Uma visão espírita sobre as dores da alma

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Vivemos em uma sociedade marcada por grandes mudanças e transformações constantes, num mundo onde as frustrações caminham lado a lado com as vitórias, tanto profissionais quanto sentimentais, vivemos em um mundo doente, onde as dores da alma crescem de forma exponencial, seu incremento está diretamente atrelado aos avanços na ciência e nas tecnologias, avanços estes que levam os seres humanos a se isolarem rapidamente de si próprios e se encastelar nos escaninhos das redes sociais, vivemos em um mundo de transições, onde uns se adaptam mais rapidamente enquanto outros se fragilizam e veem suas energias sendo, todos os momentos, serem reduzidas a uma chama cada vez menor e mais insignificante.

Nesta sociedade, os avanços tecnológicos nos levam a gozar a vida intensamente, os prazeres materiais nos empolgam e nos tornam cada vez mais poderosos, adoramos a ciência, cultivamos o conhecimento e as descobertas científicas e passamos a acreditar que Deus não existe e que somos todos frutos de uma grande explosão.

A Doutrina dos Espíritos nos foi trazida como forma de compreendermos melhor as bases que sustentam a vida, o Espiritismo destaca que somos seres em constante evolução, desde nossa criação como seres simples e ignorantes até o porvir de uma perfeição relativa, onde nos encontrarem em um estágio evolutivo onde a guerra, a destruição e os sentimentos mais perversos não mais existirão, algo difícil de imaginar quando olhamos para a sociedade atual, mas que todos vislumbramos como um verdadeiro ideal de realidade futura, afinal somos todos imortais.

O Espiritismo nos mostra que estagiamos no mundo material, para isso, recebemos um corpo físico e somos responsáveis por este corpo, devemos entrega-lo, nas melhores condições, no melhor estado de conservação e seremos cobrados por isso. Um exemplo interessante a destacar, na obra Nosso Lar, livro psicografado pelo médium Francisco Cândido Xavier e ditado pelo médico André Luiz, recebemos inúmeras informações novas e inesperadas, como a de que o médico desencarnado, nesta vida tenha sido considerado um suicida indireto, ou seja, embora não tenha sido o responsável direto por seu desencarne, suas atitudes no corpo físico contribuíram para encurtar sua passagem pelo mundo material, desde os excessos com o sexo até os prazeres sempre difíceis de controlar, que nos atraem e nos dá prazer, e qual de nós não gostamos do prazer?

Se considerarmos o descrito no parágrafo acima, a grande maioria da humanidade pode ser descrita como suicidas indiretos, não buscamos a morte material e gostamos demasiadamente dos gozos terrestres, mas nos empanturramos de comida das mais diferentes possíveis, adoramos novos experimentos gastronômicos e não economizamos neste prazer tão “inofensivo”. Outro ponto que nos excedemos é nos gozos sexuais, pensamos em sexo muitas vezes do dia e praticamos mais do que deveríamos, se temos parceiros fixos exigimos constantemente este prazer intenso agora, se não temos parceiros próximos, nos entregamos as mais intensas extravagâncias, nos enchemos de prazer e nos esquecemos que na vida, parafraseando o grande economista liberal norte-americano, Milton Friedman, não existe almoço grátis.

Vivemos uma sociedade onde estão encarnados indivíduos das mais variadas condições espirituais, desde aqueles que já atingiram um grau de desenvolvimento e poderiam se dedicar a outros trabalhos no mundo espiritual mas que, por amor a humanidade, aceitam retornar para contribuir para o progresso do orbe terrestre, até aqueles que se recusaram a retornar e só o fizemos porque foram obrigados pela Justiça Divina, espíritos que se comprazem no mal e possuem, em seus corações, sentimentos maus, de ódio, de vingança e de ressentimento, querem destruir e se comprazem com esta destruição.

Neste ambiente percebemos que os seres humanos estão atolados nas mais variadas dores e angústias, trazem em seus corações dúvidas cruéis, sentimentos dúbios, mágoas generalizadas e sentimentos dos mais desequilibrados, nesta sociedade os suicídios crescem de forma acelerada, apenas no ano passado mais de 1 milhão de pessoas se suicidaram no mundo, além da depressão que afeta mais de 5% da população mundial, algo em torno de 350 milhões de pessoas, um contingente de doentes crônicos que carregam em seus corações dores e desequilíbrios desconhecidos e incompreendidos.

A Doutrina Espírita nos mostra que somos seres humanos que estamos, por hora, vestindo a roupa de carne mas, na verdade, somos espíritos imortais e tudo que temos em nossa mente é fruto de milhares de encarnações que se sucederam em nossas experiências anteriores, todas as dificuldades com sentimentos difusos e complexos podem ser compreendidos como vivências de outras encarnações que vivemos e não nos lembramos, dores com amores mal correspondidos, crimes que cometemos ou fomos as vítimas momentâneas, todas estas experiências estão inscritas em nossa consciência e, como as esquecemos ao encarnarmos, sentimos os ruídos destes desequilíbrios inscritos em nossa alma, cultivando as chamadas dores da alma.

Alguns advogam a tese de que deveríamos nos lembrar destas experiências anteriores, defendem que ao se lembrar destas experiências conseguiríamos contornar estes desajustes que, em muitos casos estão vivos, e construir uma nova consciência, mais justa e conscientes de que não existem vítimas, somos todos culpados e, devido a providência divina, conseguimos sempre nos levantar e angariar as forças necessárias para seguir em frente.

O Espiritismo acredita que o esquecer de experiências anteriores é um antídoto para que o palco da reencarnação não se transforme em um local de lutas e confrontos variados, esquecemos porque, muitas vezes, se lembrássemos de que este que agora está ao nosso lado foi nosso algoz em momentos anteriores, se lembrássemos destes episódios, seríamos impelidos a buscar uma revanche imediata, afinal para muitos o que vale é a lei de olho por olho e dente por dente, mesmo sabendo que estamos no século XXI, marcados pela civilização e pela institucionalidade social e política da contemporaneidade.

Depois de construirmos tantas riquezas, tecnologias e conhecimentos que transformaram a história da civilização, a sociedade caminha a passos largos para um ambiente de destruição generalizada, muitos acreditam que esta destruição é algo inimaginável, se conseguimos desvendar tantos segredos da natureza, com certeza, conseguiremos reverter os impactos negativos destas revoluções sobre a sociedade mundial, podemos acreditar nisso mas, mesmo assim devemos compreender que todas as destruições que os seres humanos impingirem ao planeta Terra, a Justiça Divina vai agir no sentido de cobrar de todos os envolvidos, todas as faturas e pagamentos futuros, senão neste mundo, mas em algum local e momento todos seremos chamados para prestarmos contas desta destruição que condena as futuras gerações a privações e degradações.

Na sociedade em que vivemos os consultórios de psiquiatria estão abarrotados, as clínicas de psicólogos e de terapeutas holísticos estão todas abarrotadas, o exército de desequilibrados aumenta de forma exponencial enquanto o mundo globalizado cria loucos e desajustados em escala, neste mundo a reflexão é deixada de lado, as disciplinas baseadas na Filosofia, na Antropologia, na Sociologia e na Política são vistas como desnecessárias, uma verdadeira perda de tempo mas, ao mesmo tempo, alguns intelectuais ganham fortunas discutindo questões que os seres humanos se fazem todos os dias e não se entregam a reflexão, as leituras e as discussões são deixadas de lado, o que está em alta é a busca generalizada pelo prazer, pelo gozo e pelos ideais hedonistas, afinal, nesta sociedade o que vale não é ser inteligente, mas parecer inteligente, com isso, perdemos nosso tempo com postagens de momentos felizes e nos colocamos na vitrine da vida como seres de sucesso e bem sucedidos deste mundo altamente competitivo e desequilibrado, marcados por medos, instabilidades e incertezas generalizadas.

Os desequilíbrios de cada ser humano está dentro de seu íntimo, olhar para dentro de cada pessoa é a verdadeira chave para seu autoconhecimento, todas as vezes que deixamos de reflexionar sobre nossas emoções, sentimentos e desejos, adiamos a descoberta do que fomos em vidas anteriores e, se não nos encararmos de frente, perpetuaremos em nosso interior os nossos desajustes mais íntimos durante muitas vidas, afinal somos seres imortais, estamos num traslado constante entre dois mundos, o material e o imaterial.

A Doutrina Espírita nos auxilia nesta caminhada e nesta descoberta constante, se nos entregarmos nesta aventura de auto conhecimento, viveremos melhor e de forma mais equilibrada e tranquila agora, se não nos conscientizarmos de que precisamos mergulhar dentro de nossas entranhas, continuaremos vivendo em mundos paralelos, incutindo em nossas mentes que os verdadeiros culpados de nossas desditas são outras pessoas, com isso, estamos terceirizando nossas responsabilidades e evitando encarar de frente todos os nossos percalços desta existência e de existências anteriores.

Normalmente encontramos pessoas que nos abordam e dizem com grande satisfação que, mesmo tentando serem melhores todos os dias, mesmo buscando ajudar as pessoas e contribuindo para diminuir as desigualdades do cotidiano, vivem com inúmeras dores na alma, como pode encontrarmos pessoas boas e dedicadas que estão sempre com problemas variados? Dificuldades crescentes nos relacionamentos, problemas financeiros e perturbações espirituais, como podem apresentar tais sintomas se estão buscando a palavra de Deus e tentando ser melhores todos os dias? Todos devemos compreender que as dificuldades são questões que envolvem a todos, somos seres devedores, nascemos com muitas dívidas e, conforme agimos, temos nosso débito reduzido ou aumentado, tudo vai depender de nossa construção diária.

Outro ponto a se destacar é que hoje somos melhores, hoje compreendemos mais, hoje auxiliamos mais, anteriormente nada fazíamos para o auxílio, não estudávamos e estávamos em lamúrias constantes, hoje somos bons, mas e ontem, como éramos? Se ainda colhemos frutos ruins mesmo com trabalho e dedicação, o que colheríamos se continuássemos vivendo de forma agressiva e violenta? O mundo não acaba no túmulo, em nossas trajetórias já morremos e renascemos milhares de vezes e, em todas elas, trazemos em nosso íntimo novas experiências, hoje somos o que acumulamos em nossas variadas experiências anteriores na matéria, sendo melhores na atualidade, com certeza, em outros momentos colheremos os melhores frutos de sabedoria, de alegrias, de felicidades e de progressos, afinal estamos sempre em constantes evoluções.

Na Doutrina Espírita aprendemos que todos somos algozes uns dos outros, se todos cometemos ilícitos dos mais variados possíveis nesta e em outras encarnações, como podemos apontar para os equívocos e desequilíbrios de nossos semelhantes, como nos disse Jesus de Nazaré quando percebeu o tratamento das pessoas para com a mulher adúltera: atire a primeira pedra aqueles que não pecaram. Neste exato momento todos os concidadãos saíram do local calados e desconsertados, afinal todos pecamos e ninguém esta em condição de julgar e muito menos de condenar outro semelhante.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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