A geração Z e as ameaças do álcool, por Laura Cury

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Taxação mais rígida e restrições publicitárias devem ser observadas

Laura Cury, Coordenadora do projeto álcool da ACT Promoção da Saúde

Folha de São Paulo, 01/10/2023

As mudanças sociais e demográficas recentes promoveram um prolongamento da adolescência que, segundo especialistas, duraria até os 24 anos. São justamente os indivíduos que vivem a transição entre a adolescência e a vida adulta que apresentaram dados alarmantes sobre saúde e comportamento na última edição do Covitel, o Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia.

Os jovens brasileiros dormem pouco (45,8%), praticam menos de 150 minutos de atividade física por semana (63,1%), não consomem frutas (33,5%) e verduras e legumes (39,2%) de forma regular e fazem uso excessivo de telas (76,1%). Todos esses fatores contribuem para o aumento de 90% da obesidade entre 2022 e 2023, quando o índice saltou de 9% para 17,1%, e para que 1,4 milhão tenha hipertensão, e 750 mil, diabetes. Vêm também dessa faixa etária os maiores percentuais de consumo de dispositivos eletrônicos de fumar, de 6,6%.

Se esses dados já acendem um sinal vermelho acerca da saúde da juventude e das consequências futuras dos hábitos ruins, como maior índice de mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), sobrecarga dos sistemas de saúde no futuro e envelhecimento nada saudável dessa população, as informações sobre consumo de álcool são ainda mais preocupantes.

Jovens são os que mais consomem bebidas alcoólicas de forma abusiva: 32,6%. Também são os que mais relataram não lembrar do que fizeram enquanto embriagados. O álcool ocupa um lugar privilegiado na sociedade: está nas comemorações, nas festas, nas confraternizações de família. Começar a beber é visto como um rito da vida adulta. A consequência é que 4,8% de jovens já relatam dependência ou risco de desenvolvê-la.

As bebidas alcoólicas fazem mal à saúde física e mental, tão prejudicadas pela pandemia. O álcool é um depressor do sistema nervoso central e pode agravar sintomas de ansiedade e depressão —diagnósticos em crescimento entre pessoas de 18 a 24 anos. Há também evidências do aumento de ocorrências de violência, seja no trânsito, doméstica ou suicídios. O álcool também responde por DCNTs como câncer, cardiovasculares e diabetes.

O senso comum diz que não há necessidade de pensar em ações para esse grupo, mas é fundamental garantir o acesso à saúde —física e mental— e desmistificar o tema entre jovens, além de incentivar a prática de esportes, o contato social e a redução do uso de telas.

A Reforma Tributária é uma oportunidade para garantir incentivos fiscais para produtos saudáveis e endurecer impostos para cigarros, alimentos e bebidas ultraprocessados e alcoólicas. É, também, essencial criar restrições à publicidade e ao marketing de álcool.

Enquanto a propaganda for indiscriminada, o imaginário em torno das bebidas não vai mudar. Não há glamour no álcool: a Organização Mundial da Saúde já declarou que qualquer dose é prejudicial. Apoiar pessoas jovens é investir em um futuro mais saudável para toda a população.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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