País tem 23% das reservas globais, mas só 1% da demanda; tensão entre China e EUA é oportunidade
Ronaldo Lemos, Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro
Folha de São Paulo, 21/04/2025
Em um dos períodos em que estive na China, a tensão com os EUA estava acirrada. O presidente chinês fez um pronunciamento que parecia destinado a acalmar os ânimos, mas não disse uma palavra sobre a crise. O recado foi passado de outro jeito: o lugar do discurso, proferido diretamente de uma das principais minas de terras raras da China, em Ganzhou.
A mensagem era sutil, mas clara: se a tensão aumentasse, a China poderia restringir o acesso às suas terras raras, essenciais para a produção tecnológica.
A China impôs restrições à exportação para os EUA de sete terras raras que são usadas para fabricar de celulares a mísseis. Além disso, impôs restrições às exportações de antimônio, gálio, germânio, tungstênio e outros minerais que possuem aplicação militar.
A China responde por cerca de 70% da produção global de terras raras. Os Estados Unidos aparecem em sendo lugar , com cerca de 14%. As terras raras compreendem 17 elementos, dentre eles: o ítrio (usado na indústria espacial, semicondutores e equipamentos de raio-x), samário (reatores nucleares e lasers) e gadolínio (chips de memória e equipamentos de ressonância magnética).
Hoje os EUA importam 75% das terras raras consumidas no país. A China não baniu totalmente as exportações, mas restringiu justamente os elementos que os EUA não produzem internamente.
Sem acesso a eles, as consequências podem ser temerárias. A fabricação de chips, carros, TVs, celulares, equipamentos médico e militar pode ser severamente afetada. Por exemplo, caças americanos dependem diretamente de térbio e disprósio, dois dos elementos colocados na lista de restrições da China.
Nessa situação, o que fazer? O primeiro passo é ampliar compras de outros países e incentivar o desenvolvimento da mineração de terras raras fora da China. Isso pode ser benéfico para o Brasil, que possui reservas de disprósio, térbio e ítrio, dentre outras terras raras. Cidades como as goianas Minaçu e Catalão ou as mineiras Poços de Caldas e Araxá possuem reservas significativas desses elementos raros.
A outra solução é o contrabando. Da mesma forma como chips da Nvidia entraram na China mesmo com o bloqueio dos EUA, é de se esperar que algo parecido aconteça cada vez mais com terras raras.
O ponto-chave é que a dominância chinesa não é natural. É produto da visão de longo prazo do ex-presidente Deng Xiaoping, que nos anos 1980 investiu fortemente nesse setor e proferiu a famosa frase: “o Oriente Médio tem petróleo, o Império do Meio tem terras raras”, repetida à exaustão nos documentos estratégicos do país. E, de fato, até 1990 os EUA lideravam sem concorrentes a produção de terras raras.
Tudo isso para dizer: o Brasil precisa articular seu pensamento estratégico sobre terras raras de forma ousada e com visão no longo prazo, como a China fez. Temos 23% das reservas globais, mas atendemos só 1% da demanda. Nosso país também pode fazer parte desse clube. Não dependemos de ninguém para entrar nele além de nós mesmos.
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