E a guerra Brasil? por Preto Zezé

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As favelas brasileiras são a nossa Ucrânia, bombardeada de exclusão, ausência social do poder público e regulada pela força das armas

Preto Zezé, Presidente nacional da Cufa, fundador do Laboratório de Inovação Social e membro da Frente Nacional Antirracista

Folha de São Paulo, 01/03/2022

Os olhos do mundo estão voltados para o conflito Rússia e Ucrânia, as avaliações são as mais diversas sobre os impactos dessa crise, as opiniões se dividem e sobra responsa para tudo que é lado. E, como toda guerra, o povo é que sofre. Os senhores da guerra, não!

O que me chamou a atenção, foi que, por um momento, parece que os problemas da guerra brasileira desapareceram diante de tanta informação e desinformação sobre o tema, gente que nem sabe para que lado fica a Rússia dando todo tipo de palpite.

E a “guerra” chamada Brasil?

20 milhões de pessoas ainda passam fome e uma grande parte come mal, bem mal. O desemprego ainda está altíssimo, na base da pirâmide o trabalho informal tem sido a única saída, e, mesmo assim, com todas as dificuldades que a situação impõe, sem crédito, muitos com nome negativados têm dificuldades de reativar seus negócios ou retomar suas atividades.

Em muitos territórios a presença das políticas públicas é cada vez menor, no entanto, está cada maior a regulação da vida social por grupos armados de toda a origem e interesses de dentro e de fora das favelas e periferias do Brasil.

A violência em todas as esferas explodindo, e produzindo medo, e o medo produz mais sentimento de justiça com as próprias mãos e, nesse sentido, habitam os falsos heróis de plantão e os mágicos de saídas fáceis que falam o que o desespero popular quer ouvir.

Pelas ruas do país são milhares de pessoas em situação de rua, e não somente nas datas de Natal e Dia da Criança, mas todos os dias, são exiladas de direitos básicos dentro da sua própria pátria. São migrantes de vários lugares que vagam sem rumo em busca de vida digna.

As cidades que foram e ainda estão sendo atingidas pelas fortes chuvas, resultado das mudanças climáticas, saíram da mídia, mas continuam milhares de homens e mulheres sem casa, sem sonho, sem perspectiva, pois a luta de uma vida inteira foi literalmente por água abaixo.

As pessoas que estão com sequelas da Covid estão sem amparo específico, não conseguem emprego nem atendimento especializado, provando que a vida sempre tem que ser a prioridade, pois pessoas doentes e frágeis não geram economia.

Toda a solidariedade ao povo que vive o terror das guerras, resultado de interesses das grandes potências mundiais, que estão preocupadas em poder e números na nova geopolítica mundial.

Vidas são apenas detalhes. E a nossa “guerra” diária desse front chamado Brasil precisa ser enfrentada.
As favelas brasileiras são a nossa Ucrânia, bombardeada de exclusão, ausência social do poder público e regulada pela força das armas.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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