Por que os EUA apostam nas armas? por Breno Altman

Compartilhe

Dinâmica da acumulação capitalista se degrada em extrema concentração de renda e riqueza, empobrecimento de trabalhadores e colapso ambiental

Breno Altman, Jornalista, é fundador do site Opera Mundi.

Folha de São Paulo, 10/10/2024

O mundo vive a crise da ordem estabelecida em 1991, após o colapso da União Soviética e a quebra do campo socialista. Vencida a Guerra Fria, os Estados Unidos conquistaram a hegemonia planetária em todos os terrenos: militar, político, econômico e cultural.

Parecia tão indestrutível esse novo contexto que, para muitos, fazia todo o sentido a afirmação de Francis Fukuyama, renomado cientista político norte-americano: chegara-se ao “fim da história”, não haveria alternativa além da democracia liberal e da economia de mercado.

Trinta anos depois, esse horizonte de pedra está abalado. Os Estados Unidos lutam para manter seu comando, acantonados por fatores degenerativos internos e externos. A dinâmica da acumulação capitalista se degrada em extrema concentração de renda e riqueza, empobrecimento das classes trabalhadoras, colapso ambiental e adoecimento físico-mental. O regime político perde legitimidade e funcionalidade, dissociado de qualquer perspectiva sustentável de prosperidade. A coesão social se desfaz a olhos vistos.

Apesar das imensas reservas de poder, os EUA acompanham seu protagonismo ser ameaçado pelo desenvolvimento chinês, cuja aceleração seduz países de quase todos os continentes. Novas articulações e instituições multipolares, além de nações e blocos ambicionando autonomia, despontam à margem da arquitetura imperialista erigida após a Segunda Guerra. Dois dos pilares hegemônicos fundamentais são confrontados: a dominância do dólar nos fluxos financeiros e o monopólio da guerra sobre as relações internacionais.

Uma coalizão heterogênea de Estados vai sendo tecida para superar a ordem pós-soviética. A coluna vertebral dessa aliança está na crescente associação entre a pujança econômica da China e o reerguimento do exército russo. Torna-se cada vez mais difícil a manutenção do modelo copérnico estabelecido no final do século 20, pelo qual todas as nações deveriam girar ao redor de um centro único ou sofrer as consequências por qualquer indisciplina.

O certo é que as classes dirigentes dos EUA estão decididas a pagar qualquer preço para impedir que a decadência se transforme em bancarrota. Contam com a solidariedade incondicional de seus vassalos, especialmente europeus e japoneses, para uma luta de vida ou morte.

Mas não é na economia que o Ocidente imaginário localiza sua principal plataforma de sobrevivência, mas sim na guerra. Seus dirigentes acreditam que ainda conservam posição predominante no aspecto militar, capaz de impor limites a seus oponentes, além de impulsionar um dos setores mais lucrativos, o complexo bélico-industrial.

A sustentação da Ucrânia e do Estado de Israel, armados até os dentes pelos Estados Unidos e a União Europeia, comprova a opção de incentivar potências regionais como cabeças de ponte que ajudem a preservar ou conquistar, na marra, liderança sobre zonas estratégicas.

No outono de sua hegemonia, a Casa Branca empurra a humanidade para a beira do precipício. Sem ilusões com republicanos e democratas, somente uma firme posição anti-imperialista, em defesa da paz e da soberania, poderá livrar países como o Brasil de acabarem sequestrados por um sistema que prefere a guerra e a destruição como mapa da estrada.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

Leia mais

Mais Posts

×

Olá!

Entre no grupo de WhatsApp!

× WhatsApp!