Capitalismo, conscientização social e os novos valores humanos

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A sociedade está passando por momentos de grandes transformações sociais, econômicas, políticas e culturais cujos impactos sobre os indivíduos são difícil de mensurar, alguns se debruçam sobre os novos modelos sociais que estão chegando no mundo contemporâneo, gerando constrangimentos, medos e desesperanças crescentes e, ao mesmo tempo, novas oportunidades, novos desafios e novos espaços de empreendedorismo, neste momento de dúvidas e preocupações, novas perspectivas surgem para os indivíduos.

Neste momento de pandemia, os indivíduos estão percebendo que novas construções estão surgindo, alterando modelos constituídos anteriormente e criando novos espaços em construção, com novos desafios, símbolos e características próprias. Nos novos modelos sociais nascentes não conseguimos visualizar e compreender todas as características desta nova sociedade. Algumas características são claras e outras ainda estão obscuras e nebulosas, destas novas perspectivas sociais e culturais da sociedade contemporânea percebemos claramente o crescimento do individualismo, o crescimento da competição, o aumento da concorrência, a busca pelas imagens, pela performance, pelo incremento do empreendedorismo e pela busca crescente do isolamento social,  das transformações dos modelos anteriores de trabalho e sociabilidade, famílias e convivências sociais, caminhando rapidamente para uma construção caracterizado pelo imediatismo, centrados na flexibilidade, das inseguranças, das instabilidades, como se o mundo contemporânea se tornasse um grande cassino, cujos os templos são convertidos em grandes bancos e corretoras globais, os verdadeiros donos do poder da sociedade internacional.

Nesta nova sociedade, como destacou o grande sociólogo Zygmunt Bauman, estamos vivendo uma sociedade marcada pela instabilidade e a insegurança é a tônica da nova sociedade, onde as riquezas crescem de forma acelerada, criando novos espaços de entesouramento sensacionais e, ao mesmo tempo, conduz os indivíduos, rapidamente, a ruína econômica, a falência produtiva e a perda dos sentidos sociais, devastando as reputações, fragilizando os sentimentos centrados em valores éticos e morais.

O referido sociólogo destaca que vivemos em momentos de grandes instabilidades, os valores são flexíveis, os sentimentos morais e éticos são conduzidos de acordo com interesses mercantis, tudo é possível desde que se consiga pagar por seus interesses, perdemos os sentidos mais consistentes e dos valores dos indivíduos, se afastando dos valores coletivos, incentivamos o individualismo e acreditamos que ao estimular o egoísmo e a competição, vamos construir uma sociedade mais decente marcada pelas oportunidades para todos os cidadãos, desta forma estamos nos aproximando de valores bárbaros, marcados pelo culto da morte, da degradação e da falência moral.

Nesta sociedade, os indivíduos se afastam dos relacionamentos amorosos, os namoros estão sendo deixados de lado, as pessoas querem apenas se relacionar sexualmente, sem proximidade, sem envolvimento, querem prazer imediato, gozos sem preocupações, sem convivências afetivas e construções mais consistentes, querem prazer sem ligações maiores, com isso, as famílias estão sendo transformadas, os filhos são postergados, os relacionamentos são frios, os valores são imediatos e a solidão crassa nesta sociedade, os transtornos emocionais e sentimentais crescem de forma acelerada, as depressões crescem e os suicídios aumentam, transformando o suicídio em um problema social, um verdadeiro problema de saúde pública, que leva os gestores públicos passam a investir em conscientização dos cidadãos, aumentando os dispêndios de recursos em um orçamento cada vez mais reduzidos.

As redes sociais passam a contribuir crescentemente a degradação social, como nos disse Umberto Eco, o surgimento de redes sociais deu voz aos idiotas, mostrando os vícios sociais, os medos e misérias dos seres humanos. Nestes novos modelos de comunicação social, os indivíduos postam imagens, fazem comentários de assuntos, analisem perfis variados, julgam atitudes, criticam e comentam sobre as vidas alheias, criando um verdadeiro espaço de julgamento social, um verdadeiro tribunal onde todos se sentem em condições de emitir seus julgamentos, destruindo reputações, matando a ética e degradando os valores mais consistentes. Nesta sociedade, as pessoas são julgadas pelas curtidas, os compartilhamentos e seus seguidores, quanto maior os números de seguidores melhor no mundo das redes sociais.  Zygmunt Bauman destaca, que nesta sociedade das redes sociais, as pessoas percebem tristemente que as amizades, os seguidores e os compartilhamentos não são amigos verdadeiros, indivíduos sem afetos, sem proximidades e sem consistências, uma verdadeira sociedade líquida.

A nova sociedade se característica por novas estruturas sociais, novas configurações familiares, nossos relacionamentos afetivos, nossas proximidades cotidianas, tudo está se tornando mais distantes, sem proximidades, sem afetividades e sempre centradas nos valores monetários e financeiros, sem estas argamassas da sociedade contemporânea, marcadas pelos recursos materiais, estas relações sociais dissipam, as pessoas se afastam e a solidão cresce de forma acelerada. Os valores do capitalismo contemporâneo estão entrando nas mentes dos indivíduos de forma acelerada, transformando as pessoas, alterando seus sentimentos mais íntimos, incrementando as desesperanças e gerando novos transtornos, novos vícios, novas doenças emocionais e afetivas.

No mundo contemporâneo, marcados pelo conhecimento, pelos valores das pesquisas científicas, os valores do capital estão devastando os valores da ciência, os recursos monetários estão definindo as pesquisas, financiando as novas tecnologias com interesses imediatistas e sem contrapartidas sociais para a coletividade. Desta forma, percebendo que as novas tecnologias, os novos produtos, as novas máquinas e as novas descobertas, que servem para aumentar as riquezas de uma pequena parte da sociedade e delegando uma pobreza crescente para uma grande parte da sociedade mundial. Nos anos de 2018, os dados trazidos pelo Oxfam foram assustadores, neste ano, 82% das riquezas mundiais se concentraram em apenas com 1% da população global, algo em torno de 70 milhões de pessoas da sociedade mundial, enquanto os 99% da população global, algo em torno de 6,92 bilhões de pessoas, angariou apenas 18% da riqueza da sociedade internacional.

Os grandes conglomerados da educação, verdadeiros instituições dotadas de somas altíssimas de recursos financeiros, recursos pulverizados em milhares de acionistas das mais variadas regiões do mundo, indivíduos que desconhecem onde seus recursos estão sendo investidos, apenas aguardam seus dividendos e lucros polpudos, sem compromissos com o setor educacional, sem compromisso com os interesses sociais, apenas se interessam com os valores milionários que incrementam suas fortunas pessoais e garantiram a bonança de seus familiares que vivem como verdadeiros sultões, vivendo muito bem, gozam de privilégios que os capitais podem garantir e sem preocupações com os rumos da sociedade, sem os verdadeiros valores sociais que consolidam a existência de uma verdadeira nação.

Nestes novos mercados da educação, percebemos que os diplomas se transformaram em verdadeiros caçam níqueis, cursos de graduação se difundiram por todos os estados, aumentando os graduandos de todas as áreas, desde os cursos tradicionais como os de engenharia, direito, medicina, administração e da pedagogia, além de novos cursos da área da saúde e da tecnologia, aumentando a competição destes novos profissionais em busca de novos modelos de trabalho que estão desaparecendo de forma acelerada, gerando desesperanças, medos crescentes e depressões aviltantes. Nestas verdadeiras empresas educacionais, transnacionais do ensino, percebemos que os professores mais capacitados são perdendo espaço, servem apenas para construir as apostilas e os métodos pedagógicos e, posteriormente, são afastados e substituídos por outros profissionais sem qualificação, sem capacitação, recebendo salários reduzidos, sem perspectivas e se sujeitam a este modelo de trabalho e exploração.

Com o surgimento de ensino a distância, os grandes conglomerados ganham espaço, aumentando seu portfólio de novos cursos e novas plataformas, cobrando valores reduzidos, sem qualificação e se especializam em grupos sociais menos abastados, estudantes que possuem recursos limitados, sem formação consistente e sem compreender a importância do ensino de qualidade, pagam com dificuldades pelos diplomas banais para garantir algum aumento salarial num verdadeiro acordo, onde todos os envolvidos se enganam claramente, as escolas vendem diplomas, os governos não interferem neste mercado e os estudantes acreditam que seu diploma garantirá retornos consideráveis, ledo engano, com estes cursos existentes na sociedade servem apenas para perpetuar sua condição indignidade e de exploração social.

O que acontece no mercado educacional, percebemos em todas as áreas, na saúde também se ressente de projetos consistentes, os hospitais se transformaram em grandes conglomerados econômicos, se utilizam da saúde como slogan charmoso e elegante, marcados por profissionais bem vestidos de ternos bem cortados, falam da qualidade e da eficiência, propagandeando os valores sociais e de humanidade, mas infelizmente, são motivados por interesses imediatistas marcados pelos valores do capital e da acumulação, marcados pelos sentimentos da frieza, pela insensibilidade e pelo imediatismo. Nesta sociedade, marcada pela financiarização, os grandes grupos econômicos que garantiram recursos orçamentários do fundo público, seus subsídios e suas isenções monetárias crescentes e, como tacada final, aumentam os ataques ao sistema social de saúde, abrem guerras ao Sistema Social de Saúde (SUS), degradam as instalações e objetiva diminuir os investimentos na área e posteriormente, comprar seus hospitais, seus laboratórios, seu expertise e garantirem os polpudos investidores na saúde nacional. Na sociedade percebemos uma verdadeira guerra contra o fundo público, uma busca constante para transferir novas instalações para as instituições privadas, aumentando os ganhos monetários de grandes grupos econômicos nacionais e internacionais.

Neste ambiente, marcados pela busca da privatização dos ativos do Estado, muitos grupos sociais abraçam a venda das estruturas estatais e a alienação dos setores públicos como se resolvessem as contradições da sociedade e abrisse espaços para o crescimento e para o desenvolvimento das nações em desenvolvimento. Nesta campanha pública da desestatização de empresas estatais, muitos grupos sociais defendem bandeiras que, num próximo momento, sentirá os custos da venda dos patrimônios públicos, dentre elas, destacamos a classe média, que nos últimos anos vem perdendo espaço na estrutura social, como destaca Christophe Guilluy na obra O fim da classe média. Na sociedade, percebemos, os integrantes destes grupos sociais defendem a desestatização dos serviços públicos, acreditando que, com isso, estes novos serviços garantirão mais eficiência e incrementando a eficácia, ledo engano. Esta crise da sociedade contemporânea se encontra em momentos de grandes instabilidades e incertezas, momento marcado por períodos de grandes inquietações, grande parte da classe média da sociedade contemporânea tende a perder o status acumulado nos anos séculos, reduzindo a importância social, garantindo empregos precários marcados por salários menores, degradados e explorações crescentes, neste ambiente, num futuro próximo seus integrantes devem se candidatar a serviços que eram servidos por agentes públicos mas na atualidade, são ofertados pelas organizações privadas, agora mais degradados, caros e marcados pela desesperança, neste momento percebemos que a classe média, marcada pelo grande capacidade intelectual e moral, percebem como foi usada pelos grupos mais abastados e sem compromissos sociais.

Na pandemia percebemos novas perspectivas na sociedade, neste momento de intranquilidades e desesperanças motivadas pela virulência da pandemia, a necessidade dos investimentos governamentais aumentou de forma acelerada, obrigando muitos grupos econômicos e políticos a rever novos pensamentos, obrigando-os a reconstruir novos espaços de sociabilidade e solidariedade, diante disso, nestes momentos de instabilidades gerados pela pandemia que afetou toda a sociedade internacional, os indivíduos deveriam transformar este momento de novos espaços de reflexão e de reconstrução da coletividade em bases mais sólidas e consistentes, abrindo a coletividade para novos horizontes de crescimento e de desenvolvimento econômico, com mais igualdade, liberdade e fraternidade.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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