Efeitos dos eventos climáticos nas grandes cidades, por Carlos Nobre.

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Ilhas de calor urbanas podem ampliar em até 10°C a temperatura nessas áreas

Carlos Nobre, Climatologista, é pesquisador sênior pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP e copresidente do Painel Científico para a Amazônia; foi eleito em maio de 2022 membro estrangeiro da Royal Society

Folha de São Paulo, 19/11/2024

As cidades brasileiras são resilientes aos eventos climáticos extremos? Os eventos extremos tropicais são cada vez mais frequentes e trazem às cidades distúrbios diversos, como chuvas excessivas, alagamentos, rajadas de vento, raios e ondas de calor, com forte impacto nas pessoas e na economia local. Uma realidade que exige adaptações das cidades, especialmente nas áreas urbanas e superpopulosas, onde os eventos vêm causando grandes desastres.

A Organização Meteorológica Mundial mostra que desastres naturais nos últimos 50 anos somaram 11 mil eventos, somando US$ 3,5 trilhões de prejuízo e 91% da mortalidade nos países em desenvolvimento. Entre outras características, a resiliência climática de uma cidade pode ser enquadrada como a quebra dos seus serviços de segurança hídrica e de regulação térmica.

A ilha de calor urbana é um fenômeno notado globalmente, com ampliação de temperatura nas áreas urbanizadas em escalas de até 10ºC, com maior ênfase nas grandes cidades. Municípios como São Paulo, superpopulosos, absorvem energia radiativa atmosférica muito superior à de áreas com vegetação.

Os fatores urbanísticos que mais reduzem as mortes e doenças decorrentes do calor urbano excessivo são a utilização de ar refrigerado e pronunciada vegetação próxima às habitações. Porém, essas condições não prevalecem em cidades como São Paulo, que está dominantemente coberta por edifícios e asfalto, com pouca vegetação e utilização de ar condicionado restrita às classes de maior renda.

As condições de eventos climáticos extremos são chuvas prolongadas ou tempestades intensas associadas com fortes rajadas de vento e descargas elétricas. Essas tempestades, que em São Paulo geram 700 mil raios por ano, são justamente estimuladas nas áreas urbanizadas devido ao aquecimento local, e respondem por 80% dos danos à rede de eletricidade.

As estatísticas dos extremos climáticos nas cidades só crescem e o risco tende a ser agravado no futuro. Isso por conta do crescente aumento da população nas áreas urbanas, do aumento da probabilidade de ocorrências, e da maior vulnerabilidade da população, seja pelo seu envelhecimento ou pelo adensamento populacional crescente em regiões de baixa renda.

Cidades consideradas resilientes são pouco penalizadas pelos grandes distúrbios atmosféricos porque, ao terem clareza de seus impactos, se preparam para enfrentá-los. No Brasil, ainda não dispomos desse preparo, que depende de soluções que envolvem planejamento urbano de médio e longo prazos de caráter sustentável, como as interferências de infraestrutura verde, que possam reter mais a água em áreas verdes, sejam elas públicas, privadas ou vegetação viária.

Essas interferências associadas ao incremento e adensamento da vegetação têm efeito na redução da temperatura e, por consequência, na redução de eventos extremos.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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