As ilusões do conhecimento e os medos do mundo contemporâneo

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Vivemos em uma sociedade marcada pelo crescimento das informações e do conhecimento, nunca na história da sociedade mundial as informações circularam com tanta intensidade, nesta sociedade, percebemos um excesso de publicações de todas as áreas e setores, levando conhecimento para todas os rincões do mundo, alterando hábitos, comportamentos e consumos, gerando caos e revoluções e obrigando os indivíduos a se reinventarem, além de serem mais flexíveis, dinâmicos e interessados no conhecimento.

Nesta sociedade, ninguém pode mais alegar ignorância, os conhecimentos estão disponíveis para todos os indivíduos, basta se interessar e buscar através de pesquisas e investigações variadas, o senhor Google revolucionou os trabalhos científicos, com apenas um clique temos acesso a informações e conhecimentos variados e de todas as áreas, nesta sociedade as informações sobre a matéria e sobre o espírito circulam rapidamente, ninguém mais deve se esconder, as informações circulam e são acessíveis a todos.

A Doutrina dos Espíritos sempre se destacou pelo seu estímulo ao conhecimento, o espiritismo era visto na sociedade como a doutrina do livro, denominação esta conseguida através de uma grande infinidade de livros publicados, somente o médium Francisco Cândido Xavier foi responsável pela publicação de mais de quatrocentos e cinquenta livros, desde romances, dissertações, contos e poesias, retratando o mundo além morte e as realidades da vida que, muitas vezes, eram encobertas pelas visões materialistas.

O conhecimento deve ser visto como uma grande benção, um verdadeiro presente dado por Deus para que entendamos as realidades da vida, todos sabemos que nossa passagem pela matéria um dia chegará a um fim, este fim é certo para todos os indivíduos, embora a data correta ainda seja incerta. A Doutrina Espírita nos traz uma ampla bagagem de conhecimentos para que entendamos que somos dotados de uma única vida e inúmeras existências, que se sobrepõem com o intuito máximo de nos desenvolver e abrir caminho para nossa evolução enquanto espírito.

Sabemos ainda, que desta vida pouco levaremos, não nos importa os carros e os bens adquiridos, as propriedades e os recursos amoedados, todos estes nos geram muito mais desequilíbrios do que nos auxilia no crescimento espiritual. Levamos desta oportunidade na matéria as vivências, os amores e os sentimentos nobres que adquirimos e mais, levamos desta vida também, todos os conhecimentos que adquirimos, estes estão inscritos dentro do espírito de cada ser humano e auxiliam em nosso desenvolvimento.

Embora estejamos em um mundo marcado pela competição, onde a tecnologia e o conhecimento ganham relevância dentro da sociedade, onde os estudos, as leituras e as conversas edificantes se transformaram em um diferencial importante para o acalanto do nosso espírito, estamos tão centrados em disputas e trabalhos materializados, que nos esquecemos da importância e da centralidade destes momentos de reflexão.

A literatura espírita nos esclarece de muitas questões fundamentais para os indivíduos, nos mostra as raízes de nossas existências, as causas de nossas aflições, de nossos dramas mais íntimos e nos mostram os caminhos e os passos que devemos seguir, servindo para os indivíduos como um verdadeiro manual de sobrevivência neste mundo marcado pela turbulência, pelos desequilíbrios e pelos instrumentos de evolução.

O codificador da Doutrina dos Espíritos, Hippolyte Leon Denizard Rivail, cujo pseudônimo utilizado foi Allan Kardec, este escolhido por ter sido seu nome quando estava encarnado como um druída, nas Gálias. Kardec foi um grande educador, de homem e de almas, suas pesquisas e sensibilidades o levaram ao conhecimento dos espíritos, suas dúvidas lhe trouxeram espaços sólidos de reflexões e de questionamentos e sua confiança em uma inteligência suprema lhe asseguraram os recursos necessários para a compreensão de que a vida não se extingue na matéria, muito pelo contrário, a matéria é apenas mais uma etapa do processo evolutivo dos seres humanos.

Mesmo sendo caracterizado por uma invulgar inteligência, Allan Kardec se notabilizou porque, em todas as suas conversas com os espíritos, suas reflexões não aceitavam respostas limitadas, seu amor pelo conhecimento e sua firmeza de caráter fizeram dele uma pessoa que colocava a ciência e o conhecimento críticos no centro de suas observações, encontramos em seus escritos orientações importantes, dentre elas, destacamos que se a ciência lhe disser algo e o espiritismo lhe disser algo diferente, siga pelos caminhos ditados pela ciência.

            Nesta passagem, o codificador nos mostra sua humildade, acreditando e defendendo a importância da Ciência como instrumento de desenvolvimento social e consolidação moral, seus escritos estariam sempre atrelados ao conhecimento científico, suas descobertas deviam sempre passar pelo crivo da razão e seus estudiosos deveriam sempre deixar de lado o culto a pessoas e personalidades, abrindo um canal de ligação entre o pensamento crítico e o espiritismo, fazendo com que estes caminhassem juntos, lado a lado.

            Na sociedade contemporânea a Ciência apresenta uma centralidade jamais vista, se analisarmos a história da humanidade, vamos perceber que nunca anteriormente a Ciência foi tão poderosa, em momentos anteriores, a religião era o grande contraponto da ciência e do pensamento científico. No século XXI a religião perdeu espaço considerável e a ciência ganhou relevância e uma importância central, materializada nas grandes descobertas científica, desde inovações que mudaram a vida dos indivíduos até mercadorias que revolucionaram o comportamento dos indivíduos.

O conhecimento deve ser visto pela coletividade como algo que nos liberta de séculos ou milênios de ignorância acumuladas, este conhecimento deve nos transformar para melhor, contribuir na educação moral e no desenvolvimento espiritual, somente desta forma devemos encarar o estudo e a reflexão, como algo transformador e edificante. Muitas pessoas se utilizam deste conhecimento apenas para as benesses individuais, usam as informações para ganhos econômicos e financeiros e deixam de lado o papel social e de transformação do conhecimento, como nos ensina a Doutrina dos Espíritos.

Como nos mostrou Francisco Cândido Xavier, o maior médium brasileiro, senão mundial, de todos os tempos, dotado de todos os tipos de mediunidade, em sua passagem pelo mundo material, quem sabe pode muito, mas quem ama pode mais. Nestas palavras sublimes, nosso amigo nos mostra que conhecimento sem amor não nos auxilia no processo de evolução espiritual, o amor é a base das relações dos seres humanos e deve ser colocado na frente de nossas atitudes e comportamentos, o conhecimento sem amor pode levar os indivíduos a cultivar a vaidade e o personalismo, doenças que tem levado muitas pessoas dotadas de grande potencial rumo a desastres pessoas e degradações morais, cujos resultados perduram durante muitas anos, nesta vivência física e em outras vivências espirituais.

O conhecimento pode criar uma grande ilusão para os indivíduos, se não estiver ancorado em uma boa bagagem moral, muitos intelectuais acreditam ser melhores e mais importantes do que outras pessoas, se utilizam de palavras difíceis para demonstrar conhecimento e cultivam hábitos extravagantes. Infelizmente estes irmãos carecem de bom senso e, se não alterarem seus comportamentos, serão acordados desta ilusão de uma forma pouco saudável, deixando fortes sequelas.

Muitos se dedicam apenas ao conhecimento material, ganhos monetários e financeiros, acreditando que estes recursos lhes trarão felicidades e prazeres materiais, negligenciando outros valores e conhecimentos da vida, estes indivíduos sofrem em demasia quando chegam ao mundo espiritual e se deparam com uma realidade nova e desconhecida, percebendo que, mesmo mortos fisicamente ainda vivem espiritualmente. Ao se deparar com a vivência em espírito, percebem o quanto tempo perderam na vida, concentraram seus estudos na aquisição de conhecimentos sólidos, mas sem valores morais, com isso, adquiriram carros e propriedades e deixaram de construir um futuro mais consciente para o espírito, colhendo na atualidade dores e ranger de dentes.

A Doutrina Espírita nos mostra a importância do estudar e do refletir, mas não deixa de lado o compartilhar com outros irmãos os conhecimentos angariados, o auxílio e a caridade para com os irmãos mais ignorantes servem como uma grande mola propulsora tanto daquele indivíduo dotado dos conhecimentos como daqueles com menos conhecimentos e que, muitas vezes, são menos afeitos ao estudo e à reflexão. Como nos mostra a leitura atenta das obras de Allan Kardec, o conhecimento nos liberta de uma ignorância que cultivamos a muitas existências, neste momento temos a oportunidade de conhecer e discutir questões que, muitas vezes, não nos era permitido em épocas anteriores, onde por razões religiosas ou por questões ligadas ao poder material, o conhecimento era reduzido a uma pequena parcela da sociedade, estava restrito nas mãos dos poderosos e era utilizado para dominar e doutrinar os corações mais simples e ignorantes.

Segundo os estudiosos do conhecimento, no mundo contemporâneo, uma criança de 12 anos de idade possui mais informações e conhecimentos do que um rei em períodos anteriores, naquela época mais remotas a ciência não possuía a relevância e a centralidade que possui no mundo atual, diante disso, devemos aproveitar esta oportunidade para estudar, para refletir e para se melhorar, utilizando o conhecimento material para compreender o mundo, mas nunca nos esquecendo de que existem muitas coisas na vida que vão além da matéria e estas coisas só conseguiremos enxergar quando abrirmos os olhos do coração e nos deixarmos levar pela grandeza de Deus e a importância do espírito no processo evolutivo.

A Doutrina dos Espíritos tem muito para nos explicar, sua base centrada na tríade Religião, Ciência e Filosofia nos traz um grande conjunto de informações e conhecimento para compreender a vida, ao nos mostra a reencarnação como uma lei natural e nos ensinar que a morte é apenas uma passagem para outras experiências, o espiritismo nos capacita para compreender Jesus e as Leis que regem a sociedade, deixando de lado a vitimização e nos mostrando que não devemos terceirizar nossas responsabilidades, se estamos em momentos de dificuldades devemos buscar, através da reflexão e do cultivo da oração, da conversação com Deus e pelo cultivo dos bons pensamentos a inspiração para encontrarmos um caminho mais sólido e consistente para superarmos nossos problemas e encontrar a felicidade relativa para vivermos melhor e construir nosso crescimento moral e espiritual, afinal de contas é para isso que estamos vivendo nesta nova encarnação.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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