Educação, doutores e as novas perspectivas?

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A educação é a chave para o sucesso do século XXI, o conhecimento é o ativo intangível mais importante da atualidade, treinar, qualificar e capacitar o cidadão é um dos grandes desafios das sociedades contemporâneas, a união entre partidos políticos, trabalhadores, empresários e governo em prol da educação e da melhoria das condições de vida dos indivíduos é fundamental.

O Brasil neste quesito se encontra muito atrasado, mesmo o avanço dos últimos quinze anos se mostraram insuficientes para vencer este desafio, na última década a taxa de escolarização líquida do ensino superior (jovens entre 18 e 24 anos matriculados em instituições de 3° grau) mais que dobrou, aproximando-se dos 15%, mesmo assim, o país está longe de outras nações. Outro dado que nos leva a reflexão, se olharmos para a taxa de alfabetização bruta, que relaciona o total de matrículas num dado nível de ensino com a população na faixa etária adequada a esse nível, o Brasil com 30% de escolarização no terceiro grau, a Bolívia com 38,3%, o Chile com 52,1% e os Estados Unidos com 81,6%, ou seja, estamos bastante defasados, mesmo quando nos comparamos com países próximos do nosso, muito mais pobres e donos de uma economia marcada por grandes limitações.

Neste quadro desolador encontramos candidatos de todos as matizes ideológicas, classes sociais e comportamentos se alternando no horário eleitoral supostamente gratuito, todos democratas e defensores da educação, da saúde e do meio ambiente, donos de uma oratória brilhante e, muitas vezes, de um comportamento horripilante. Será realmente que a educação é uma prioridade neste país? Será que estamos à altura dos desafios do mundo contemporâneo?

A função do professor nesta sociedade está em constante transformação, de donos do conhecimento, respeitados e admirados, donos de um status social agora estão em crise, vivem marcados pela instabilidade, pelo medo e certos de que uma depressão é apenas uma questão de tempo. Deste profissional exige-se um papel de protagonista, formadores de massa crítica, mas que tipo de massa crítica o capitalismo e a sociedade aceitam com naturalidade? Se exigirem muito dos alunos terá uma grande decepção, a progressão continuada, criada por governos subservientes que pensam em quantidade e se esquecem da qualidade, foi um grande retrocesso, exigir mais dos alunos obrigará a reprovar muitos alunos, deixando como marca em suas “cadernetas” uma grande hemorragia, marcada por sangue, destruição e sofrimento.

Os profissionais da educação estão sendo estimulados a se capacitar, e essa capacitação é uma forma de melhorar as aulas, agregar mais conhecimento, dinamizar as aulas, esta é a justificativa para tal qualificação, aos que se qualificam, estudam, se diplomam e se tornam mestres e doutores as dificuldades não são menores, recentemente uma instituição nacional privada demitiu uma grande quantidade de doutores, isto porque estes profissionais, mais qualificados custam mais para estas empresas travestidas em universidades, empresas estas que tem nos custos seu grande parâmetro de sobrevivência, onde a educação é apenas o chamariz, são fábricas produtoras de diploma, o aluno entre em um grande consórcio e será, com certeza, contemplado em 48 meses, dependências e adaptações são resolvidas pelo ensino on-line, uma novidade trazida pela tecnologia, onde o alunos estuda em casa sem sair de casa, uma inovação para o século XXI.

Para este tipo de instituição não é necessário a presença de doutores, especialistas e graduados fazem um trabalho qualificado, instruem os alunos para o mercado de trabalho, dando ao vulgo cliente o produto que este deseja, os custos dos doutores são facilmente dispensados, uma ótima idéia para estas empresas que vêem a educação apenas como um cifrão.

Os ideais de autonomia pensados e estruturados pelo brilhante educador brasileiro Paulo Freire estão mortos, os idéias que sobreviveram foram os do mercado, da concorrência, da competição, onde os mais fortes sobrevivem e os mais frágeis ou se adaptam a nova sociedade ou são destruídos pelo modelo, um verdadeiro darwinismo social estimulado pelo próprio governo.

O Estado, responsável pelas grandes
universidades brasileiras, se omite desta discussão, é incapaz de fiscalizar estas empresas que são, na verdade, concessões públicas, e mais, estimula uma canibalização do ensino superior, estimula um bônus salarial para que os professores ganhem mais, mas seus critérios se tornam cada vez mais absurdos, irreais e escandalosos, são tantas as exigências que parece que os alunos chegam ao ensino superior com uma formação impecável, dotados de conhecimentos complexos, conhecedores da língua portuguesa e sabedores da interdisciplinaridade, isto sem falar do comportamento em sala e o respeito aos professores e funcionários da instituição.

A atuação estatal na educação é uma grande exigência, as melhores universidades brasileiras são públicas, mas em termos internacionais estão mal colocadas, segundo uma pesquisa divulgada recentemente pela Times Higher Education onde se organizou um ranking das 250 maiores universidades do mundo, nesta pesquisa a Universidade de São Paulo (USP) está em 232° e a Universidade de Campinas (Unicamp) está em 248°, estas são as únicas instituições brasileiras que aparecem na pesquisa. Se as melhores universidades brasileiras estão no final da fila das maiores e melhores do mundo, imaginem qual seria a colocação destas milhares de instituições privadas descomprometidas com o ensino e que poderiam facilmente ser classificadas como verdadeiros caça-níqueis, indústrias produtoras de diplomas em série.

Os professores doutores são fundamentais para a educação brasileira, esta massa crítica que pesquisa, levanta informações, compila dados, escrever livros, artigos e revistas, além de organizar teorias precisam ser mais valorizados, sua respeitabilidade social precisa ser reconstruída, os especialistas devem ser estimulados a buscarem cursos de pós-graduação, não dá mais para que estes profissionais dominem o ensino superior privado nacional, as exigências de titulação devem ser maiores, mas os professores doutores devem ser remunerados a contento, muitos se capacitaram e ainda não foram reconhecidos pelas instituições onde trabalham, mas o reconhecimento deve ser feito não apenas com remuneração, mas com melhores condições de trabalho, não adianta melhorar os salários e aumentar demasiadamente a carga de trabalho em atividades burocráticas que servem para economizar profissionais de outras áreas, o incremento de trabalho impede uma leitura maior, uma atualização melhor dos conteúdos e uma melhor qualificação deste profissional, que devem ser estimulados a pesquisar e a produzir conhecimentos, visando melhorar as condições sócio-econômicas da coletividade.

Escolher uma profissão é um passo fundamental na vida de uma pessoa, optar pela docência é se aprofundar nos estudos e nas pesquisas, conhecer autores das mais variadas áreas e pensamentos, um professor não pode conhecer apenas uma área do conhecimento, o professor é um agente do conhecimento, que lida com a informação, com o pensar e o refletir, sua importância social é imensa, antigamente os professores das escolas públicas eram mais qualificados, trabalhavam com satisfação, orgulho e dedicação, uma grande maioria dos profissionais era oriunda da classe média, possuíam uma formação cultural forte, escolheram a profissão por amar o conhecimento e assumiram um papel ativo no processo de ensino e aprendizagem, agora, na atualidade os professores da rede pública são oriundos de famílias carentes, com formação cultural precária, pobres intelectualmente e detentores de uma carga de leitura reduzida e superficial, muitos se desdobram para melhorar seus conhecimentos enquanto outros se escondem através do cargo e da profissão e se acomodam, afinal conseguiram algo que seus pais e familiares nem imaginaram conquistar, mas mesmo assim é pouco, demasiadamente pouco para um país que sonha em ocupar um destaque no cenário internacional, educação é coisa séria, chega de amadores e iniciantes.

Manter profissionais de qualidade é fundamental para melhorar o ensino superior brasileiro, neste momento de crescimento econômico acelerado o setor produtivo demanda uma ampla gama de trabalhadores qualificados para as mais diversas áreas de atuação, mas estes profissionais não existem e os que encontramos no mercado, na sua maioria, são incapazes de exercer funções mais qualificadas, isto porque a escola e a universidade não foram capazes de formar uma massa crítica e capacitada para enfrentar este mundo maluco, marcado pelas instabilidades e pela incerteza e, com isso, condenamos o crescimento econômico que pretendíamos que fosse duradouro em mais um espasmo de crescimento.

No mundo da terceira revolução industrial onde a tecnologia ganha espaço e transforma a sociedade, os professores são atores fundamentais, valorizá-los e incentivá-los é uma forma de aproveitar espaços e transformar desafios em oportunidades crescentes, se para muitos educação é algo caro e dispendioso imaginem o custo da ignorância.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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