, a partir dos anos 90, tivemos um sobreinvestimento em educação, com o crescimento dos negócios privados. Tínhamos o maior investimento em educação do mundo. Mas hoje, considerando o valor que estamos investindo, e o tempo que os estudantes estão gastando para conseguir suas qualificações…o sistema se tornou bem ineficiente. A mobilidade social caiu muito nos últimos anos, porque as políticas educacionais deixaram de ser coordenadas com políticas industriais.

P: Você comenta que estamos entrando no fim da abordagem neoliberal ao desenvolvimento. O Brexit seria um exemplo desse começo do fim?

R: Poderia ser. Mas temos que considerar que há três tipos de pessoas que  votaram pelo Brexit. Um deles são os liberais que votaram para se livrar das regulamentações impostas pela União Europeia. Há ainda o grupo anti-estrangeiros e anti-imigração. E um terceiro grupo, os trabalhadores no Norte da Inglaterra, que já foi o centro produtor do país, e que experimentou uma desindustrialização massiva. Estas pessoas perderam seus trabalhos, e agora culpam trabalhadores da PolôniaRomênia e Hungria pela sua sorte. Podemos dizer que é o começo do fim no sentido em que isso aconteceu com a insatisfação que muitas pessoas têm com a globalização e o livre comércio.

P: Há algum lugar onde estaria sendo gestada uma solução para o modelo de desenvolvimento econômico dos países?

R: Cingapura é hoje o exemplo mais bem sucedido de um país com desenvolvimento pragmático e não ideológico. Quando lemos sobre Cingapura nos jornais The Wall Street Journal e na revista The Economist sempre ouvimos falar da política de livre comércio e o acolhimento positivo que o país tem com o investidor estrangeiro. O que é verdade. Mas não se fala que 90% das terras do país são de propriedade do Governo; 85% das casas são de propriedade do governo; e 22% do PIB é produzido por empresas públicas. Eles têm um modelo pragmático de economia, que mistura elementos do capitalismo de livre mercado e do socialismo. Eles não são capitalistas, nem socialistas. São pragmatistas. Uma de minhas frases favoritas é de Deng Xiaoping, o ex-líder Chinês: “Eu não ligo se o gato é preto ou branco, contanto que seja bom em pegar ratos”. Isso é o pragmatismo.