Durante duas décadas o Brasil sentiu na pele a ascensão de um partido de esquerda, com ideias progressistas e transformadoras, que propunha uma revolução na educação, com grandes investimentos e um projeto pedagógico moderno e transformador, na saúde a adoção de uma estratégia inclusiva e abrangente, e no campo social a construção de um Estado caracterizado efetivamente como de bem-estar para a população, um movimento crítico que unia personalidades respeitadas, este partido chegou ao poder e passou por grandes mudanças, entrando na berlinda e sendo objeto de discussões e reflexões de intelectuais nacionais e estrangeiros.
A ascensão deste partido político se deu de forma lenta mais consistente, seu charme intelectual e suas ideias inovadoras traziam alento ao país e a expectativa de que teríamos momentos melhores e, quem sabe, como no ufanismo dos anos 70, seríamos o país do futuro, o gigante dos trópicos e a nação empreendedora responsável pelo progresso e pela inclusão social, quem sabe o país que conseguiria equilibrar a equação crescimento econômico, melhorias sociais e respeito ao meio ambiente, uma situação complexa mais possível.
Ideias novas, empreendedoras, pensamentos democráticos e participativos, uma gestão caracterizada pela efetiva atuação dos cidadãos, que não mais se restringiria a simples consumidores, indivíduos dotados apenas de poder de compra, mas cidadãos com seus direitos e deveres, conscientes das necessidades da sociedade e dispostos a darem sua contribuição visando o bem-estar da coletividade. Estas visões embalaram o nascimento, o crescimento e a consolidação do Partido dos Trabalhadores (PT), e se transformaram em referência para todos os brasileiros que vêem o país como uma nação diferenciada, cujo potencial se percebe em todos os rincões do mundo, mas esta esperança que, pensávamos, venceu o medo nas eleições de 2002, infelizmente sucumbiu ao conservadorismo e se entregou abertamente aos modelos anteriores, aos vícios mais rasteiros da política brasileira, o paternalismo, o clientelismo, o fisiologismo e a corrupção, males antigos e nefastos que não cedem espaço para a modernidade e para a meritocracia.
As críticas tradicionais dos anos 80 e 90 eram maiúsculas, o diagnóstico preciso e consistente, os problemas brasileiros eram muito mais políticos do que econômico, os equívocos na lógica econômica existiam, mas seriam superados por um governo moderno e inovador que trouxesse as classes menos favorecidas para a discussão política, com melhorias na equação econômica e social, garantidas não por um Estado mínimo como o proposto pelas elites governantes da época, mas por um Estado interventor, não mais nos moldes socialista e centralizador, mas num modelo próximo do Estado de Bem-Estar Social centrado nas posições européias, mais participativo e democrático.
Todo este período nos levou a sonhar, sonho que se esvaiu em lágrimas com a Carta ao Povo Brasileiro, um documento escrito pela Executiva do partido em plena eleição presidencial de 2002, onde este, em nome da tão decantada governabilidade, abre mão de princípios defendidos durante muitos anos e se transforma em um partido da ordem, deixando enfurecidos muitos intelectuais e militantes, históricos defensores de suas ideias, além de organizações não governamentais e movimentos sociais, tais como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), um movimento nascido nos anos 80 e muito vinculado à seus ideários.
O primeiro governo do Partido dos Trabalhadores (PT) foi marcado por uma política tradicional, herdada de seu antecessor, baseada em um tripé de política econômica, câmbio flutuante, superávit primário e metas de inflação, que garante uma melhora dos indicadores econômicos, e abre novos espaços de planejamento e gestão, soma-se a isto um esforço de atração de apoio no Legislativo, esforço este nem sempre muito ético e moral, contrastante com suas proposições quando oposição.
A grande transformação do partido, muitas vezes deixadas de lado pelos analistas sociais, de um partido que no seu estatuto se caracterizava como socialista, mas que sempre apresentou um comportamento alinhado com a social democracia, mesmo não aceitando formalmente esta definição, para um partido neoliberal, ou melhor, um partido timidamente neoliberal, um movimento híbrido, que internamente adota políticas associadas ao mercado e flertando com o pensamento liberal, se caracterizando como um partido não mais da esquerda tradicional, mas um partido de centro, mesmo sabendo que todas estas definições correm o risco de caírem no vazio, pois estes termos muitos vezes perderam o sentido.
O Partido dos Trabalhadores caiu no canto da sereia ao aderir ao pensamento neoliberal, sua política conservadora foi muito bem aceita pelos integrantes da ordem, os empresários, banqueiros e os setores que vivem de renda estão muito satisfeitos com a condução da economia, seus lucros com a dívida pública crescem de forma exponencial, alegrando setores fortes da sociedade, mas estes, mesmo assim, desconfiam dos pensamentos esquerdistas do partido, sabem de seus arroubos dos anos de oposição e temem uma recaída.
A oposição se degrada todos os dias, a lógica maquiavélica do governo, especialista em publicidade e propaganda, incutiu na mente da população que todos os avanços recentes do país foram obras do governo Lula, este sim o grande responsável pela melhora das condições de vida da população, não concedendo méritos aos outros governos, explora bem a pouca consciência política do povo e usa argumentos falaciosos para manter seu controle e hegemonia política, enquanto isso, a oposição perplexa e incompetente se desintegra, luta por espaço na sociedade, mas deixa de defender suas obras e seus pensamentos, vivemos um período interessante, onde um partido se apropria de ideias de outro, que no período de oposição abominou de forma veemente, governa e obtém um sucesso considerável, gerando uma situação inusitada e rica em estudo e reflexão, um digno exemplo das teorias e do pensamento do florentino Nicolau Maquiavel.
Na oposição, o Partido dos trabalhadores (PT) se caracterizou pela crítica constante, tudo era motivo de crítica e alarde, crítica ao Plano Real, critica à privatização, crítica ao PROER, crítica à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), críticas e mais crítica, chegando ao paroxismo de entrar com um processo no Supremo Tribunal Federal contra o Plano Real, este o grande responsável pelo início das transformações da sociedade brasileira, ou se esquecem dos males que a inflação faz a uma economia, foi esta estabilidade que propiciou o surgimento de novas oportunidades para o país e boas perspectivas para a população brasileira.
Nos últimos 15 anos, o Brasil se transformou muito, estas mudanças não devem ser creditadas a nenhum governo em particular, cada um dos governantes que se alternaram neste período foram responsáveis por avanços consideráveis, primeiro a estabilidade da economia e a melhora no cenário macroeconômico, depois os investimentos maciços no social, transformando este em um compromisso efetivo do governo para com a sociedade e, agora temos como grande desafio consolidar todos estes avanços e dar condições para que a população consiga se capacitar e preparar para um mundo cada vez mais concorrência e competitivo, e este compromisso só se efetiva com fortes e intensos investimentos em educação e qualificação do capital humano, deixando para trás um país de sonhos e transformando o Brasil em uma realidade para a sociedade mundial.